O uso de fundos do Estado e de doadores no sector de saúde tem sido alvo de contestação, por alegada falta de transparência e integridade nos concursos de procurement público lançados pelo ministério da Saúde (Misau) para a aquisição de medicamentos, material médico-cirúrgico e equipamentos hospitalares.
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O ponto é apresentado no relatório “As redes de negócios milionários do ministério da Saúde”, no qual o Centro de Integridade Pública (CIP), “analisa somente as empresas adjudicatárias, os respectivos proprietários e o valor das adjudicações”.
Nos últimos quatro anos analisados – 2013-2017 - , o CIP diz que 2014 é o que teve mais adjudicações e com valores extremamente altos em comparação com os restantes.
O CIP recorda que 2014 foi o ano de eleições gerais e “há evidências de que os principais beneficiários das adjudicações dos concursos do Misau foram financiadores da campanha eleitoral do partido Frelimo e do seu candidato à presidência da República, Filipe Nyusi”.
Nyusi venceu as eleições desse ano e é hoje presidente de Moçambique.
Gestão de Manguele versus Abdula
“Há dados que permitem fazer a relação entre os concursos do MISAU e o financiamento da campanha política do partido no poder, uma prática que já se verificou em outras áreas como a do licenciamento e corte de madeira, cujos operadores financiavam actividades partidárias em troca de licenças lesivas ao Estado”, lê-se no relatório.
Nesse ano, diz o CIP, as adjudicações em meticais foram lideradas pela empresa UNIBASMA,Limitada, detida pela família Basma, com uma facturação de mais de 126,5 milhões de Meticais.
Em dólares, no mesmo ano, a empresa que ocupou o primeiro lugar é a Neopharma, Limitada, de Abdullah Seedat, Ebenizário Ében Silvestre Bila e Mahomed Esuf Seedat, com adjudicações avaliadas em mais de 24.1 milhões de dólares americanos.
“Ebenezário Ében Silvestre Bila é um dos mais conhecidos empresários fornecedores do MISAU, mas que tem vindo a perder protagonismo com a ascensão da dupla formada pela Ministra Nazira Abdula e Zacarias Zindonga, Secretário Permanente no ministério da Saúde, ” indica o relatório do CIP.
Em relação às tendências das adjudicações de concursos no Ministério da Saúde, o CIP apurou, por exemplo, que entre 2013 e 2014, seis empresas continuaram na lista das 10 mais favorecidas. Nessa altura, o ministério era liderado pelo médico Alexandre Manguele.
Mas a partir de 2015, sob liderança de Nazira Abdula, também médica, o CIP diz que registam-se alterações nas empresas que mais concursos ganham, e surgem mais casos de atribuições directas.
Misau silencioso
O CIP chegou a estas conclusões – parte do trabalho iniciado em 2015 - com base em consulta de documentos e entrevistas com partes envolvidas, excepto o ministério da saúde, que segundo a organização nunca se disponibilizou a passar qualquer informação.
Com base nas entrevistas, o CIP concluiu, no geral, entre outros pontos, que há casos de empresas que, apesar de terem sido vencedoras e terem fornecido parte ou a totalidade dos bens previstos no concurso público, ainda não receberam parte ou a totalidade do valor das adjudicações pela execução do contrato com o Ministério da Saúde.
O sector de saúde é financiado em nove por cento pelo orçamento do estado, abaixo do acordo africano de 15 por cento. O resto é financiado por doadores.