“Angola é um país onde as pessoas mais corruptas não chegam a ser julgadas e começam a ter prazer em serem apenas acusadas de corrupção”, afirmou o jornalista e activista angolano Rafael Marques ao receber na sexta-feira, 22, em Abuja, na Nigéria, o Prémio Herói da Liberdade de Imprensa, do Instituto Internacional de Imprensa.
No discurso em que aceitou o reconhecimento, Marques lembrou que os corruptos são “arguidos” para sempre e que o seu trabalho como jornalista de investigação é muito difícil, o que faz dele também um activista.
“O jornalismo de investigação a que me dedico através do Maka Angola, embora decorra num ambiente hostil, tem contribuído para alimentar a esperança de muitos angolanos comuns, que acreditam que uma força em prol do bem possa vingar na sociedade”, defendeu Marques, acrescentando que “ser jornalista independente em Angola é lutar pelo espaço e pelo direito de trabalhar como tal (…) e isso faz também um activista”.
Marques lembrou que a notícia do prémio foi recebida por muitos angolanos com tanto entusiasmo que fizeram circular nas redes sociais a imagem dele como sendo o Pantera Negra de Wakanda.
“Este prémio não é para mim. Trata-se de uma distinção que reflecte a esperança de muitos angolanos: a esperança de que as mudanças não decorram simplesmente de decisões políticas, mas também de uma consciência e de uma postura proactiva crescentes por parte da sociedade civil no meu país”, defendeu o jornalista, que, na ocasião, afirmou que “é por estes angolanos esperançosos e com grande sentido de responsabilidade – mas sem as vestes do Pantera Negra – que humildemente aceito este prémio”.
Para Marques, "a pilhagem dos recursos do Estado, os abusos dos direitos humanos, a corrupção e o desprezo político pelo sofrimento do povo são os principais males da sociedade angolana”, onde, segundo Marques, “os poderosos tiram o que legitimamente pertence a todos, assim espezinhando todos”.
Na ocasião, o jornalista e activista agradeceu a organização não governamental National Endowment for Democracy pelo apoio fundamental disponibilizado nos últimos seis anos que lhe permitiu para continuar o trabalho e "manter a cabeça acima da linha de água”.
De igual modo, esendeu os seus agradecimentos aos “colaboradores, amigos e fontes que têm contribuído de forma inestimável para a produção de qualidade do portal Maka Angola”, tendo muitos, segundo ele, manifestado a sua solidariedade nestes últimos dias, "em que mais uma vez sou julgado por expor os corruptos e a teia obscura do poder angolano”.
Na sua intervenção, o jornalista revelou que o seu filho adolescente quer estudar gestão de negócios e ter os recursos necessários para apoiar a sua independência e, consequentemente, oferecer-lhe mais ferramentas para intensificar a luta pelas liberdades de imprensa e de expressão, a boa governança e os direitos humanos.
“Espero que, quando ele alcançar os seus objectivos, venha a fazer parte de uma nova Angola, que o país esteja pronto para receber o seu contributo para o desenvolvimento e que as liberdades de imprensa e de expressão sejam um dado adquirido”, manifestou Rafael Marques em Abuja.
O prémio
Ao atribuir o prémio Herói Mundial da Liberdade de Imprensa ao jornalista a 22 de Maio, o Instituto Internacional da Imprensa (IPI) destacou que Marques "tem enfrentado décadas de assédio e processos jurídicos ao revelar a corrupção e os abusos de direitos humanos" em Angola.
Entretanto, “apesar da repressão sistemática dos meios independentes em Angola, Rafael Marques tem conseguido – correndo grande risco pessoal – fazer incidir uma luz no abuso de poder ao nível mais elevado com coragem e persistência”, destacou, na altura, a directora-executiva do IPI.
Barbara Trionfi lembrou que, através dos seus artigos, livros e pesquisa, "o senhor Marques tem levado a cabo o tipo de jornalismo de vigilância que os meios controlados pelo Estado do país não conseguem concretizar, proporcionando um serviço essencial ao público angolano e à comunidade internacional”.
O Prémio Herói Mundial da Liberdade de Imprensa do IPI homenageia jornalistas que deram uma contribuição significativa para a promoção da liberdade de imprensa, particularmente aqueles que colocam em risco a sua integridade pessoal.