AI revela que protecção de direitos humanos no Brasil está ameaçada

Polícia brasileira, anti-motim

Relatório denuncia violência e impunidade policiais, conflitos mortais por terras e projectos de lei ameaçadores para os direitos humanos.

O Brasil continua a registar sérias violações dos direitos humanos, como torturas e assassinados pela polícia, marginalização de jovens negros das favelas, uso excessivo das forças de segurança para conter protestos e manifestações e conflitos pela posse de terra que têm resultado em mortes de dezenas de pessoas.

O capítulo do Relatório da Amnistia Internacional (AI) sobre o Brasil de 2015/2016 divulgado nesta quarta-feira, 24, revela também que homossexuais e transgéneros enfrentam violência e discriminação, enquanto se regista um retrocesso nos direitos sexuais e reprodutivos, das mulheres e criança.

A AI alerta, por outro lado, para eventuais retrocessos, como a revogação do Estatuto do Desarmamento, a redução da maioria penal de 18 para 16 anos, a tipificação do terrorismo, a demarcação das terras indíginas e o Estatuto da Família.

A situação é explosiva, em vários sectores, particularmente no elevado número de pessoas mortas ilegalmente pela polícia, de acordo com aquela organização.

Violência e impunidade policial

Ao mesmo tempo, a falta de transparência impede conhecer exactamente o número de vítimas, cujos autores, na maior parte dos casos citados pela polícia, alegam ter agido em defesa própria.

Favela, Rio de Janeiro, Brasil

Com o relato de vários casos de homicídios por parte da polícia, inclusive de uma adolescente de 13 anos no Rio de Janero, a organização aponta a “total impunidade das autoridades”, afirma Fátima Mello, assessora dos direitos humanos da secção brasileira da AI, em conversa com a VOA.

“As investigações que são abertas não têm, na sua maioria, conclusão e poucos culpados pagam pelos seus crimes, em várias áreas”, explica Mello que cita ainda a intimidação de que muitos defensores dos direitos humanos enfrentam.

A assessora da secção brasileira da AI desenha um quadro sombrio nas cadeias brasileiras, como “superlotação extrema, condições degradantes, tortura e violência.

No sistema de justiça juvenil, a situação é também “degradante”, com um grande número de denúncias de tortura e de violência contra meninos e meninas, com muitos deles mortos sob custódia da polícia.

Defensores dos direitos humanos sem protecção

​O Programa Nacional para a Protecção dos Defensores dos Direitos não conseguiu garantir a segurança prometida, alegadamente por “falta de recursos, deixando os activistas em risco”, diz o relatório.

Além disso, apesar do discurso político, a ausência de um quadro jurídico “minou a eficácia do programa”.

Para Fátima Mellon os conflitos por terras e recursos naturais “constituem um problema sério e sem solução à vista por falta de vontade política”, devido aos enormes interesses em jogo.

Esses conflitos resultaram em dezenas de mortes, comunidades rurais e seus líderes foram ameaçados e atacados por proprietaries de terras, principalmente no norte e nordeste do Brasil, de acordo com a AI.

O processo de demarcação das terras dos índigenas, os quilombolas e outros, continua atrasado, apesar de o Governo ter a autoridade e meios financeiros para acelerar o processo.

“Enquanto esses processos aguardam pelo Congresso, membros das comunidades indígenas são atacados de forma generalizada, sem que os autores desses crimes sejam levados à justiça”, denuncia Mello .

Congresso com projectos de leis "ameaçadores" para a AI

Por outro lado, a AI manifesta a sua preocupação com projectos de alterações da Constituição de legislação oridinária em discussão no Congresso por representarem uma ameaça à saúde sexual e direitos reprodutivos da mulher.

“O Congresso Nacional tem projetos de lei que visam criminalizar o aborto em todas as circunstâncias, o que pode impedir o acesso das mulheres ao aborto seguro e legal no sistema único de saúde”, denuncia a organização de defesa dos direitos humanos

Caso as alterações forem feitas “as mulheres brasileiras ficarão sem apoio em caso de uma gravidez de risco ou de estupro e deixarão de existir recursos para emergência às vítimas de violações”, explica Fátima Mello.

Os trabalhos de preparação para a realização dos Jogos Olímpicos deste ano no Rio de Janeiro merece também destaque no relatório da AI, com a organização a criticar as remoções feitas.

“Milhares de pessoas foram removidas das suas casas para dar lugar às obras de infraestrutura para o evento, muitas famílias não receberam a devida notificação, nem indenizações suficientes ou reassentamento adequado", conclui o relatório da AI, reforçando que a protecção dos direitos humanos no Brasil está fortemente ameaçada.