O Conselho dos Direitos Humanos da ONU deverá reunir-se em sessão plenária na sexta-feira a pedido da União Europeia, para analisar a situação na Líbia.
A Federação Internacional das Ligas dos Direitos Humanos anunciou a morte de pelo menos 640 pessoas vítimas da violência no país. Em Tripoli foram registados 275 mortos e 230 em Benghazi, mais do dobro do balanço oficial.
A União Africana por seu turno, já condenou a repressão governamental na Líbia. Num comunicado difundido quarta-feira, a UA condenou o uso "desproporcionado" da força contra os civis ao mesmo tempo que deplorou a perda de vidas humanas.
O comunicado indica ainda que o presidente da Comissão da União Africana, Jean Ping, está a seguir com grande preocupação a situação na Líbia.
O Conselho de Segurança das Nações Unidas voltou a reunir-se quarta-feira, pelo segundo dia consecutivo, para analisar o evoluir da situação depois da alocução do Coronel Mouammar Kadhafi que rejeita demitir-se. Kadhafi diz estar disposto a morrer como um mártir, e apelou aos seus apoiantes a sairem à rua para combaterem os manifestantes.
A inflexibilidade do regime líbio perante as pressões internacionais é consequencia de uma política de hostilização e de isolamento internacional a que foi votado e também da opulência financeira dos recursos energéticos que lhe permitiu visibilidade e alianças externas.
Numa altura em que se procura o paralelismo da actual crise na Líbia com os movimentos de sublevação no Egipto e na Tunísia, alguns pontos parecem convergir enquantos outros divergem.
O recurso do Coronel Kadhafi as tropas mercenárias para reprimir os protestos, permitiu-lhe libertar-se dos condicionamentos tribais. O regime evitou assim que as contradições sanguíneas ou seja o sentimento de depuração étnica se repercutisse nas forças armadas, e evitou in extremis a tribalização do conflito. Mas por enquanto, tudo continua em aberto, dependendo de como no terreno os protestos foram galvanizados.
A Líbia enquanto procurava romper o isolamento internacional a que foi votada em consequência do seu apoio ao terrorismo, jamais procurou a reforma do sistema político e legislativo como condição para a sua reintegração na esfera política mundial. E perante a incerteza que paira actualmente sobre o país, muitos se interrogam sobre como será preenchido o vácuo de uma sociedade personificada em Muammar Kadhafi. A ausência de uma liderança credível e à altura parece aproximar a realidade da Líbia aos casos do Egipto e da Tunísia. Aliás as aspirações de liberdade como foi no Egipto e na Tunísia, é o denominador comum desta crise que se alastra pelo Magrebe e Médio-Oriente.
Mas o conflito líbio tem igualmente os seus condicionamentos específicos. O problema está também relacionado à uma clássica disputa entre o centro e a periferia delimitados pela linha que separa as regiões Leste e Oeste do país. A eclosão dos protestos na cidade de Benghazi, uma região que sempre se opôs a dominação de Tripoli, explica por si só as motivações da contenda.
Por outro lado a Líbia é menos sensível as pressões externas como é Egipto e a Tunísia. O seu longo isolamento internacional permitiu ao regime de Kadhafi por em prática uma forma de controlo totalitário do país e consolidar um modelo económico auto-suficiente de capital que foi investido no estrangeiro.
A exportação dos recursos energéticos e os investimentos de capitais líbios em grandes empresas europeias, principalmente italianas, permitiram ao poder contrariar as pressões e obter fundos com que pôde se prevalecer e criar uma extensa lista de aliados externos sobre os quais exerce o seu poder de influencia. O montante dos investimentos líbios na Itália por exemplo, ascende a 3,6 mil milhões de Euros. O governo líbio é o maior accionista do primeiro banco de Itália – UNICREDIT – além de participações nos aeroportos e clubes de futebol.
Por outro lado a Líbia terá mesmo ameaçado em cessar a sua colaboração com a União Europeia em matéria de política de controlo de imigração, se as condenações de Bruxelas e de outras capitais europeias à maneira como reprimiu os protestos pela liberdade persistirem.
A não colaboração do regime de Tripoli permitiria o aumento do êxodo migratório de África para a Europa, maior ainda que a recente chegada de centenas de refugiados tunisinos aos portos italianos como se viu ultimamente após a queda do regime do seu vizinho e amigo Zine Ben Ali.
Esta semana na Agenda Africana, analisamos com o Professor Paulo Gorjão do Instituto Português de Estudos Internacionais e de Segurança, as capacidades da comunidade internacional principalmente das Nações Unidas em persuadir o Coronel Kadhafi em poupar o seu povo da violência suscitada pela actual crise política.
Oiça a entrevista na barra do som colocada no inicio deste texto.