Partidos políticos, membros e organizações da sociedade civil e a comunidade académica deverão no final do mês discutir a reconciliação nacional em Angola que muitos dizem não existir ou estar em perigo.
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Recentemente dirigentes de partidos da oposição têm afirmado que o calar das armas há 13 anos atrás ainda não se traduziu numa verdadeira paz e numa verdadeira reconciliação, sublinhando recentes ataques contra militantes e mesmo deputados da oposição.
A iniciativa para a mesa redonda é do Centro de Debates e Estudos Académicos cujo presidente Agostinho Sikato, diz que o objectivo é promover o espírito de reconciliação nacional através da abordagem franca, aberta e sobretudo político-científica do assunto.
“Acho por bem que a comunidade académica deve ser o motor principal para que as instituições políticas despertem o sentido da própria paz e reconciliação nacional”, sublinhou.
O Centro de Debates e Estudos Acadêmicos entende que temas como a reconciliação nacional e a história de Angola ainda são sensíveis.
Agostinho Sikato diz que por isso, a sociedade angolana “finge” estar reconciliada, pelo que defende por outro lado, que as instituições existentes para o efeito devem fazer mais para a reconciliação entre os angolanos outrora desavindos.
Para o também docente universitário a convivência entre militantes de partidos políticos no território angolano ainda não é salutar, situação que tende a resultar em actos de intolerância política, sobretudo no interior de Angola. Várias pessoas já morreram vítimas da intolerância política.
De temas sensíveis a história de Angola está repleta, diz o académico.. Ao longo dos 40 anos de independência, que assinalam a 11 de Novembro do corrente, muitos factos tiveram lugar neste espaço territorial e que até a presente data ainda não foram esclarecidos.
Com o objectivo de “reflectir sem reservas” sobre alguns aspectos sensíveis da história de Angola, a Associação Justiça, Paz e Democracia realizou de 14 á 16 deste mês a 1ª Conferência Nacional sobre "O Direito à Verdade e à Memória Colectiva como Direitos Humanos na Construção do Estado Democrático de Direito".
Para a AJPD, a conferência pretendeu promover um espaço de discussão inclusiva entre várias pessoas, em busca de mais informações sobre o processo de afirmação da história de Angola, sobretudo das causas e da origem do conflito.
“O que nós pretendemos com esta conferência é exatamente olhar para o passado de modo a que as gerações atuais e futuras não possam repetir os mesmos erros que a geração de libertação cometeu ao longo desses anos”, explicou António Ventura Membro da direcção daquela organização não governamental que promoveu o debate.
O certame reuniu além de políticos, académicos, estudantes universitários, jornalistas, membros da sociedade civil entre outros.
Reginaldo Silva, jornalista e sobrevivente do 27 de Maio de 1977, contou na primeira pessoa as amarguras que viveu após ter sido preso na sequência da famosa “intentona golpista”.
Mais do que o número de mortos, a violação dos direitos humanos e das famílias que perderam ente-queridos na sequência de desconfianças de uma tentativa de realização de um golpe de Estado contra o presidente angolano na altura, António Agostinho Neto, Reginaldo Silva manifestou-se preocupado com a falta de interesse do MPLA, partido no poder em Angola, 38 anos depois, em reconciliar-se com a história, esclarecendo a chassina.
“O que me preocupa 38 anos depois é efectivamente a nossa história e, sobretudo o partido que teve mais a ver com esta tragédia não ter conseguido recociliar-se com a sua própria história. Não ter conseguido resolver todo um conjunto de situações que a repressão criou e que o próprio MPLA admitiu como consequência desta situação muitos angolanos foram afectados, muitas famílias viram os seus direitos afectadas”, sublinhou.
Para Reginaldo Silva, sobram apenas dúvidas sobre o número de possoas mortas em resultado da repressão contra a susposta tentativa de golpe de estado.
O jornalista e analista político mostra-se céptico em relação a um possível pronunciamento ofocial do Estado sobre o número exacto de mortos. Para si, há cada vez menos interesse em se recuperar a história.
De tema sensível a tema sensível na mesa redonda promovida pela AJPD também foi abordada a intitulada “Queima das Bruxas na Jamba”.
Eugénio Manuvakola, deputado e membro da direcção da UNITA não refutou as acusações segundo as quais durante o tempo de guerra, na mata, o seu partido levou a cabo uma campanha que visava queimar pessoas acusadas de prática de feitiçaria.
O político considerou a informação como pública que para si “pode ser confirmada por qualquer pessoa que esteve na Jamba”.
A questão, segundo o responsável , deu lugar à necessidade de um debate interno que até agora ainda não foi acertado, pelo que ainda se precisa esclarecer as vítimas, que existem mesmo a nível da direccção da UNITA.
“Este é um problema que criou dentro do nosso partido a necessidade de um debate interno, que se calhar ainda não fizemos, que precisamos fazer para nós podermos acertar quem é a vítima morta e quem é a vítima viva”, disse o político acrescentando que “vítimas são muitas”, até mesmo na direcção do partido.
Eugénio Manuvakola entende que existem muitos passivos que tiveram lugar “na mata”, entre os quais a “queima das bruxas, que segundo o político afectou a todos”.
Manuvakola disse também que o probelma reside na crença ao feiticismo, por isso aproveitou a ocasião para esclarecer que é “um problema que afecta a UNITA, mas que precisa antes de mais ser internamente abordado, e neste sentido apelou à sensibilidade da sociedade angolana”.
“Gostaria de pedir aqui ao nosso auditório que nos deixassem fazer o trabalho de casa. O trabalho de casa é a UNITA abordar o assunto internamente e acertar, porque é por dentro que ainda temos de conversar”, sublinhou reafirmando que “o problema aconteceu”, mas ainda carece de uma discussão interna.
O 27 de Maio e a queima de bruxas na Jamba não foram os únicos assuntos abordados nesta mesa redonda. Tunga Alberto, antigo presidente da Assembleia do Conselho de Coordenação dos Direitos Humanos contou a experiência que viveu na “Sexta-feira Sangrenta” outro facto da história de Angola que levou a vida de centenas de angolanos em Janeiro de 1993.
“A acção passava em simultâneo em mjuitas províncias Nas lundas prendiam jovens bacongo metiam num contentor, fechavam, a pós a sua morte iam deitar nas valas comuns, na altura já existia a cultura de valas comuns. O que aconteceu é terrível e se estamos em vida é porque Deus permitiu”, disse acrescentando que o que esta experiência criminosa foi ensaiada nos Congos Brazaville e Domcrático contra a etnia dos Bakongo.
São factos como os narrados por Reginaldo Silva, Tunga Alberto e Eugénio Manuvakola que o Centro de Debates e Estudos Acadêmicos pretende abordar em livro, num projecto que visa “fazer um estudo sobre a história recente de Angola”.
Agostinho Sikato, presidente do CDEA, esclareceu que o que se pretende é dar a conhecer ao público os grandes acontecimentos da história recente do país. Para o efeito, o estudo deverá abranger os anos que vão de 1950 à 2012, repartidos em vários periodos e temas.
“Estamos a tratar da história recente apenas, e delimitamos e repartimos em 4 partes: 1950-1974, 1975-1991, 1992-2002, 2003-2012. Estes são os peridos a estudar. As áreas específicas também elegemos algumas com o é o caso da histórial social, história política, histórial militar, história cultura e a 5ª é a história económica”, disse o acadêmico esclarecendo por outro lado que é neste periodo que tiveram lugar os grandes acontecimentos da história recente de Angola.