Em Moçambique, apesar de haver sectores que estão a carregar a bandeira da liberdade de imprensa, nos últimos anos a qualidade da mídia no país empobreceu, e, neste particular, o calcanhar de Aquiles é o sector público.
A opinião é de jornalistas moçambicanos.
Tomás Vieira Mário considera que nos últimos tempos a comunicação social tem baixado de qualidade em todos os aspectos, nomeadamente, em termos das matérias que aborda e da profundidade com que aborda.
Your browser doesn’t support HTML5
Aquele jornalista anota qu "cada vez mais a comunicação social, quer pública, quer privada, está muito dependente das agendas oficiais, e o que se reporta são actividades da agenda do Governo, do Parlamento ou de tribunais".
"Eu penso que nos últimos tempos, a nossa comunicação social tem baixado de qualidade em todos os aspectos, nomeadamente em termos das matérias que aborda e da forma como aborda", realça.
Associado a isso, existem também os grandes projectos extractivos, que, geralmente, suscitam conflitos com as comunidades locais e, para Vieira Mário, "estas são questões macro que marcam o perfil de Moçambique nos dias que correm, mas que são tratadas esporadicamente, e mesmo assim, sempre a reboque de fontes oficiais ou das empresas privadas envolvidas nesses projectos".
Veja Também Jornalistas moçambicanos ainda enfrentam muitos desafios, como cobertura da guerra e auto-censuraEmpobrecimento da qualidade
Tomás Vieira Mário sublinha que este ano e o passado, "empobrecemos muito a qualidade da mídia", explicando que na comunicação social do sector público, "é muito notória a presença esmagadora do Governo e do partido, em particular na televisão pública, e isso, naturalmente, vicia um pouco a linha editorial".
Aquele jornalista explica que que se todos os dias há eventos públicos que a televisão pública deve seguir obrigatoriamente, ela fica sem meios técnicos e humanos para outras agendas da sua própria autonomia, fica monopolizado pela agenda oficial à qual não se pode furtar.
O mesmo se pode dizer da Rádio Moçambique, quando a agenda oficial é intensa e deve ser cumprida obrigatoriamente, "eles ficam sem tempo nem meios para fazer agendas autónomas".
Em relação à imprensa privada, aquele analista político diz pensar que “ela se ressente da carência de meios robustos para fazer grandes viagens, ir pesquisar, num país vastíssimo e com custos muito altos".
Carregar a bandeira da liberdade de Imprensa
Entretanto, para o jornalista Fernando Lima há sectores que estão a fazer o seu melhor e que estão a carregar a bandeira da liberdade de imprensa, mesmo estando a lutar com dificuldades de natureza económica, agravadas pela Covid 19.
"Mas há jornalistas e mídia que tentam fazer o seu papel, no nosso país, o calcanhar de Aquiles é o sector público, e aqui, basicamente, significa que temos leis, temos a Constituição, mas esse sector público, ainda está muito de costas voltadas para as liberdades e a independência inscritas na Constituição", lamenta.
Aquele analista político acrescenta que também o Governo não faz o seu papel, não respeita os princípios constitucionais, incluindo um princípio muito importante, que é o acesso à informação, “o Governo respeita muito pouco o princípio de disponibilizar a informação para o público, e este, muitas vezes tem tido essa informação, exactamente, através da comunicação social”.
Lima enfatiza ainda que, sobretudo por causa da situação de Cabo Delgado, há muito mais restrições para os jornalistas trabalharem, "e portanto, há várias grandezas no país em termos de liberdade de imprensa, e há zonas em que ela é mais respeitada e zonas em que a liberdade não é respeitada".
Moçambique cai na avaliação em 2022
No Índice Mundial da Liberdade de Imprensa divulgado nesta terça-feira, 3, Moçambique caiu da 108.ª posição para a 116.ª.
O relatório diz que a reeleição de Filipe Nyusi como Presidente e o frágil acordo de paz com o braço armado do principal partido da oposição "não abrandaram o preocupante declínio da liberdade de imprensa em Moçambique", onde há um “ambiente marcado por um crescente autoritarismo e cada vez mais dificuldades de acesso à informação".