Trabalhadores da Empresa Nacional de Pontes (ENP) de Angola, dada como falida pelas autoridades, protestaram na segunda-feira, 28, contra sete anos de salários em atraso, uma semana depois de terem forçado a retirada de equipamentos da Omatapalo do seu estaleiro em Benguela, soube a Voz da América.
Os trabalhadores não viam com bons olhos a presença da construtora, tendo a companhia sido subcontratada para obras milionárias a custo zero, e decidiram efectuar manifestações para a saída de um espaço com chefes de famílias em dificuldades sociais por conta da crise na sua entidade patronal.
Existe atualmente um ambiente de tensão no estaleiro na ENP região Centro, que atende igualmente as províncias do Huambo e Bié, localizado nos arredores da cidade de Benguela.
“Queremos o nosso dinheiro, queremos o nosso dinheiro, este ano não pode acabar, o Governo tem de ver isso, estamos a morrer”, gritavam funcionários.
As dificuldades sociais são bem mais complexas, com a fome incluída, de acordo com os funcionários João Quintas e Anastácio Silva.
Lembrando dez anos sem obras, uma das causas da falência, que deixou mais de 400 cidadãos sem rendimentos em todo o país, eles reforçam que o Ministério da Construção tem o que falta de 2023 para resolver o problema
“Não temos como resolver a situação das nossas famílias, as crianças fora do sistema escolar. Onde tem sete anos o que é que a pessoa vai comer? Não somos cabritos que comem capim e folhas”, lamenta Quintas, ao passo que Silva reforça que “estamos a ser tratados como cães mortos, já não somos vistos como pessoas”.
Foi nestas condições que tiveram de coabitar um ano e meio com a Omatapalo, até à manifestação que forçou a retirada do estaleiro de material usado em obras na cidade de Benguela.
Franco Manuel José, sindicalista da Empresa Nacional de Pontes, fala em promiscuidade numa relação que considera duvidosa
“Atendendo o nosso barulho … isso fez a empresa sair, caso contrário, permanecia aqui. Estão a dizer Estado para Estado, mas como é que você não paga o outro?”, questiona, acrescentando que “temos conhecimento de que a Omatapalo é privada, ganhou obras a nível nacional, não pode ficar a custo zero”.
À VOA, Carlos da Silva, director de obras da Omatapalo, explica que foi o Governo Provincial a autorizar a sua presença naquela espaço, tal como confirmou, sem entrevista gravada, o vice-governador provincial para a área técnica e de infra-estruturas.
Adilson Gonçalves, que critica a postura dos trabalhadores, explicou que a construtora poderia ter dado alento à ENP, com benfeitorias nos escritórios e dependências em degradação.
Depois destes contactos, na última semana, a Omatapalo viria a pagar pouco mais de 60 mil Kwanzas, quase 73 dólares norte-americanos a cada um dos cerca de 40 trabalhadores em Benguela.
Sobre esta e outras empresas públicas em falência, como a Empresa Nacional de Electricidade, a Angola Telecom, Biocom, entre outras, o jurista Chipilica Eduardo alerta para os vínculos laborais ainda existentes
“São quadros permanentes da empresa enquanto não existir extinção nos termos da lei. Portanto, a empresa existe, assim como o contrato laboral, até porque a paralisação não é imputável aos trabalhadores”, indica o especialista.
O Instituto de Gestão de Activos e Participações do Estado (IGAPE), que apresentou recentemente um relatório sobre as empresas públicas em falência técnica, leva a cabo um processo de privatizações, extensivo a muitas das visadas, sem que se saiba o futuro de milhares de trabalhadores sem salários há várias décadas.