Analistas moçambicanos consideram que os novos ataques armados atribuídos e algumas vezes reivindicatos pelos dissidentes da Renamo, liderados por Mariano Nhongo, antigo estratega militar da guerrilha, agravaram a ameaça de estabilidade do país, ao voltar a atingir a espinha dorsal da economia nacional.
O líder dissidente da autoproclamada Junta Militar da Renamo ameaçou na quinta-feira, 17, retaliar com novos ataques a tentativa de sequestro dos seus filhos no distrito de Nhamatanda.
No mesmo dia, dois ataques armados contra três autocarros de passageiros provocaram sete feridos, três dos quais com gravidade na zona limítrofe entre os distritos de Nhamatanda e Gorongosa, a nordeste de Sofala, e em Chibabava, mais a sul da mesma província moçambicana.
No domingo, 20, um novo ataque contra quatro autocarros de passageiros e uma carrinha de transporte semicolectivo, escoltados pela Polícia moçambicana, na mesma zona da estrada nacional número um (EN1) em Nhamatanda, matou duas pessoas e feriu outras oito.
A Polícia da República de Moçambique em Sofala atribuiu nesta segunda-feira, 21, os ataques aos “bandidos pertencentes à autoproclamada Junta Militar da Renamo”, o grupo que aquela força de defesa e segurança diz “continuar a perseguir no teatro das operações centro”.
O analista político e docente universitário, Sansão Nhancale, observa, em conversa com a VOA, que a instabilidade socio-económica provocada pelo conflito na região não se circunscreve às ameaças de Nhongo, mas na sua capacidade de arrastar o conflito para uma dimensão político-militar maior.
“Ele não só tem capacidade de desestabilizar, como tem capacidade de criar fissuras sociais e políticas profundas no país”, admite Sansão Nhancale, sustentando que a natureza da sua guerrilha “não precisa de exércitos muito bem formados”.
O certo, prosseguiu, “nós percebemos pelo impacto” da guerrilha que já afeta o setor comercial e dos transportes e já paralisou parcialmente os principais corredores económicos: da Beira e a EN1, considerada espinha dorsal do desenvolvimento do país.
“A capacidade de desestabilizar não é vista sob ponto de vista militar, da quantidade de armas e no número de homens que ele tem, mas é vista sob ponto da vontade que eles têm de criar instabilidade num determinado dia numa zona militar estratégica e com rodovias estratégicas”, precisoa Sansão Nhancale.
Para o politólogo Martinho Marcos, independentemente das ameaças esporádicas de retaliações de Mariano Nhongo, “é preciso compreender que o conflito já está instalado”, devendo-se medir agora pela sua intensidade.
Conflito de baixa intensidade
Aquele politólogo observa que atualmente a autoproclamada Junta Militar da Renamo tem recorrido a um conflito de baixa intensidade para contestar a liderança da Renamo e exigir a renegociação, com o Governo, do acordo de paz definitiva, de Agosto de 2019.
“Ele pode mostrar alguns argumentos para dar uma dimensão política, uma dimensão pessoal ou uma dimensão de resposta", explica Martinho Marcos, adiantando que o grupo dissidente está a optar por “guerra de longa duração e de baixa intensidade”.
“Há um esforço neste momento da (autoproclamada) Junta Militar da Renamo de tentar transformar o conflito não mais numa perspetiva partidária, mas numa perspetiva político nacional”, afiançoa o politólogo que apela o Governo a não olhar o grupo como “marginais políticos”.
Conflito tende a estabilizar-se
Para Sansão Nhancale, o conflito no centro de Moçambique tende “a estabilizar-se sob ponto de vista de ataques esporádicos”, e na “criação de suas próprias raízes”
O docente universitário, que apela para uma rápida solução do conflito, observa que as autoridades devem perceber que Mariano Nhongo não está sozinho, “assim como pensávamos que Afonso Dhlakama era o único homem grande da Renamo”, enquanto tinha aliados.
Para aquele analista, autoproclamada Junta Militar da Renamo tende “a ter sua própria base social, sua própria base de apoio, como aconteceu com a Renamo quando deixou de ter o apoio e financiamento do Apartheid”.