Numa entrevista à VOA, o académico moçambicano João Colaço afirmou que a presente onda de violência que assola as cidades moçambicanas de Maputo e Matola traduz uma clara ruptura do contrato social entre o Estado e a sociedade.
Colaço, que visitou os bairros atingidos, associa este fenómeno a um outro que surgiu na província da Zambézia, nos finais dos anos 70, o chamado chupa-sangue, que causou muito sofrimento às populações e foi seguido depois pela guerra civil que dilacerou Moçambique durante 16 anos. O académico considera que o problema de violência, sobretudo a justiça pelas próprias mãos, começou a ser uma prática muito comum nos últimos 10 anos, traduzindo-se nos linchamentos, um pouco por todo o país.
Diz não saber o que poderá estar por detrás da presente situação, mas considera que a criminalidade nas cidades moçambicanas tem vindo a crescer nos últimos tempos.
“Há um determinado tipo de crime, que é o crime do colarinho branco, que não tem sido aquilo que é a tónica corrente, mas há um tipo de violência que resulta, em parte, da nossa vulnerabilidade como sociedade, nomeadamente, o desemprego e a pobreza, entre outros problemas de natureza social”, afirmou João Colaço.
Segundo ele, quando estas situações são comuns e tendem a afectar as zonas mais vulneráveis como bairros periféricos, isso pode, muitas vezes, representar, em parte, esta vulnerabilidade.
Mas, por outro lado, as comunidades dos bairros periféricos, esperam que quem de direito faça o seu trabalho, e, neste caso deveria ser o próprio Estado, porque é ele que detém toda a máquina para, á sua maneira e em função daquilo que é a sua missão, pôr termo a esta situação.
O tipo de violência, como queimar pessoas, abusos sexuais e outros estão a tornar este fenómeno bastante tenso e desolador, ao ponto de produzir nas comunidades uma certa histeria.
“Há aqui uma clara ruptura do contrato social entre o Estado e a sociedade, a sociedade paga impostos, cumpre as leis emanadas pelo Estado, mas espera também que o Estado, no âmbito da responsabilidade social, cumpra o seu papel e uma das funções do Estado é garantir a segurança dos cidadãos, e quando o papel do Estado não é cumprido na sua íntegra, torna¬-se normal que os cidadãos directamente afectados façam justiça pelas próprias mãos”, realçou o académico.
Referiu ter conhecimento de que alguns cidadãos inocentes terão sido atingidos pela fúria popular, por, simplesmente, serem confundidos com assaltantes.
Nesta questão da violência, um dos problemas que existe é que tardou muito a apresentarem-se evidencias e muito do que se dizia surgia em forma de boato, e não restam duvidas de que o boato se torna verdade quando ele tende a permanecer por algum período de tempo.
João Colaço acha que no meio desta violência existam alguns oportunistas, porque nem todas as práticas de violência podem estar necessariamente ligadas aos chamados G-20. Há grupos que se aproveitam da ausência da polícia nos bairros afectados pela criminalidade.
“Ainda no fim-de-semana eu tentava dar volta pelos bairro periféricos de Maputo, para tentar perceber este fenómeno, e na maior parte dos bairros por onde passei, não existia nenhuma força policial, o que significa que a vulnerabilidade das comunidades deve ser muito grande. Tenho colegas de trabalho que não têm dormido e vem ao serviço com sono porque passaram a noite anterior de vigília”, frisou.
O académico afirmou ser interessante fazer um paralelismo com o fenómeno “chupa-sangue”, que foi comum na Zambézia, no final dos anos 70, salientando não saber se de facto esse fenómeno terá existido, mas foi, realmente, um boato que surgiu naquela província, e a população comportava-se de forma quase parecida; não dormia e passava a noite com batuque, dançando, com o medo dos chupa-sangue.
“A pergunta que faço é, se for verdade que o G-20 existe, o que virá a seguir, já que depois do fenómeno dos chupa-sangue, assistimos ao escalar do conflito político-militar, porque no caso da Zambézia, estávamos em plena guerra civil?”.
