O processo de privatizações em curso em Angola está a ser apontado por analistas e pela oposição como a transferência de bens públicos de um grupo outrora ligado ao antigo Presidente José Eduardo dos Santos para uma nova elite económica próxima ao actual Chefe de Estado.
Há quem, no entanto, rejeita esta leitura, mas reconhece que o processo não está privilegiar o empresariado nacional.
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Os processos de privatização do BCI, do Centro Comercial Kero e mesmo do controlo da Reserva Estratégica Alimentar têm levantado algumas suspeições sobre a forma utilizada e as empresas beneficiadas.
O deputado da UNITA, na oposição, Joaquim Nafoia diz não existir no país nenhum processo de privatização, mas uma estratégia de transferência da riqueza.
"O grupo que acha que no tempo de José Eduardo dos Santos roubou menos está a espoliar os bens do grupo que roubou mais, o Presidente João Lourenço havia prometido combater o monopólio mas está a fazer exactamente o contrário, a fomentar o monopólio em Angola”, afirma Nafoia, quem aponta “o que está a passar com a Omatapalo, do seu amigo governador de Benguela, que está a abocanhar tudo que é empreitada, é uma prática que ocorre hoje no país de tirar do erário publico e distribuir aos seus familiares, amigos que por via do esbulho, a riqueza acaba por ficar nas mãos da mesma família política".
O economista e professor universitário Tomás Kambuete é da mesma linha de pensamento e dá exemplo do Centro Comercial Kero.
"Há um combate de um grupo de pessoas que tinham o poder económico, dentro da mesma família politica do MPLA, logo não se está a combater este mal que é a corrupção, estão apenas a combater entre si, tirando de uns para outros, no meio de tudo isto, o país é que sai a perder, estamos a voltar à estaca zero, a economia tem um princípio da continuidade, não se pode interromper este principio, como se está a fazer em Angola, com estas privatizações”, diz Tomás Kambuete
Aquele académico acrescenta: “repare o caso do Kero que já tinha um caminho feito, a nova elite económica, ao invés de criar novas empresas, apodera-se das empresas já existentes como o Kero, quebra-as e isto representa um retrocesso".
Leitura diferente tem o presidente da Associação Industrial Angolana, para quem "é um bocado arriscado pensar-se no surgimento de uma nova elite neste processo de privatizações, apesar de haver alguns que mereçam questionamento, mas só o IGAPE pode aferir isso”.
No entanto, José Severino diz que “a única questão que levantamos é que quando for destes concursos, a primeira lista de empresas concorrentes deve ser publicitada para se evitar suspeições".
Aquele empresário defende, no entanto, que o empresariado nacional devia ter mais privilégios.
"O empresariado nacional está a ser posto de lado nestes processos, o IGAPE devia, dentro das suas atribuições, ouvir mais as associações empresariais, temos feito anotações que não são consideradas", conclui.
O jornalista Escrivão José, que tem acompanhado o processo, diz discordar destes concursos “feitos por debaixo da mesa, sem qualquer transparência”.
“Temos a Omatapalo e o grupo Carrinho, que apareceu agora do nada, e que controlam o poder económico do país, quando investigamos vemos que são os donos do país, é a substituição do grupo de José Eduardo dos Santos pelo grupo de João Lourenço, a empresa que supostamente venceu o concurso pelo BCI é a mesma que agora controla a Reserva Estratégica Alimentar do país, de quem são estas empresas? É só vermos como hoje João Lourenço na liderança do país, as contratações que se fazem com a falência de várias empresas, o Kero hoje não vale nada para o povo, temos o Nosso Super à deriva".
O programa do Governo ProPriv prevê a privatização de mais de 190 empresas e/ou activos do Estado até 2022 nos sectores da banca, agricultura, hotelaria e turismo, finanças, seguros, indústria, telecomunicações, petróleos, entre outros.