A intensificação de ataques de insurgentes a aldeias dos distritos a norte da provincia moçambicana de Cabo Delegado agravaram a já débil forma de sobrevivência de milhares de populares, que vivem da agricultura e pesca.
Your browser doesn’t support HTML5
A população receia agora aceder às áreas agrícolas e à costa, sua única base de sobrevivência, por medo de ataques de grupo de insurgentes, que intensificaram as suas incursões nos últimos meses nos distritos de Macomia, Palma e Mocímboa da Praia.
Estima-se que mais de 30 pessoas morreram, a maioria decapitadas, nos três distritos entre Maio e Julho, depois de um abrandamento dos ataques após a passagem do ciclone Kenneth, em Abril.
Não se sabe ao certo quantas pessoas abandonaram as suas fontes de sobrevivência em consequência dos ataques naqueles distritos, pela escassez de informação, devido a fortes restrições de acesso à área a jornalistas e a recusa intermitente das autoridades em prestar declarações a imprensa.
Alguns residentes contaram à VOA que aumentou o número de aldeias que estão a ficar desertas e há mais pessoas sem acesso aos campos agrícolas e às costas, situação que agravou a fome entre os populares.
“Há pessoas que foram decapitadas na machamba, uns quando tentavam colher mandioca e outras a sachar”, disse na condição de anonimato um morador de uma aldeia de Pundanhar, em Palma.
Outro morador de Macotata, no interior de Palma, revelou que os os residentes abandonaram a sementeira da segunda época nas quintas, piorando a sua situação depois de perder a pouca produção anterior, devido aos ciclones, e aumentando o número de pessoas que precisam de assistência alimentar.
“Ninguém quer ir mais à machamba porque é tudo incerto. Muitos têm medo de ser confundidos (com insurgentes e ou militares), até mulheres”, disse..
“Muitos preferem enfrentar a fome que a morte”, acrescentou a nossa fonte, sustentando que caminhos para zonas agrícolas e áreas pesqueiras têm sido alvo de emboscadas.
Um outro morador, de uma aldeia pesqueira de Macomia, classificou a situação de preocupante.
“Há fome aqui, isso é dramático. As pessoas até têm medo de ir ao poço tirar água, enquanto não têm nada o que comer e beber em casa”, precisou, sustentando que o recuo nas práticas de agricultura e pesca terá consequências na saúde da população, que reduziu as refeições diárias.
Muitos celeiros da população com produção, sobretudo mandioca seca, a base de alimentação na região, foram incendiados pelo grupo dos insurgentes durante os seus ataques.
A FAO estima que, ainda antes da passagem dos ciclones Idai e Kenneth por Moçambique, nos meses de Março e Abril, e a intensificação dos ataques em Cabo Delegado, 1,8 milhões de habitantes enfrentavam uma grave situação de insegurança alimentar.
Em várias aldeias, segundo relatos dos moradores, os efectivos das Forças de Defesa e Segurança (FDS) foram reduzidos, logo a seguir ao fim do recenseamento eleitoral, concentrando as acções para os megaprojectos de gás e petróleo na bacia do Rovuma.
O Governo moçambicano tem atribuído vários nomes aos insurgentes e esta semana aumentou a já intensa lista das possíveis motivações do grupo, ao sugerir que os ataques visam uma “sabotagem económica” dos megaprojectos em Cabo Delegado.
Na quarta-feira, 17, a procuradora-geral adjunta da Republica, Amabélia Chuquela, alertou para a possibilidade do alastramento dos ataques armados que se verificam na província de Cabo Delgado, desde 2017, a outras províncias, caso não se tomem medidas urgentes para desmantelar, por definitivo, os grupos que aterrorizam os distritos a norte de Pemba.
Até aqui, as duas sentenças proferidas pelo Tribunal Judicial de Cabo Delegado, condenaram 61 pessoas acusadas de participação da insurgência e absolveu outras 138 pessoas.
Em Abril, o Tribunal condenou 37 arguidos e absolveu 133 e, em Junho, condenou 24 pessoas e absolveu cinco.