Grupos armados estão a tentar atrair a simpatia da população nas aldeias libertadas do terrorismo, em Cabo Delgado, prometendo passar a comprar a produção, disseram à VOA nesta quarta-feira, 1, vários moradores.
Os rebeldes invadem as aldeias, compram cereais, reunem, dizem que o inimigo da população são as forças governamentais e as tropas estrangeiras que os combatem, e que eles lutam pelo desenvolvimento de Cabo Delgado.
O caso mais recente deu-se nesta quarta-feira, 1 de Fevereiro, na aldeia Mbuyuni, que fica junto do lago Nangade.
O grupo já tinha usado táctica similar a 26 de Janeiro, na aldeia Calugo, no distrito de Mocímboa da Praia, informando a população para não ter medo e passasse a fazer trocas comerciais.
“Quando chegaram, cercaram toda aldeia; apenas 25 homens entraram, e avisaram que a aldeia estava cercada para não haver fugas,” contou Salimo Fadir, um morador local, realçando que o líder falava numa língua local e em tom muito amigável.
“Não dispararam, nem bateram, compraram comida e outras coisas, nem reclamaram dos preços” e enquanto iam saindo “abriram os carregadores das armas para mostrar munições,” dizendo que não têm falta de munições para matar, referiu.
Um outro morador, disse que rebeldes compravam os produtos a valores muito altos, num claro “gesto de distribuir dinheiro” , antes de ajudar na limpeza da aldeia e partir. Os rebeldes ficaram na aldeia cerca de 7 horas.
Conquista de mentes
Jasmine Opperman, especialista em extremismo violento em África e que acompanha o conflito em Cabo Delgado, observa que esta é uma “táctica de conquistar corações e mentes”.
Já o sociólogo moçambicano, João Feijó, que estuda o conflito em Cabo Delgado, diz que não se sabe se esta “estratégia populista” é generalizada, tendo em conta que nalguns ataques às sedes distritais, em 2020, os alimentos assaltados em vários armazéns e lojas foram depois distribuídos entre a população.
“A verdade é que se a insurgência for utilizar essa estratégia e massificar, no futuro, pode ter novos desenvolvimentos, no sentido de ganhar mais apoio de alguns sectores da população, que vai ser conivente e ser mais cooperante com os insurgentes e menos cooperativo com as forças de defesa e segurança”, anota Feijó.
O também investigador e autor de vários estudos sobre Cabo Delgado defende que “se por um lado esta nova atitude é positiva no sentido em que diminui o número de mortes e o número de atrocidades cometidas sobre a população, por outro lado está a criar e alimentar tensões internas na província, o que vai dificultar depois o trabalho das forças de defesa e segurança”.
Mais de 4.500 pessoas foram mortas e quase um milhão foram forçadas a fugir das suas casas, desde que militantes ligados ao Estado islâmico lançaram uma insurreição na província de Cabo Delgado, rica em gás, em 2017.
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