As autoridades judiciais moçambicanas instauraram 36 processos-crime em 2020 devido aos ataques armados atribuídos à autoproclamada Junta Militar da Renamo e quase oito mil por violência doméstica.
Ao apresentar o seu informe anual na Assembleia da República, nesta quarta-feira, 28, a Procuradora-geral da República (PGR) revelou também que foram recuperados 8,9 milhões de euros e 19 imóveis, no ano passado, no âmbito do combate à corrupção.
Beatriz Buchili afirmou que os ganhos gerados pelas atividades criminosas, em particular pela corrupção, "têm sido apontados como um enraizado problema de governação, na maior parte dos países, com efeitos negativos no combate à pobreza e na promoção do desenvolvimento".
A procuradora-geral tambem se referiu ao terrorismo que, para ela, não está dissociado de outros de crimes "como tráfico de armas, drogas e pessoas, exploração ilegal de recursos minerais, florestais e da fauna, lavagem de dinheiro e financiamento do terrorismo".
A PGR emitiu 12 pedidos de assistência mútua legal para nove países, incluindo Portugal e África do Sul.
No que toca à violência no centro do país, Buchili revelou que das 36 acções devido à actuação dos dissidentes da Renamo, 32 foram na província de Sofala e quatro na província de Manica.
Buchili considerou que “estas ações armadas no centro do país desafiam a intervenção das instituições judiciárias na instrução de processos pela inacessibilidade das zonas afectadas, particularmente no que se refere à recolha de evidências e realização de exames periciais no local, como elementos de prova essenciais para uma investigação profícua".
Entretanto, Buchili apelou ao diálogo com a Junta Militar da Renamo,
No capítulo da violência doméstica, a PGR disse ter havido uma redução de pouco mais de um por cento dos processos-crimes instaurados em relação a 2019.
Em 2020, o Ministério Público instaurou 7.591 processos-crime, menos 89 que no ano anterior.
A província de Gaza registou o número mais elevado de processos (1.351), seguida de Inhambane (1.272) e da cidade de Maputo (1.132).
Para Beatriz Buchili, as causas da violência contra as mulheres são diversas “entre os quais a vulnerabilidade".
Entretanto, ela apontou a falta de colaboração das vítimas de sexo feminino “como um entrave à recolha de prova de violência doméstica, devido ao medo de retaliação, vergonha, vontade de preservação da relação com o agressor e dependência económica”.
A PGR acrescentou que essa violência doméstica também teve como vítimas crianças, idosos e homens.
Superlotação das cadeias mantém-se
Tema recorrente do debate sobre a justiça no país, a superlotação das cadeias, Buchili revelou que a população prisional reduziu 5,2% de 2019 para 2020, mas as cadeias continuam superlotadas e alguns reclusos cumprem penas nas celas dos comandos da PRM por falta de transporte para sua transferência para as penitenciárias.
A redução, segundo a PGR, deveu-se à aplicação de penas alternativas e clemência do Presidente da República.
Terroristas com armas sofisticadas
Durante a sua longa intervenção, Beatriz Buchili abordou a situação em Cabo Delgado, tendo reconhecido que os “terroristas usam armas sofisticadas”
Para enfrentar o problema, Beatriz Buchili defende o fortalecimento da capacidade das instituições visando restabelecer a segurança nas comunidades e garantir protecção nas fronteiras.
Por outro lado, ela considerou que 2020 foi, para o país, um ano particularmente difícil, “face às calamidades naturais, conflitos armados nas regiões Centro e Norte do país e a pandemia da Covid-19”.
A PGR explicou que estes factos trouxeram implicações adversas no cumprimento do plano de actividades do Ministério Público e no desempenho dos magistrados e demais funcionários no que respeita às diligências processuais, realização de visitas aos estabelecimentos penitenciários e centros de acolhimento, acções que visam aproximar, cada vez mais, os serviços aos cidadãos, e, por via disso, melhorar o acesso à justiça.