A proposta de Lei de Combate à Atividade Mineira Ilegal, aprovada, recentemente, na generalidade pelo parlamento, está a ser descrita por políticos e analistas como visando proteger as elites e os estrangeiros por, alegadamente, não ser clara quanto às penalizações a que deviam estar sujeitos os cidadãos não angolanos.
O diploma, que começa a ser discutido nesta segunda-feira, 8, pelas comissões especializadas, prevê punir com penas de 2 a 8 anos de prisão todo o cidadão que, individual ou coletivamente, promover ou facilitar a atividade mineira ilegal dentro do território nacional e ao pagamento de multa além do cumprimento da pena de prisão.
A mesma moldura penal e sanção pecuniária é aplicada a todo o indivíduo que instalar, montar equipamentos ou dar início a quaisquer atividades mineiras ou de auxílio efetivo a essas tarefas, em violação das regras legalmente previstas.
O secretário de estado dos recursos minerais, Jânio Correia Vítor, disse, por altura da apresentação do projeto de lei aos deputados, que existem perto de 1,3 milhões de garimpeiros [exploração de ouro] a operar no país, sendo a maioria estrangeiros.
Críticas
A proposta de lei foi aprovada com 90 votos a favor (MPLA e PHA), e 66 abstenções (dos grupos parlamentares da UNITA e Misto PRS-FNLA).
Para o deputado da UNITA, Joaquim Nafoia, trata-se de uma lei que protege o interesse do grupo dominante que acusa de “cada um ter a sua área de exploração”.
Nafoia defende que “não se pode criminalizar e punir o povo, por causa de uma ctividade artesanal que contribui para a sua sobrevivência, pois a falta de emprego e a fome é o que faz com que as pessoas, na luta pela sobrevivência, enveredem pelo garimpo”.
Na opinião daquele parlamentar, “a raiva, o ódio e a lei da espada que se pretende implementar não acabarão nunca com a atividade extractiva artesanal de diamantes e ouro".
Nafoia diz reconhecer que o garimpo é “uma realidade preocupante” mas, ainda assim, entende que “ foi o próprio executivo que criou esta situação ao incentivá-lo, por via do oportunismo e da ganância, assentes na criação de assimetrias entre o interior e Luanda, a constituição de monopólios que fecham as portas das oportunidades às demais empresas e pessoas singulares locais, ou seja, o empobrecimento sistemático, intencional e doloso das populações que residem nas zonas com recursos naturais valiosos”.
Nafoia, que é oriundo das Lundas, destaca a “institucionalização da corrupção, o tráfico vil de influências endossado às forças de defesa e segurança que campeiam nas zonas de exploração mineira, a proteger interesses do grupo dominante e reprimindo, torturando e matando as populações, o nepotismo acentuado que favorece, protege e enriquece os membros da elite governante”.
Por sua vez, o ativista social, André Augusto, reconhece o direito do estado à terra, mas alerta que a proibição da exploração artesanal de diamantes “é uma sentença de morte para as populações das lundas”.
Aquele ativista considera a lei perigosa na medida em que vai excluir milhares de cidadãos da sua base de sobrevivência. Como é que a lei aplica medidas punitivas contra nacionais e não contra estrangeiros”.
André Augusto defende que o governo devia criar alternativas de sobrevivência das populações a serem afectadas, “com base num estudo” antes da aprovação da lei em causa".
Por seu lado, o líder da Rede de Terra Angola, Bernardo Castro, considera que a exploração artesanal de diamantes não devia ser penalizada por entender que, “historicamente, em alguns casos, tais recursos se encontram em territórios das comunidades protegidas pelo domínio consuetudinário e aí a exploração artesanal é milenar".
Há que abrir exceções, desde que essa exploração seja para a sobrevivência das pessoas, a bem da justiça económica e humana”.
As razões do goveno
O secretário de estado para recursos naturais, Jânio Correia Vítor, referiu que a exploração ilegal de minerais tem impactos negativos para o meio ambiente e a saúde pública e para a subsistência das comunidades, estando também associada à sustentação de conflitos armados violentos, criminalidade organizada e terrorismo.
O governo justifica a razão de ser da norma com o argumento de que " a actividade mineira ilegal tem assumido no país proporções que põem em causa o normal funcionamento do sector dos recursos minerais, a estabilidade do sistema económico e requer a redefinição dos instrumentos jurídicos, com o objectivo de desincentivar tais práticas".
Quanto à condenação, o propunente alega o fato de se tratar de uma atividade realizada com recurso a equipamentos, dispositivos e produtos químicos perigosos e prejudiciais ao ambiente, à saúde das pessoas que os manuseiam e da comunidade em geral, e que está muitas vezes associada à sustentação de conflitos armados violentos, criminalidade organizada, terrorismo, trabalho infantil e escravo, tráfico de drogas e de armas, pondo, assim, em causa a segurança do estado.
Para além dos prejuízos elencados com a atividade mineira ilegal, a proposta de lei refere que o estado deixa de receber receitas por via dos impostos, royalities e outros benefícios, lê-se no documento.
O projecto de diploma prevê, igualmente, a perda de bens a favor do estado, os instrumentos, produtos e vantagens dos crimes previstos na presente lei, salvo se pertencentes a terceiro de boa-fé.
Na justificação da lei, o Governo sustenta ainda que entre 2018 e 2023 foram registados e autuados um total de 1.292 processos-crimes relacionados com a atividade mineira ilegal, com um prejuízo incalculável à economia nacional, consubstanciado na apropriação ilícita dos recursos minerais, disrupção e fragilização das comunidades, informalidade crescente da economia associada ao garimpo, perdas fiscais, custos com a gestão e controlo dos fenómenos de garimpo e associados (prostituição, corrupção das matrizes culturais e sociais), entre outros.