PR guineense fala em consequências ao voto do Parlamento contra acordo de partilha com Senegal

Presidente da Guiné-Bissau, Umaro Sissoco Embaló fala a jornalistas na Presidência, Bissau, 24 de Setembro de 2021

Juristas divergem sobre competências do PR e do Parlamento para assinar e ratificar acordos

O Presidente da Guiné-Bissau disse que vai haver consequências da decisão do Parlamento de considerar “nulo e sem efeito” o acordo sobre Zona Económica Exclusiva, assinado em Outubro do ano passado entre a Guiné-Bissau e o Senegal.

Juristas divergem sobre os poderes do Parlamento e do Presidente da República.

Umaro Sissoco Embaló, que falava à margem da cerimónia de inauguração de uma fábrica de farinha, em Bissau nesta segunda-feira, 20, qualificou de má-fé e um “teatro” a posição da Assembleia Nacional Popular.

“Foi um teatro. A Assembleia não tem essa competência nem no regimento e nem na Constituição. Há mecanismos. A verdade é que há má-fé que terá as suas consequências”, afirmou Embaló em relação à resolução do Parlamento de considerar nulo o acordo por ele assinado com o seu homólogo Macky Saal.

Em conversa com a VOA, o jurista Carlos Vamain, próximo do chefe de Estado, defende a legitimidade do Presidente da República em assinar o acordo porque “a Assembleia Nacional Popular tem a competência tão só de aprovar os tratados que implicam a participação da Guiné-Bissau nas organizações internacionais, tratados de paz, de segurança, de rectificação das fronteiras marítimas e outros tratados que o Governo entenda lhe submeter”.

Para Vamaim, “a decisão do Parlamento é inexistente em direito, na medida em que não lhe compete anular e nem decidir relativamente às decisões dos outros órgãos da soberania”.

Leitura diferente tem o também jurista, Fransual Dias, para quem as competências do Presidente da República estão nos artigos 68º e 69º da Constituição da República e “a única competência que o Presidente tem é a representação do Estado nas cimeiras e nas conferências do Estado”.

“Não compete ao Presidente da República negociar e concluir os acordos internacionais. Obviamente o artigo 7º da convenção de Viena coloca um elenco de personalidades com poderes originários de assinar os acordos, onde está o Presidente da República, o primeiro-ministro, ministro dos Negócios Estrangeiros, mas isso tem que se ver, segundo o mesmo artigo, com o que está consagrado a nível interno de cada Estado”, explica em conversa coma VOA.

Neste caso, acrecenta Dias, “a Assembleia Nacional Popular, que é o órgão que aprova esses acordos nos termos da Constituição, para poder vincular a Guiné-Bissau, fez muito bem, enquanto o órgão representativo do povo da Guiné-Bissau declarar ´nulo e sem efeito´ o acordo”.

Na semana passada, o Espaço de Concertação das Organizações da Sociedade Civil da Guiné-Bissau pediu a responsabilização criminal dos implicados na assinatura do “acordo de petróleo” com o Senegal.

Neste aspecto, Carlos Vamain considera que o Presidente só pode ser responsabilizado criminalmente quando há crime, e, nesse caso, “caberia à Assembleia acusar o Presidente por 2/3 dos deputados e depois enviar para a Procuradoria-Geral da República que vai instruir o processo caso haja crime. Não havendo crime, arquiva-se o processo”, reiterando qu não há qualquer crime nesse caso.

Por seu lado, Fansual Dias sustenta que qualquer tentativa de responsabilizar o Presidente da República criminalmente não terá efeito na justiça guineense porque, para ele,“domina o poder judicial”.

Aliás, é por isso que, a todo custo, fez todo o esforço para imporJosé Pedro Sambú no Supremo Tribunal de Justiça e substituiu o antigo Procurador-geral da República, Dr. Fernando Gomes pelo ´capa de ferro´, que é Bacari Biai”, diz Dias.

PR explica

Nas suas declarações aos jornalistas, Umaro Sisoco Embaló afirmou que depois de assinar o acordo entregou o documento à ” ministra dos Negócios Estrangeiros que por sua vez o entregou ao primeiro-ministro que tinha de o levar para o Conselho de Ministros onde o Governo toma as decisões”.

Ele continuou que após a discussão no Conselho de Ministros "o documento vai para o gabinete do ministro da Presidência do Conselho de Ministros que o manda para o Presidente ou para o Parlamento para ratificação".

"Não temos petróleo. É verdade que há aqui uma má-fé que terá as suas consequências. Por inerência da Constituição da República eu sou uma instituição. Todos os outros são chefes de instituições, mas não são instituições", afirmou.

Depois de pedir diálogo aos demais actores, Umaro Sissoco Embaló disse:"Eu não dou satisfações a ninguém só ao povo da Guiné-Bissau. Eu é que promulgo, veto, dissolvo, exonero, nomeio e dou a posse. É da Constituição da República, não da minha autoria".

O Acordo de Gestão e Cooperação entre a Guiné-Bissau e o Senegal foi assinado em Outubro de 1993 e, no ano passado, foi renovado com a Guiné-Bissau a ter 30 por cento das receitas de exploração da Zona Exclusiva Conjunta, contra 15 por cento do primeiro acordo, e Senegal 70 por cento.