A Coreia do Norte continua a realizar actividades que violam as sanções das Nações Unidas em Moçambique, através de acordos de pescas e outros, revelou uma reportagem divulgada neste sábado, 3, pela rede americana de televisão CNN.
“Numa investigação que durou um mês, a CNN descobriu uma rede secreta de empresas de fachada, cooperação militar e acordos de preparação de forças de elite entre a Coreia do Norte e Moçambique, que violam as sanções internacionais, de acordo com investigadores das Nações Unidas”, dizem os repórteres daquela cadeia que analisou documentos que “revelam que “a cooperação é selada com contratos ilegais no valor de milhões de dólares”.
O dinheiro é canalizado através de diplomatas norte-coreanos na região para Pyongyang.
A CNN obteve acesso a comunicações oficiais entre responsáveis militares moçambicanos e norte-coreanos, que indicam que, em 2015, funcionários moçambicanos convidaram técnicos militares norte-coreanos para o país.
Duas fontes militares moçambicanas disseram àquela rede americana que “os norte-coreanos treinaram as forças de elite numa base em Maputo há pelo menos dois anos” e, diz a reportagem, “isto tem um preço”.
Director impreciso
Álvaro O´da Silva, director do Ministério dos Negócios Estrangeiros e Cooperação de Moçambique, disse à CNN que o seu Governo respeita as sanções impostas à Coreia do Norte pelas Nações Unidas.
"Neste momento, estamos a implementar todas as sanções que as Nações Unidas declararam contra a Coreia do Norte", afirmou num primeiro momento Silva que, de acordo com a reportagem, “mais tarde, voltou atrás e disse que não tinha ´informações detalhadas´ sobre sanções”.
Aquele resposável adiantou que os norte-coreanos estão legitimamente envolvidos em campos "sociais e técnicos" e que essas actividades não violam as sanções da ONU.
Relacionamento com Washington
Os Estados Unidos têm sido um dos principais impulsionadores das sanções internacionais contra a Coreia do Norte devido à sua política nuclear.
Questionado, o director do Ministério dos Negócios Estrangeiros e Cooperação de Moçambique comentou as relações entre Maputo e Washington.
"Eu acho que temos todos os motivos para acreditar que o nosso relacionamento com os Estados Unidos é óptimo", garantiu Alvaro O'da Silva, diretor do Ministério das Relações Exteriores de Moçambique.
“Mas com base nas investigações da CNN, a evidência de violações de sanções é clara”, diz a reportagem da cadeia com sede em Atlanta.
Os barcos Susan 1 e Susan 2
Os repórteres começam por dizer que não há nada suspeito à superfície do “adormecido Porto de Pesca de Maputo”.
Mas escondidos e encurralados entre os outros barcos, estão os “enferrujados” Susan 1 e Susan 2.
“Eles não são navios de pesca comuns”, afirma a reportagem que diz violarem as sanções por serem operados por tripulações da Coréia do Norte.
Os barcos Susan 1 e Susan 2 estavam registados sob a bandeira norte-coreana, mas agora usam a bandeira da Namíbia, cujo Governo não respondeu às perguntas da CNN.
Os pescadores norte-coreanos continuam nos seus barcos.
À noite, eles passeiam às vezes pela cidade e fazem compras, imperturbáveis às implicações geopolíticas de sua presença.
Acusações dos peritos da ONU
A CNN refere-se ainda ao painel da ONU que publica relatórios semestrais sobre os países e instituições que violam sanções e que indicou anteriormente alegadas ligações militares norte-coreanas a Moçambique no valor de pelo menos seis milhões de dólares.
O documento afirma que os norte-coreanos reforçaram a tecnologia e as capacidades da era soviética de Moçambique, usadas na guerra contra a Renamo.
Um relatório divulgado pela ONU em 2017 revelou as ligações militares entre Moçambique e a Coreia do Norte, mas a cooperação entre os dois países é mais substancial do que se pensava.
Funcionários do Ministério da Defesa de Moçambique recusaram falar em câmera com CNN, nem responderam a questões específicas sobre as relações militares entre os dois países.
Haegeumgang, empresa de fachada
Uma empresa de fachada chamada Haegeumgang foi usada para executar a operação.
Através de correspondências entre funcionários militares moçambicanos e representantes norte-coreanos, a CNN também descobriu um prédio de dois andares no centro de Maputo, onde Haegeumgang ter-se-ia instalado.
A casa “cor de pêssego” fica na avenida Mao Tse-tung, em Maputo, mas neste momento está vazia.
“Alguns asiáticos viviam e trabalhavam aqui, mas eles deixaram a casa há três ou quatro meses", disse à CNN um agente encarregue de mostrar o imóvel a potenciais clientes, acrescentando que eles partiram porque não podiam pagar o aluguer.
Há algum tempo, funcionários do Governo americano indicaram que o dinheiro de empreendimentos como este em Moçambique vai directamente para o famoso fundo do programa nuclear do líder norte-coreano Kim Jong Un, conhecido como Office 39.