Estudos de ADN revelam que um grande número de escravos libertados pela marinha de guerra britânica no século 19 e levados para ilha de Santa Helena eram provenientes de Angola.
Os estudos foram levados a cabo por cientistas da Universidade de Copenhague, na Dinamarca, e indicam que esses escravos eram provenientes da então chamada África Central Ocidental, a zona que no comércio de escravos incluía o norte de Angola e zonas que se estendem até ao Gabão, incluindo Cabinda, que foi um dos grandes exportadores de escravos para a América do Norte.
Veja Também Durban: Descendentes de escravos moçambicanos exigem justiça à medida que crescem os pedidos de compensaçãoOs estudos foram divulgados pelo American Journal of Human Genetics.
Marcela Sandoval-Velasco disse à publicação que já se sabia que os escravos que ali foram colocados “eram provavelmente originários de zonas ao sul do Equador mas não se sabia precisamente de onde”.
“Fazendo a sequência do ADN e comparando isso com os de milhares de pessoas da África Subsariana pudemos inferir de onde é que provavelmente vieram de África e, portanto, ajudar a restaurar o conhecimento das suas conexões ancestrais”, afirmou àquela publicação Sandoval-Velasco.
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Os cientistas analisaram o ADN de 20 indivíduos, cujos restos mortais foram encontrados durante escavações feitas em 2007 e 2008 para a construção de uma estrada e do primeiro aeroporto da ilha.
A Grã-Bretanha aboliu o comércio de escravos em 1807 e, a partir dessa data, como grande potência naval, levou a cabo durante décadas uma campanha naval para interceptar e destruir navios que levavam escravos para as Américas.
Estima-se que, entre 1840 e 1867, cerca de 27 mil escravos em navios interceptados pela marinha de guerra britânica foram levados para Santa Helena.
A maior parte foi mais tarde transportada para outros locais em liberdade mas estima-se que cerca de 10.000, incluindo muitas crianças, morreram na ilha, muitos vítimas de doenças contraídas a bordo dos navios esclavagistas.
Outras estimativas apontam para um número menor de cinco mil, entre 1840 e 1849.
"Cena muito triste"
Testemunhas oculares nesses anos descreveram o estado físico em que se encontravam esses escravos quando desembarcados em Santa Helena.
Em 1849, o bispo anglicano Robert Gray disse que “nuca tinha visto uma cena tão triste”.
“Tinham aparência cansada e desgastada, e eram transferidos para os barcos como se fossem montes de produtos, aparentemente não mostrando qualquer vontade própria”, escreveu Gray.
“Os braços e pernas eram como se fossem paus andantes e muitos morreram quando eram transferidos do navio para um barco”, escreveu uma testemunha ocular em 1861.
As descrições foram citadas na revista Nature.
Muitos dos que sobreviveram foram levados para a Jamaica, Trinidad e outras colónias britânicas como contratados.
O local onde muitos dos restos mortais foram encontrados é agora conhecido como Cemitério dos Africanos Libertados.
A ilha de Santa Helena é conhecida por ser o local onde morreu o imperador francês Napoleão Bonaparte que foi para ali levado após ter sido capturado pelos britânicos.
O local foi também escolhido para acolher presos de guerra do conflito de Anglo-Boer, na África do Sul.