Radar Magrebe Lusófono #11: Mocimboa da Praia - Último Trimestre de 2017: Algumas especulações/conclusões

Mocímboa da Praia

Desde 05 de Outubro, que Mocímboa da Praia deixou de ser o que sempre foi aos olhos do ocidental que por ali passa e se encanta com a costa de Cabo Delgado. Ou seja, os cerca de 400 km de Pemba à foz do Rovuma, deixaram de ser o potencial destino de lua-de-mel que sempre foram, a par com as insulares Quirimbas, para passarem a ser a mais potencial “no go zone” de 2018.

Há dúvidas, sobre se há realmente terrorismo islâmico organizado e afiliado com o Al-Shabab, no norte de Moçambique, mas a verdade é que o cenário já é de guerra. 308 capturados (208 processados) desde Outubro e um Director Nacional de Reconhecimento da Unidade de Intervenção Rápida assassinado, são os números mais resumidos, mas que ganham outra escala, se mencionarmos que como resposta à morte deste policial e ao fim do prazo dado pela PRM para os insurgentes se entregarem, as Forças de Defesa e Segurança (FDS) ripostaram com bombardeamentos em Mitumbate, um dos redutos jihadistas, utilizando meios aéreos (2 helicópteros) e um navio com fuzileiros. 50 mortos, incluindo mulheres e crianças.

A “Guerra Do Atum”

A “Guerra do Atum”, trata-se de um eufemismo para chamar à problemática jihadista de Mocímboa da Praia ao escândalo EMATUM (EMATUM, Proindicus e MAM são as 3 empresas públicas envolvidas), já estimado em 2 mil milhões de dólares (só a EMATUM). Neste particular, o “Moçambique esclarecido” advoga que os acontecimentos do último trimestre em Cabo Delgado, não mais são que uma cortina de fumo para desviar a atenção da opinião pública sobre este escândalo, ao mesmo tempo que oferece uma solução para o mesmo!

Por partes, A EMATUM (Empresa Moçambicana de Atum), foi criada pelo Governo em 2013 para potenciar a exploração da pesca do atum. Para o efeito o Governo contraiu uma dívida de 850 milhões de dólares para a compra de 24 embarcações. Hoje, já em operação, a EMATUM tem-se revelado insustentável, com parte da frota paralisada. Este caso também conhecido como o da “dívida oculta”, fez com que FMI e doadores internacionais exigissem uma auditoria externa, sob pena de cancelarem a ajuda económica e financeira a Moçambique. Em Setembro de 2016, o PR Filipe Nyusi entendeu-se em Washington com John Kerry, então secretário de estado norte-americano, abrindo caminho para uma auditoria externa a efectuar pela americana Kroll. A vida desta empresa tem sido dificultada pelas autoridades moçambicanas e, por isso mesmo a ajuda externa continua suspensa.

Um “coelho” Chamado Eric Prince

O “coelho” que a Presidência de Filipe Nyusi poderá tirar da cartola em 2018, talvez se chame Eric Prince, o fundador da Blackwater, que já veio a público manifestar interesse em investir nas 3 empresas pesqueiras falidas. E é aqui que tudo se torna ainda mais interessante!

Ora associar um ex-US Navy SEAL, fundador da empresa de segurança privada que mais contratos ganhou no Iraque, do qual não saiu imaculada, a Blackwater é, parece-me, colocar Moçambique a jeito para uma catadupa de consequências, das quais as mais previsíveis poderão ser as seguintes:

- Os americanos da “Era Trump”, que em questões de Política Externa, apenas diferem dos da “Era Obama” por serem mais agressivos, bem patente na recente questão sobre Jerusalém, poderão muito bem forçar Moçambique a aceitar albergar em Cabo Delgado a almejada Base Central de Comando Militar Americano em África, vulgarmente conhecida por AFRICOM, em troca do investimento de Prince no Pacote EMATUM, Proindicus e MAM, segurando a economia moçambicana e, beneficiando também os americanos de uma vasta frota pesqueira pelo mar moçambicano, o que apertaria ainda mais a malha da monitorização de pesca ilegal e migração por via marítima;

- Com a AFRICOM instalada em Cabo Delgado, teremos que acrescentar a esta Província a etiqueta “No Go Zone” e, considerar Moçambique como um potencial alvo de actos terroristas, vindos sobretudo do Iraque, ou com voz de comando nesta origem, como vingança por o país acolher um inimigo declarado, de nome Eric Prince.

Outras razões para a criação de uma “No Go Zone”

Há uma memória colectiva moçambicana muito forte sobre Gungunhana, a sua resistência e, sobretudo a propósito da captura do então “Leão de Gaza” em 1895, pelos portugueses, tendo este feito catapultado para a ribalta o seu captor, o Oficial de Cavalaria Mouzinho de Albuquerque, o mesmo que no ano seguinte chegará a Governador de Moçambique e Comissário Régio e, que ainda hoje tira o sono aos altos responsáveis da FRELIMO! É verdade, é que também faz parte da memória colectiva dos moçambicanos informados um plano gizado por Albuquerque na altura, o qual para tornar a Colónia economicamente mais viável, a partia em 3, tendo nos principais rios as fronteiras desta “Federação antes-da-letra”. Assim e, para além de se ter insurgido contra a mudança da capital da Colónia da Ilha de Moçambique para Lourenço Marques (precisamente porque do Rio Zambeze para norte era onde os portugueses tinham “menos chão”), projectava um Moçambique tripartido, de sul para norte entre os rios Maputo e Save, entre o Save e o Zambeze e entre o Zambeze e o Rovuma.

Ora, segundo o resultado das últimas eleições provinciais moçambicanas, este projecto federativo vai ao encontro das ambições da RENAMO, vencedor no centro e norte do país, mas impedido de governar. À FRELIMO e ao Governo de Moçambique, interessam assim ter uma razão válida para a deslocalização e descentralização do seu aparato militar, tendo em Cabo Delgado, “Província Petroleira”, a conjugação perfeita de factores que a obrigam a ter uma presença musculada.

Veremos ao longo de 2018, a evolução dos acontecimentos, não esquecendo que o ex-PR Guebuza jogou sempre com o fantasma da presença da Al-Qaeda no país, parecendo que o actual PR Nyusi, joga com presença do Al-Shabab!

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Politólogo/Arabista/Colaborador VOA/Radar Magrebe