Mais de 30 por cento dos presos são-tomenses respondem por abuso e violação sexual de menores

Cidade de São Tomé, São Tomé e Príncipe

PGR diz que autoridades estão a atuar mas analista político responsabiliza o Estado por “não fazer nada”

Mais de 30 por cento dos reclusos da única cadeia de São Tomé e Príncipe cometeram o crime de abuso e violação sexual de menores.

Até 2023, o furto era o crime que mais pessoas levava à cadeia, mas o de violação e o abuso sexual passou a liderar a lista.

A situação é mais dramática quando responsáveis do aparelho estatal estão envolvidos.

Dos mais de 300 reclusos no país cerca de 100 praticaram o crime de violação e abuso sexual.

”Infelizmente é esta a nova realidade da população prisional de São Tomé e Príncipe”, disse Nayr da Mata, diretora geral dos Serviços Prisionais e de Reinserção Social, sublinhando que alguns são reincidentes.

“Eles quando vêm para cá passam a ideia de que as meninas eram suas namoradas, por isso, acho que é preciso elucidar as pessoas que o abuso não é só quando é forçado, mas sim quando envolve menores”, propôs Mata.

Relatos

Na sede da SOS Mulher, organização de defesa e apoio a vitimas, a Voz de América ouviu testemunhos de vitimas e familiares em acompanhamento psicológico.

“Eu fui violada duas vezes. A primeira vez eu tinha 13 anos. No regresso da escola um moço atacou-me e violou-me”, revelou uma jovem que pediu anonimato.

“A minha filha saiu para ir à escola e foi levada para uma mata por um senhor que a violou e hoje ela tem problemas psicológicos graves”, contou uma mulher que também não quis ser identificada.

Nos próximos dias o número de reclusos por violação e abuso sexual de menores na cadeia central de São Tomé deverá aumentar com a chegada de mais cinco acusados, provenientes da ilha do Príncipe.

Diretor Regional da PJ preso

Entre eles, está o diretor regional da Polícia Judiciaria (PJ) que ficará em prisão preventiva por ter abusado sexualmente e engravidado uma menor de 14 anos, informou à Voz de América o Procurador Geral da Republica, que rejeitou comentários segundo os quais este caso fragiliza as instituições judicias.

“Fragilizaria se não houvesse uma resposta imediata do Ministério Público (MP) e da própria PJ em São Tomé, demonstrando que mesmo que for entre nós, temos que fazer uma ação penal efetiva”, disse Kelve Nobre Carvalho.

Ele mencionou inúmeras ações desenvolvidas nos últimos meses pelo MP com vista a denunciar e combater de crimes de violação e abuso sexual.

“Em 2024, na seção de crimes de violência doméstica e abuso e violação sexual nós tivemos 704 processos. Desses, 174 eram de crime de abuso sexual e 55 atos sexuais com adolescentes”, sublinhou Nobre Carvalho.

Estado “ausente”

Números preocupantes para um país de cerca de 210 mil habitantes, admitiu o Procurador Geral da República, que, entretanto, considera ter havido ações para por cobro a esses crimes entre elas o endurecimento da lei.

Mas para o analista politico e social Liberato Moniz, o Estado não tem feito o seu papel no que toca à proteção das raparigas.

”No final do ano passado, uma rádio nacional divulgou que havia cinco adolescentes no Hospital Ayres de Menezes para dar à luz e nada aconteceu, não se sabe quem as engravidou e esses homens não respondem perante a lei. Isto quer dizer que o Estado não protege as crianças”, aponta Moniz, quem reforça que “temos casos de meninas de 14,15 e 16 anos com dois filhos”.

Nos últimos meses registaram-se vários casos de abuso e violação sexual de menores com destaque para o da menina Elizabete, violada e espancada pelos agressores, tendo ficado em coma seis meses, vindo a falecer depois de uma evacuação para Portugal sem a aprovação da Junta Médica, mas apoiada por ativistas sociais e pessoas de boa vontade.