O julgamento dos alegados assassinos dos activistas Alves Kamulingue e Isaías Cassule recomeça amanhã, 5, após uma interrupção de várias semanas.
Os activistas foram raptados e e posteriormente assassinados quando tentavam organizar uma manifestação de apoio a ex-militares, em 2012.
O caso envolve destacados oficiais das Forças Armadas e os serviços secretos angolanos, e os acusados em tribunal disseram ter recebido ordens superiores para matarem os activistas cujos corpos nunca foram recuperados.
O general Filomenos Peres foi um dos mencionados em tribunal como tendo dado as ordens, mas até agora não compareceu em tribunal para testemunhar.
Um advogado da organização Mãos Livres, que reresenta as famílias das vítimas, disse que o general já foi intimado a comparecer em tribunal mas que se ignorou a ordem do tribunal.
Entretanto, o general, conhecido como “General Filó” dos Serviços Secretos Militares, negou à VOA que esteja a recusar comparecer em tribunal por não ter recebido qualquer notificação, antes de deixar Luanda para o exterior onde se encontra em tratamento.
O general negou também alegações de que não teria comparecido em tribunal por ordens do seu superior, o general José Maria, que também está citado como tendo participado numa ordem para se decidir sobre Isaías Cassule e Alves Kamulingue.
“Isso é tudo mentira, é tudo mentira”, disse o general.
Segundo o presidente das Mãos Livres, advogado Salvador Freire, na devida altura o tribunal terá mecanismos para pressionar o tenente-general Filomeno Peres a comparecer no tribunal.
“Nós sabemos que o general foi notificado duas, três vezes, mas não compareceu”, disse Freire.
“Isso não nos preocupa porque à hora certa o tribunal saberá usar seus mecanismos para trazer o general”, garantiu.
O caso continua longe do fim.
A rede por detrás do Crime
Uma fonte bem ligada ao caso contou à VOA que o tenente-general Filomeno Peres, chefe da Direcção Principal de Contra-Inteligência Militar, e descrito como o mais fiel assistente do chefe dos Serviços de Inteligência Militar, general António José Maria, teria participado numa reunião sob orientação do ministro de Estado e Chefe da Casa de Segurança do Presidente da República, general Manuel Vieira Dias “Kopelipa”, realizada na Casa de Segurança, um dia antes das mortes dos dois activistas, Kamulinge e Cassule.
Ainda segundo a mesma fonte, a referida reunião, na qual participaram também os ex-responsáveis da Polícia e Sinse de Luanda, Comissário Dias do Nascimento e António Manuel Gamboa Vieira Lopes, teria como objectivo dar orientações para a detenção dos mentores da programada manifestação que aqueles activistas estariam a organizar.
A manifestação deveria ter tido lugar no dia 27 de Maio de 2012, em Luanda.
Réu promovido
O julgamento que já dura há mais de um ano tem registado várias paralisações.
Interrompido pela primeira vez a 3 de Setembro, o julgamento foi retomado no dia 17 de Novembro, sendo de novo suspenso no final de Dezembro para ser retomado amanhã, 5.
A primeira interrupção deu-se depois de o tribunal ter afirmando não ter competência para continuar o julgamento depois de um dos réus ter sido promovido pela presidência a general.
O referido oficial é António Manuel Gamboa Vieira Lopes e sobre ele recai a acusação de autoria moral do crime de homicídio.
À data do homicídio aquele militar ostentava o posto de brigadeiro. Porém, a 27 de Maio de 2014, ao ser promovido ingressou na classe de oficiais generais, deixando assim de estar sob alçada dos tribunais civis, os quais não podem julgar um oficial-general.
A promoção e a interrupção do julgamento causaram celeuma e sérios embaraços ao Presidente da República que revogou a medida.
Santos mandou ordenou também instaurar um inquérito para averiguar como é que o nome de Vieira Lopes tinha sido inclúido na lista de promoções quando estava a ser julgado.
A referida comissão de inquérito ainda não se pronunciou. Nem mesmo o general Helder Manuel Vieira Dias “Kopelipa”, na qualidade de auxiliar principal do Presidente da República, falou sobre o tema.
Um terceiro oficial superior implicado alegadamente na morte de Kamulinge e Cassule foi nomeado recentemente para o cargo de comandante provincial do Moxico e delegado do Ministério do Interior.
Trata-se do Comissário Dias do Nascimento Fernando Costa, que era à data do assassinato o comandante em exercício da Policia Nacional de Luanda, uma vez que a então titular Elizabeth Ramos Frank, “Beth”, encontrava-se ausente do país por motivos de saúde.
O responsável do Gabinete Técnico do Comité Provincial do MPLA de Luanda Júnior Maurício “Cheu”, implicado na morte de Cassule, revelou em tribunal que o seu grupo agira em cumprimento de ordens dadas pelo tenente-general José Peres Afonso “Filó”.