João Colaço disse ainda que ao Governo/Estado cabe o papel de colocar toda a sua capacidade de defesa que reúne neste momento, para proteger sobretudo a população vulnerável, aquela que vive nas periferias, que é aquela que mais precisa da presença policial.
Ramos Miguel
VOA-Maputo
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Diz não saber o que poderá estar por detrás da presente situação, mas considera que a criminalidade nas cidades moçambicanas tem vindo a crescer nos últimos tempos.
“Há um determinado tipo de crime, que é o crime do colarinho branco, que não tem sido aquilo que é a tónica corrente, mas há um tipo de violência que resulta, em parte, da nossa vulnerabilidade como sociedade, nomeadamente, o desemprego e a pobreza, entre outros problemas de natureza social”, afirmou João Colaço.
Segundo ele, quando estas situações são comuns e tendem a afectar as zonas mais vulneráveis como bairros periféricos, isso pode, muitas vezes, representar, em parte, esta vulnerabilidade.
Mas, por outro lado, as comunidades dos bairros periféricos, esperam que quem de direito faça o seu trabalho, e, neste caso deveria ser o próprio Estado, porque é ele que detém toda a máquina para, á sua maneira e em função daquilo que é a sua missão, pôr termo a esta situação.
O tipo de violência, como queimar pessoas, abusos sexuais e outros estão a tornar este fenómeno bastante tenso e desolador, ao ponto de produzir nas comunidades uma certa histeria.
“Há aqui uma clara ruptura do contrato social entre o Estado e a sociedade, a sociedade paga impostos, cumpre as leis emanadas pelo Estado, mas espera também que o Estado, no âmbito da responsabilidade social, cumpra o seu papel e uma das funções do Estado é garantir a segurança dos cidadãos, e quando o papel do Estado não é cumprido na sua íntegra, torna¬-se normal que os cidadãos directamente afectados façam justiça pelas próprias mãos”, realçou o académico.
Referiu ter conhecimento de que alguns cidadãos inocentes terão sido atingidos pela fúria popular, por, simplesmente, serem confundidos com assaltantes.
Nesta questão da violência, um dos problemas que existe é que tardou muito a apresentarem-se evidencias e muito do que se dizia surgia em forma de boato, e não restam duvidas de que o boato se torna verdade quando ele tende a permanecer por algum período de tempo.
João Colaço acha que no meio desta violência existam alguns oportunistas, porque nem todas as práticas de violência podem estar necessariamente ligadas aos chamados G-20. Há grupos que se aproveitam da ausência da polícia nos bairros afectados pela criminalidade.
“Ainda no fim-de-semana eu tentava dar volta pelos bairro periféricos de Maputo, para tentar perceber este fenómeno, e na maior parte dos bairros por onde passei, não existia nenhuma força policial, o que significa que a vulnerabilidade das comunidades deve ser muito grande. Tenho colegas de trabalho que não têm dormido e vem ao serviço com sono porque passaram a noite anterior de vigília”, frisou.
O académico afirmou ser interessante fazer um paralelismo com o fenómeno “chupa-sangue”, que foi comum na Zambézia, no final dos anos 70, salientando não saber se de facto esse fenómeno terá existido, mas foi, realmente, um boato que surgiu naquela província, e a população comportava-se de forma quase parecida; não dormia e passava a noite com batuque, dançando, com o medo dos chupa-sangue.
“A pergunta que faço é, se for verdade que o G-20 existe, o que virá a seguir, já que depois do fenómeno dos chupa-sangue, assistimos ao escalar do conflito político-militar, porque no caso da Zambézia, estávamos em plena guerra civil?”.
João Colaço disse ainda que ao Governo/Estado cabe o papel de colocar toda a sua capacidade de defesa que reúne neste momento, para proteger sobretudo a população vulnerável, aquela que vive nas periferias, que é aquela que mais precisa da presença policial.
Ramos Miguel
VOA-Maputo