Aristides Pereira, o primeiro presidente da República de Cabo Verde morreu quinta-feira em Portugal, nos Hospitais da Universidade de Coimbra, depois de ter sido operado pela segunda vez, no espaço de um ano, a uma fractura no colo do fémur.
Aristides Pereira, que contava 87 anos de idade e era diabético, fundou com Amílcar Cabral, em 1956, o Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC) e foi presidente de Cabo Verde, desde a sua independência em 1975, até 1991.
O actual presidente cabo-verdiano, Jorge Carlos Fonseca, decretou cinco dias de luto nacional. As cerimónias oficiais fúnebres de Aristides Pereira vão ter lugar segunda-feira na Cidade da Praia e o seu funeral privado realiza-se terça-feira na Ilha da Boavista, sua terra natal.
Em Cabo Verde, as reacções de consternação e pesar atravessaram todo o espectro politico. O presidente Carlos Jorge Fonseca, decretou luto nacional por quem descreveu como uma figura marcante da luta pela independência nacional.
“Foi uma noticia recebida com pesar e consternação. Todos os cabo verdianos se curvarão com respeito perante a figura e memoria de Aristides Pereira”, disse o presidente enviando condolências à família.
A ministra adjunta e da Saúde, Cristina Fontes Lima, que na ausência do primeiro-ministro, em Nova Iorque, o substitui na chefia do executivo, mostrava-se consternada.
“Sinto um grande pesar… Devo dizer que para todos nós é uma dor. Fico com muita pena, profundamente triste”, disse.
Já o ex-presidente Pedro Pires preferiu destacar a capacidade de sacrifício de Aristides Pereira. Salientou “a grande capacidade se sofrimento” pelas causas em que acreditava e a sua capacidade de aceitar derrota, como quando perdeu as eleições, mantendo-se “sempre fiel aos seus ideais e aos seus amigos”.
Aristides Pereira inspirou outros cabo-verdianos a servir o país e essa é a forma como Basílio Ramos, presidente do parlamento, o homenageia. “Durante 15 anos trabalhou para lançar as bases do estado que temos hoje”, declarou Ramos acrescentando que “Cabo Verde perde um grande filho (…) que desde a juventude se dedicou de corpo e alma a Cabo Verde”. E prosseguiu: “O exemplo dele deverá guiar-nos na construção do país. Eu que era miúdo, posso garantir que a minha geração, que hoje tem funções de relevo… aprendemos muito com ele”.
Carlos Veiga, presidente do MPD, Partido Para a Democracia situou a sua evocação de Aristides Pereira, nos contactos que manteve com ele para a legalização do seu partido e, quando, mais tarde, venceu as primeiras eleições democráticas. Salientou que o então Presidente da República “recebeu-nos bem, foi sempre cordial e assegurou a transição” entre o governo anterior e o primeiro governo saído das eleições democráticas.
Reagindo à morte de Aristides Pereira, o antigo ministro e diplomata cabo-verdiano Corsino Tolentino, relembrou o papel fundamental desempenhado pelo primeiro presidente de Cabo Verde na génese da sua nação e o cunho por ele deixado no actual sistema político multi-partidário do arquipélago.
De acordo com Corsino Tolentino o nome de Aristides Pereira ficará naturalmente associado ao proceso da transformação de “uma colónia de importância muito marginal para um país soberano, batalhador e com sucesso desde que ascendeu à independência”.
O nosso interlocutor realçou também o facto de Aristides Pereira ter lutado sempre pela unidade nacional e por um país melhor transformando-se assim numa figura supra-partidária.
Corsino Tolentino recordou ainda que ex-presidente participou activamente não só na criação do estado de direito durante os primeiros 15 anos de independência como também, em 1991, no processo de transição para o actual regime político de multi-partidarismo em Cabo Verde.
Também o jornalista e pesquisador cabo-verdiano José Vicente Lopes falou do legado histórico-político do presidente Aristides Pereira.
Para Vicente Lopes, o primeiro presidente cabo-verdiano fez a diferença dos seus pares africanos pelo seu posicionamento de não-alinhamento, dado ao seu carácter pacifista.
Segundo ainda o jornalista cabo-verdiano as acções de Aristides Pereira foram cruciais para a paz na região da África Austral, e dá o exemplo de suas intervenções junto ao George Bush pai, aos líderes políticos angolanos, e sul-africanos, para a sua de conflitos como a guerra civil em Angola, a independência da Namíbia e o fim do apartheid na África do Sul.
Os seus camaradas na Guiné-Bissau não têm dúvidas: Aristides Maria Pereira era uma figura pragmática, humanista e disciplinada. Carlos Correia, com o qual teve uma relação especial, segundo o próprio, recordou que foi Aristides Pereira que, em 1959, o salvou da então temível Policia Internacional e de Defesa do Estado, conhecida pela sigla PIDE.
"Salvou-me da PIDE", disse Correia à VOA. E adianta que Aristides o avisou que a PIDE estava no seu encalço e lhe arranjou transporte para fugir. Carlos Correia, que com 77 anos já foi, várias vezes, primeiro-ministro, recorda o falecido estadista como um homam "alegre, humanista, mas que sabia brincar quando era necessário"..
Quem também trabalhou com Aristides Pereira, enquanto ocupava as funções do secretário-geral Adjunto do PAIGC e chefe da Logística e da Economia do partido durante a luta de libertação da Guiné e Cabo-Verde é Luís Oliveira Sanca. Oliveira Sanca, um dos decanos do partido libertador, lembrou que esta figura histórica foi essencial da preparação das negociações, em Argélia, entre Bissau e Lisboa sobre a independência das então duas colónias.
Segundo ele, foi Pereira quem "entabulou negociação com a direcção do sistema colonial na base do reconhecimento, de jure, da indapendência da Guiné-Bissau declaradada anteriormente.
Figura de Aristides Pereira recordada em Bissau, tanto assim que o PAIGC, partido no qual foi um dos destacados dirigentes, reuniu a sua Comissão Permanente, para lembrar Pereira que foi um exemplo do grande Combatente da Liberdade da Pátria e por conseguinte reitera a sua solidariedade para com o PAICV e o povo cabo-verdiano.