Governo moçambicano sem fundos para reconstrução de Cabo Delgado

Adriano Maleiane, primeiro-ministro de Moçambique

Primeiro-ministro reconhece situação enquanto estudo diz que população desenrasca-se para sobreviver sem ajudas

O primeiro-ministro moçambicano, Adriano Maleiane, revelou que o Governo ainda não tem a totalidade de fundos para a reestruturação económica e reconstrução dos distritos largamente destruídos por ataques de rebeldes ligados ao Estado islâmico na província de Cabo Delgado, um ano após o lançamento da iniciativa.

Este reconhecimento acontece quando um estudo revela que vários distritos ainda não têm serviços básicos, como escolas e hospitais, e a população vive da apanha e venda de sucatas, de viaturas e blindados.

O Plano de Reconstrução de Cabo Delgado, que deve durar três anos e aprovado há mais de um ano pelo Conselho de Ministros, vai custar 300 milhões de dólares norte americanos e prevê, além de garantir a segurança da zona, criar meios de subsidência dos deslocados que pretendam regressar as zonas de origem, restabelecer as atividades administrativas e comerciais nos distritos severamente afetados pelo terrorismo.

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Adriano Maleiane que visitou a província nos últimos quatro dias reconheceu que a reinstalação dos serviços administrativos está a seguir passos lentos e que a economia continua a ser dinamizada por comerciantes locais e a risco próprio, em distritos que já começaram a receber de regresso milhares de deslocados.

“O programa [de reconstrução] tem um financiamento subjacente, o que está a acontecer é que o ritmo da disponibilização desses fundos que estava previsto, não está a ser acompanhado com a urgência no terreno”, disse Adriano Maleiane a jornalistas em Pemba, salientando que estão a ser restabelecidos serviços minimos, embora alguns funcionem de forma precária.

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“Os agentes económicos, todos em Cabo Delgado, têm a capacidade de se reinventar, porque todos esses não esperaram pela disponibilização do dinheiro, foram fazendo as coisas e as coisas estão a acontecer”, frisou o dirigente, insistindo que “vi obras em curso, mas também vi a economia a funcionar”.

O Governo, prosseguiu Maleiane, continua a priorizar a reconstrução do distrito de Mocímboa da Praia, - o primeiro distrito capturado pelos rebeldes e onde ocuparam por mais de um ano - por ter um porto e aeroporto estratégicos para dinamizar a economia local e atender a logística dos megaprojetos bilionários de gás natural.

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Mas também criar condições de apoio aos comerciantes dos distritos afetados e que perderam quase tudo devido aos ataques do grupo armado, que aterroriza há cinco anos a província de Cabo Delgado, rica em recursos naturais.

“Temos um programa na área de microfinanciamento, para a área de comercio e o processo de montagem da direção está em curso, infelizmente às vezes quando os recursos não são do orçamento, dependem dos parceiros e de outros sempre não vem no ritmo que nos gostaríamos”, vincou Adriano Maleiane, assegurando que o Executivo esta a se reagendar para mobilizar recursos para a reconstrução de Cabo Delgado.

População tenta desenrascar

Entretanto, num estudo recente feito sobre Cabo Delgado, o investigador João Feijó disse à VOA que vários distritos do norte de Cabo Delgado ainda não têm serviços básicos, como escolas e hospitais, e a população, que regressa descapitalizada, vive de pilhagem nas bases terroristas abandonadas, e de apanha e venda de sucatas, de viaturas e blindados incendiados durante os ataques.

Por sua vez, Joamine Amade, um comerciante de Mocímboa da Praia, afirmou à VOA que a situação de segurança, associada à inflação e a escassez de produtos no mercado local, continuam a ser um grande desafio para a restauração económica.

“Muitos perderam tudo, tudo mesmo. Eu estou a começar do zero” numa área com a população descapitalizada e onde a “economia é estática”, referiu Joamine Amade.

A província de Cabo Delgado tem o maior e mais rico projecto de gás natural liquefeito de África e desde Outubro de 2017 vem sendo atribulado por ataques de um grupo armado que se autointitula al-Shaabab (em árabe, 'os jovens' ou 'os rapazes') e que começou há uns anos a ganhar simpatia do Estado Islâmico.

Para fazer frente a esta insurgência, o Governo conseguiu apoio do Ruanda e de países da Comunidade para o Desenvolvimento da África Austral que enviaram milhares de tropas para ajudaro exército moçambicano.