Jovens africanos ignorados após conflitos traumáticos

Mesmo que tenham ido à escola primária, poucos jovens têm acesso ao ensino secundário.

A África subsaariana é a região mais jovem do mundo, mas nem todos os jovens têm as mesmas oportunidades.

A história de Denis Okello está ainda bem presente na memória de Dyan Mazurana. Esta professora e investigadora norte-americana conheceu-o numa das suas viagens ao norte do Uganda, no ano passado.

Denis Okello (nome fictício) foi baleado na perna durante um massacre. A sua mulher e os dois filhos mais velhos morreram. A sua perna teve de ser amputada. E isso criou-lhe um grande problema, diz Mazurana. Okello vivia do que produzia, no campo. Com o dinheiro do que vendia, pagava a escola aos filhos. Mas sem uma perna, deixou de poder trabalhar na terra e os seus dois filhos mais novos, que sobreviveram ao massacre, tiveram de deixar a escola e ficar em casa para ajudar o pai.

“Um tinha 19 anos, o outro 21”, recorda a investigadora. “E ambos estavam lá sentados, abatidos, resignados à vida da agricultura de subsistência, apesar de serem bons na escola: tinham sido bem-sucedidos, tinham estudado no secundário. Mas isso já não é possível”.

A história de Okello não é única, segundo Dyan Mazurana, directora de pesquisa no Centro Internacional Feinstein. Mazurana diz que, durante o seu trabalho, já ouviu várias histórias semelhantes.

A guerra e os conflitos mudam por completo a vida de milhões de pessoas e, em particular, dos jovens e das crianças. Muitos são recrutados como crianças-soldado, muitos morrem nos conflitos, muitas raparigas são vítimas de abusos sexuais. Para além disso, estima-se que uma grande maioria das crianças e dos jovens não vai à escola em países afectados por conflitos: mais de 25 milhões em todo o mundo. Poucos vão além da escola primária.

Marc Sommers, investigador no Centro Wilson, nos Estados Unidos, diz que em África “não há espaço para eles nas escolas secundárias. E muito menos nas universidades. É aí que a discriminação começa para muitos jovens”.

A África subsaariana é a região com mais jovens em todo o mundo. Mas, segundo Sommers, grande parte deles sente-se excluída: “Há diferentes formas de o descrever. Em Kigali, no Ruanda, os jovens falam de si como ‘jovens sem futuro’. Na Serra Leoa, é comum autodenominarem-se ‘juventude abandonada’”.

De acordo com Dyan Mazurana, depois dos conflitos, os governos têm pressa em dizer que a guerra acabou e que o país está a recuperar. Mas isso acaba por ser verdade só para uma pequena elite.

“Os grupos vulneráveis ou em risco não são mencionados nos planos de desenvolvimento económico”, diz. “Portanto, há pessoas que são mais educadas, que têm acesso aos negócios e que estão ligadas aos principais partidos políticos. E, por outro lado, esta juventude, rural, que não tem acesso às mesmas oportunidades. Sobretudo pessoas que ficaram feridas ou que sofreram crimes graves”.

A história de Denis Okello é um exemplo disso. Os confrontos não o afectaram apenas a ele; os seus filhos também sofreram repercussões. Algo para que é preciso alertar, de acordo com a investigadora.

“É preciso começarmos a pensar em formas de fazer com que estes jovens mais velhos obtenham alguma forma de educação. Neste momento, a maioria dos países não tem programas de educação acelerada. É preciso também pensar em programas para ajudar jovens mães – muitas das raparigas atingidas por conflitos têm várias crianças e a maioria dos países não permite que elas frequentem a escola”, diz Mazurana.

Este poderá ser um ponto de partida para mudar o destino que se desenha para muitos jovens depois da guerra – um destino que significa, frequentemente, ter de abandonar a escola e tentar sobreviver.