Crise económica e financeira agrava situação das famílias angolanas mais desfavorecidas. Analistas defendem melhoria do salário da função pública face ao fraco poder de compra dos cidadãos.
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São vários os cortes já feitos pelo Executivo angolano nas receitas e despesas do país para o presente ano económico. O objectivo é ajustar as contas ao actual contexto de crise resultante da queda do preço do petróleo no mercado internacional.
As facturas da energia eléctrica e da água foram aumentadas acima dos 10 por cento numa altura em que está em curso um estudo sobre a taxa a ser aplicada pela recolha do lixo. A subida dos bens de primeira necessidade e não só, não foi acompanhada pelo reajustamento do salário da função pública que nos últimos tempos tem registado algum atraso. Este aspecto, na visão do economista Josué Chilundulo é “o mal maior” desta situação, numa altura em que o ordenado mínimo nacional está calculado em 18 mil kwanzas.
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O académico socorre-se do adágio popular “Quando se tem um morto sobre a mesa o mais importante não é como morreu, mas como se vai enterrá-lo”, para explicar que esta situação peculiar da economia angolana resultou de certa desestruturação económica e que por agora precisa mais de soluções que análise das causas.
Chilundulo recorda que no país, o Estado e o sector privado, são os únicos que garantem emprego. Porém neste binómio, apesar das parcerias, o privado tende a sofrer com a crise, pois o Estado, que não tem capacidade de pagar os serviços, é a sua principal fonte de receita.
A não resolução dos problemas de assimetrias revela uma alegada insensibilidade do Estado em relação ao “infortúnio do povo”, o que na opinião da deputada da UNITA, Mihaela Webba, está a “estragar o país”.
A parlamentar referiu por outro lado que esta situação, só se poderá resolver com a alternância do poder em 2017, sendo que para isto os eleitores deverão virar as suas apostas na oposição.
“Isto só se resolve com uma nova forma de governação e com novos líderes a governarem comprometidos em fazer o bem ao próximo”, disse.
A par da queda do preço do petróleo, Angola também regista a escassz de moedas estrangeiras, sobretudo o dólar, que está a ser comercializado a 680 kwanzas cada nota de um dólar, no mercado informal. Este é o valor mais alto alguma vez já registado na história económica do país. Em consequência da desvalorização do kwanza, o preço dos principais produtos registam uma subida “vertiginosa”, o que não foi compensado com a actualização dos salários da função pública.
A deputada Mihaela Webba denuncia que a actual cesta básica é apenas composta por nove produtos, diferente da proposta feita pela UNITA, que há alguns anos indicava 15 produtos.
Para sair desta situação, a contenção de gastos, sobretudo os supérfluos com viaturas topo de gama e outras deve ser imperativo.
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Sobre o assunto, as autoridades parecem ter tomado nota. Os deputados à Assembleia Nacional aprovaram na generalidade na quinta-feira, 19 de Maio, uma proposta de lei que limita o acesso de entidades e funcionários do Estado a veículos públicos, devido à crise financeira e económica que o país atravessa.
Em causa está uma proposta de alteração à “Lei do Património Público” (Lei n.º 18/10), que identifica as entidades públicas com direito a veículos de uso pessoal, definindo ainda os critérios de aquisição e atribuição de carros a outros funcionários.
A respeito deste assunto, o economista Josué Chilundulo afirma que “o Estado precisa fazer uma melhor gestão” e combater o fenómeno corrupção.
Mihaela Webba reforça que a queda do preço do barril de petróleo expôs um conjunto de situações cujas consequências o Estado angolano não estava preparado para acudir.
“O crescimento económico angolano não se reflecte em desenvolvimento humano” defende a deputada que denuncia por outro lado que o país “continua a não ter acesso à água, luz, saneamento básico”, para além de hospitais de qualidade, com assistência médica e medicamentosa com níveis aceitáveis e um sistema de educação que potencie as futuras gerações com ferramentas que coloque os angolanos no mesmo patamar que outros países de referência.
A parlamentar pensa que desta forma o país não está no rumo certo. “O país tem rumo, mas o rumo actual não é o rumo certo. Não estamos a investir na educação, na saúde, nem na agricultura. O Orçamento Geral do Estado dos últimos cino anos teve sempre menos de cinco por cento para o sector da agricultura”, referiu.
Em situação de crise, muitos são os pequenos empreededores que tentaram a sua sorte nos mais variados sectores solicitando um crédito ao Estado, porém com o agravamento da situação muitos têm dificuldades de honrar os seus compromissos. Nesta situação, diz o economista Josué Chilundulo “o Estado deve assumir os riscos enfrentados pelas famílias”, sob pena de agravar ainda mais a sua situação financeira, que se viu frustrada pela crise.
Uma mudança de hábitos na gestão das finanças familiar se impõe neste tempo de crise. Todavia, Josué Chilundulo refere que a contenção recai exclusivamente às famílias que têm rendimentos consideráveis, já que as que enfrentam uma situação económica precária sofrem uma imposição, por força desta situação.
Muito recentemente o Governo angolano, através de um cadastramento efectuado na função pública, detectou a existência de mais de três mil funcionários fantasmas, sendo que com estes o Estado gastava mais de cinco milhões de kwanzas mês.
Para o economista Josué Chilundulo, a corrupção é outro mal a ser combatido pelas autoridades por uma questão de honra. De acordo com o académico “o primeiro passo de combate à crise é uma boa gestão”.
Ao contrário do economista Josué Chilundulo, a deputada Mihaela Webba refere que a solução para o Estado angolano não passa apenas pelo combate à corrupção, mas pela alternância do poder político.
“Há necessidade de o MPLA ser substitído na governação. Vamos para as eleições em 2017 e vamos esperar que os angolanos reflictam e dão a possibilidade de uma alternativa”, defendeu.