Luanda transformou-se nos últimos tempos em canteiro de obras. Obras que surgem dia após dia, porém desrespeitando os padrões sejam urbanísticos, culturais e históricos.
O acentuar da crise que resultou na baixa do poder de aquisição seja do Estado como os cidadãos comuns não impediu de todo o surgimento de novos edifícios e projectos urbanísticos.
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Contudo, especialistas alertam para a degradação do património histórico da cidade de Luanda, cuja Baía da sua Marginal, na baixa da cidade está entre as melhores do mundo.
Esta reflexão surge numa altura em que faz eco no país o Fórum urbanístico das cidades e municípios de Angola.
Cristina Pinto, luandense de naturalidade é membro da Associação Calú. A organização cívica que DESDE 2004 Luta pela preservação das características históricas e urbanísticas de Luanda, incluindo os seus monumentos e sítios de valor legendários para quem nasceu na cidade fundada em Janeiro de 1575.
A integrante activa da Associação Calú afirma que o desrespeito de algumas zonas históricas de Luanda constitui um atendo ao património histórico de Luanda e cita como exemplo o Bairro dos Coqueiros.
“A zona dos Coqueiros é a mais antiga de Luanda. É lá onde está situado o Bairro do Katari (sofrimento) onde eram punidos os escravos no tempo colonial. Onde também está situação o largo dos Pelourinhos, onde está a rua dos Mercadores. Toda esta área devia ser pedonal para proteger este património”.
Dentre os monumentos históricos que nos últimos tempos têm estado a perder as suas características está a Fortaleza de São Miguel, localizada na cidade Alta. Nela está também o Museu das Forças Armadas Angolanas. A vista principal da parte lateral deste monumento está a ser ofuscada com o surgimento de um Shopping cujas obras estão na reta final.
A Associação Calú entende que se devia respeitar mais este lugar de importância histórica e cultural para o país.
Há alguns anos a Associação Calú viu ser deitado abaixo o edifício Teatro Avenida, localizado nas imediações do Baleizão, na baixa da cidade.
Contra a vontade de muitos o Governo derrubou a infraestrutura prometendo erguer no mesmo espaço um edifício moderno, todavia, de lá para cá ficou apenas a promessa.
Recentemente, uma campanha de recolha de assinaturas foi desenvolvida com vista a impedir o derrube do Elinga Teatro, outro lugar público de importância histórica para música, pintura e as artes no geral em Luanda.
Formada em Línguas e Literaturas Africanas, Iracelma Baltazar, entende que do ponto de vista das fontes orais, Luanda continua a preservar a sua história, contudo, do ponto de vista material a cidade fundada pelo então navegador português Paulo Dias de Novais, tem estado a perder as características históricas e urbanísticas.
A também docente aponta o surgimento de novas centralidades, construídas sem a preocupação de se dar continuidade da história de Luanda.
“O governo quando estivesse a planificar projectos habitacionais deviam criar centros cultuais e infraestruturas históricas”, disse a nossa interlocutora para quem “ as gerações vindouras não terão contacto com a história real da cidade devido a destruição de muitos monumentos”.
O mercado e o largo do Kinaxixi (antigo largo Maria da Fonte), construídos na época colonial, eram considerados emblemas da capital do país do ponto de vista da arquitectura moderna. Porém, há cerca de dez anos as infraestruturas foram derrubadas para dar lugar a torres multifuncionais, com lojas, escritórios e apartamentos.
Cristina Pinto que cita ainda o Palácio Dona Ana Joaquina, onde actualmente funciona o Tribunal Provincial de Luanda fala em ausência de sensibilidade movida pela apetência ao dinheiro e a imobiliária e em desrespeito até mesmo os padrões climatéricos.
As novas construções na baixa da cidade, na visão da activista, não foram projectadas de forma inteligente, são injustas e acentuam cada vez mais os fossos entre ricos e pobres.
Manuel Abrantes Pedro, Director Comercial e Desenvolvimento da Baía Digital, entende que é importante que a evolução da cidade valorize as características históricas e os padrões culturais do povo.
“Faz parte do crescimento e da natureza das coisas, compreendemos, mas tem que ser atacados”, disse.
A Baía de Luanda é outro local de valor turístico para Luanda que sofreu obras de restauro, porém críticas têm sido feitas devido as falhas no seu sistema de drenagem das águas das chuvas. O espaço não está arquitectado para fazer face as fortes enxurradas que caem sobre Luanda, ficando inundado toda vez que chove.
O Director Comercial e Desenvolvimento da Baía Digital revelou que medidas funcionais para melhorar a situação está a ser estudada.
Do ponto de vista ambiental Cristina Pinto aponta a falta de responsabilidade social de algumas instituições que não valorizam o espaço verde de Luanda.
“Tínhamos espaços verdades para uma população de 500 mil pessoas, hoje precisaríamos de mais espaços verdades para cobrir uma população de 7 a 8 milhões de pessoas. Os poucos espaços verdades estão a ser utilizados para construir sítios para parqueamento de automóveis, assim como queriam destruir o Elinga Teatro para construir um “Parque Elinga. É isto que nós queremos evitar”, assegurou.
Recentemente o edifício da Liga Africana foi classificado como património histórico com uma arquitectura moderna. Apesar da recente desvalorização e derrube do património Luanda ainda conserva alguma arquitetura que mostra parte da história e da vivência de povos em Luanda. A preservação destes locais, considerados a alma da cidade, deve constar das preocupações das autoridades governamentais.