Produtores da castanha de caju na Guiné-Bissau manifestam-se preocupados com a falta de compradores e o preço praticado no mercado nacional.
Em determinadas comunidades é cada vez mais sonoro o grito de fome.
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Informações disponíveis apontam que o preço mais praticado, neste momento, na maioria dos campos ou zonas de produção da castanha de caju, não vai além dos 150 francos CFA por quilo (24 centavos de dólar), muito abaixo do preço-base estipulado pelo Governo no valor de 375 francos CFA (62 centavos do dólar).
A partir do sul continental, considerado um dos territórios com maior pomar do cajueiro, a Voz de América falou com alguns produtores locais que lamentaram a situação e apontaram para ameaças de fome.
Perante esta situação, o presidente da Associação Nacional dos Agricultores da Guiné (ANAG) considera que os produtores estão a ser explorados pelos comerciantes.
Governantes com "culpa"
Jaime Bolges é mesmo peremptório ao criticar governantes, sem citar nomes, que, segundo ele, são os maiores compradores da castanha de caju e, por isso, não tem dúvidas de que a campanha deste ano será praticamente nula para os agricultores.
"É, sim, uma autêntica exploração dos agricultores. Os nossos governantes não estão a colaborar. Não têm interesse em promover o caju, mas sim, pelo contrário, destruir o nosso caju. Isso é lógico, porque os maiores compradores da castanha de caju da Guiné-Bissau são os governantes. E, estando a comprar a castanha da Guiné-Bissau, significa que não querem ver a evolução do preço", afirma Bolges, pra quem "não há interesse do Governo em promover o sector".
Aquele responsável associativo denuncia ainda o desvio do Fundo da Contribuição Predial Rústica” no valor de 6,5 mil milhões de francos CFA (cerca de 10 milhões e 820 mil dólares americanos), facto que tem impacto no sector.
"O fundo foi criado para investir nos nossos pomares e melhorar a cooperativa dos produtores em poderem fazer uma venda colectiva, mas isso não aconteceu, pois foi desviado [fundo] pelos nossos governantes. Não sei onde o aplicaram, talvez nas suas campanhas políticas. Só este volume poderia servir para compra de 17,5 mil toneladas da castanha dos produtores que é o volume anual. Portanto, seis mil milhões e meio de francos CFA davam para comprar 17 mil e 500 toneladas. Isso poderia salvar a intensiva exploração dos nossos produtores", diz o presidente da ANAG.
Receitas fiscais em risco
Jaime Bolges acrescenta que não há compradores, "os pequenos produtores já venderam todas as suas castanhas porque não têm nada de alimentação, não têm comida e resolveram vender as suas castanhas", o que, para ele, "é uma catástrofe e uma autêntica exploração".
O especialista em economia e políticas públicas Santos Fernandes também corrobora que as perspectivas não são boas e alerta para o impacto negativo da arrecadação de receitas nos cofres do Estado.
"Tudo indica que no segundo semestre do corrente ano, o país terá enormes dificuldades para fazer face às suas despesas correntes porque toda a nossa exportação pouco acima de 90% é concebida e planeada à volta da castanha de caju".
Santos Fernandes acrescenta que a desvalorização do francos Cfa face ao dólar faz parte da equação na previsão das contas da campanha de comercialização da castanha de caju deste ano.
Para ele, "a redução de investimentos dos investidores, a fraca capacidade de compra interna dos nossos operadores económicos, a dificuldade dos próprios produtores em conseguirem outros mercados que não sejam os tradicionais compradores, todo esse ciclo vicioso vai impactar sobre o cidadão comum guineense" porque "quando não há comprador quem sofre é quem tem o produto".