Depois das autoridades guineenses proibirem as crianças talibés, que frequentem escolas corânicas, de pedirem nas ruas de Bissau e noutras cidades do país, especialistas defendem acções concertadas entre o Estado, mestres corânicos e organizações que intervêm no sector.
Laudelino Medina, secretário executivo da Associação dos Amigos das Crianças, a primeira organização guineense envolvida directamente na identificação e recolha das crianças talibés da Guiné-Bissau, particularmente as que são enviadas para o vizinho Senegal, diz que a decisão do Presidente da República, por si só, não resolve o problema:
“Esta medida requer uma concertação e um acompanhamento de diferentes actores que intervêm na cadeia da proteção da criança, porque se trata de uma problemática tradicional profundamente enraizada no país”, afirma Medina.
Aliás, lembra, há muitas crianças que se encontram nessa situação ao nível nacional e transnacional.
”Só para se ter uma ideia: há um estudo ao nível da grande região de Dakar, segundo o qual, numa amostra de 6.700 crianças que mendigam nas ruas da capital daquele país, 30% é oriunda da Guiné-Bissau, é demasiado para nós. Portanto, temos que tomar decisões, que requerem acções concertadas no sentido de retirar as crianças com dignidade nas ruas”, conclui aquele responsável associativo.
O sociólogo guineense Ivanildo Paulo Bodjam considera que as escolas corânicas têm um papel importante na sociedade guineense, sobretudo, pela sua contribuição na construção social e na formação do homem.
Por isso, na opinião dele, o Estado tem uma obrigação para com as escolas corânicas da Guiné-Bissau.
“Há uma explícita missão do Estado, enquanto agente do bem e detentor das obrigações, em criar condições para o funcionamento das escolas corânicas diferentemente das escolas privadas, considerando que é mais da natureza comunitária para o ensino do moral e lições corânicas”, defende Bodjam.
Dados da Associação Guineense de Luta contra Emigração Irregular, Tráfico de Seres Humanos e Proteção de Crianças, citados por aquele sociólogo, indicam que só em Bissau, oficialmente, estão registadas vinte e duas escolas corânicas, albergando 720 e”crianças, dos 3 aos 18 anos de idade. Ivanildo Paulo Bodjam defende, por isso, que as escolas corânicas devem deixar de ser da exclusiva responsabilidade dos imames ou de mestres.
“As comunidades têm que considerar que, o facto de haver necessidade de formação das crianças ao ensino corânico, há que haver também a apropriação destas mesmas comunidades em sustentar essas escolas, através de pagamento de propinas ou qualquer outra forma de poder sustentar o funcionamento destas escolas”.
Desde o dia 6, o Governo proibiu as crianças de pedirem dinheiro, alegadamente para as escolas corânicas.