A emigração angolana tem sido um fenómeno significativo nos últimos 6 anos, motivada por fatores económicos, sociais e políticos.
Estima-se que mais de 3,5 milhões de angolanos tenham saído do país em busca das melhores condições de vida, entre 2017 e 2024, sendo os principais destinos Portugal, Brasil, França, Estados Unidos, Reino Unido e África do Sul.
A maioria são jovens, força de trabalho ativa do país, que atravessam as fronteiras nacionais em busca da realização pessoal, em vários pontos do mundo e, levam na bagagem o conhecimento, as experiências de vida, a cultura e as preocupações sobre a necessidade de uma vida melhor e mais digna.
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Oportunidades de trabalho, melhor salário, saúde, educação e segurança entre os principais motivos que obrigam os inconformados a atravessar as fronteiras do território nacional.
A falta de condições para responder à procura da procura pelo exercício da produção é um dos fatores que pressionam os cidadãos a procurar oportunidades fora das suas fronteiras. Para antropólogo João Nicolau a procura pela satisfação total não é a principal causa da emigração em larga escala.
"Porque muitas vezes recebemos históricos deploráveis de muitos irmãos que emigraram para procurar uma oportunidade de vida limpa, saindo com títulos de destaque, mas ao chegar lá a trabalhar nos setores mais humildes".
O que se procura, de acordo com o analista "é auto realização quando entendemos que agora o nosso país de origem, a nossa casa que nos concebe já não é capaz de nos sustentar, o que faz com que nos sintamos excluídos, afastados e obrigados a procurar buscar conforto nalgum lugar onde eventualmente alguém possa estender a mão".
O desemprego, os baixos salários, a falta de oportunidades e o avanço na carreira profissional lideram a lista de razões para emigração, numa altura em que o país se vê enrolado numa crise económica há quase dez anos sem possibilidades imediatas de sair, diz o Sociólogo Garcia Quitari.
"O fator que tem influenciado a saída massiva de angolanos para o estrangeiro é o económico, numa altura em que o país está mergulhado numa crise económica com poucas possibilidades de saída a curto prazo e naturalmente este tem sido um fator que influencia a saída de angolanos para o estrangeiro", refere o analista que por outro lado indica que o desemprego no país atingiu níveis exagerados que se reflectem na vida dos jovens, a maioria da população angolana.
Veja Também Fome no Sul "obriga" angolanos a fugir para Namíbia"Por outro lado, há a questão dos baixos salários, para quem trabalha e agrava-se com a inflação e a redução do poder de compra do próprio salário. Há uma série de questões que, a meu ver, lideram a lista de razões que influenciam a saída massiva de angolanos".
O sociólogo descarta a hipótese da emigração angolana ser motivada por razões políticas, porquanto, não descarta a possibilidade de haver casos isolados. Reforça a ideia de que é o fator económico o motivo mais relevante que obriga os cidadãos nacionais a procurarem melhores respostas sociais, económicas e financeiras, mas fora das suas fronteiras.
"Não vejo razões políticas relevantes que expliquem a saída de angolanos de modo massivo. Pode haver um ou outro caso de pessoas específicas que por razões políticas têm e tenham abandonado o país, outros que têm porque o futuro de Angola possa estar do ponto de vista político ameaçado ou lhe ofereça algum tipo de ameaça.
Mas este fator não é notável quando analisamos alguns fatores que podem estar na base da emigração de angolanos", disse o analista que ao fazer uma análise comparativa com países do oriente médio afetados por conflitos militares referindo que o caso de Angola a grande razão é mesmo económica, devido ao empobrecimento da população.
O engenheiro de computação, Pedro Januário, olha com preocupação para este cenário, já que Angola tende a perder para outros países os seus melhores quadros numa altura em que os precisa para o seu desenvolvimento.
“O que os jovens procuram fora das fronteiras de Angola são melhores oportunidades de auferir um salário que permita ter uma vida digna”, refere o engenheiro, para quem ao coral de razões se juntam as oportunidades de melhor formação e instrução a fim de adquirirem competências profissionais e académicas que em nada fiquem a dever aos técnicos de outros pontos do mundo.
"Academicamente falando, há limitações em vários cursos, em várias formações, há universidades que não oferecem certas especializações e isto faz com que muitos jovens angolanos com certas visões emigrem para outros países como Portugal, Brasil e Estados Unidos a fim de poderem crescer profissional e academicamente. Encontrando, desta forma, têm melhor emprego com salário mais alto, mais digno e justo", afirmou.
"São estes motivos que fazem com que muitos jovens deixam o nosso país com destino para outros países por falta de condições tecnológica, laboratórios de ponta, formações adequadas, inovadoras e avançadas que lhes permita estar ao mesmo nível que os jovens de outros países. Os nossos jovens hoje querem também poder ter a oportunidade de trabalhar em empresas internacionais de alto nível e, com a formação adquirida apenas no nosso país não é possível", acrescentou.
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Cada vez mais angolanos emigram para Portugal. Porquê?
Para algumas áreas profissionais, apesar de escassa, existem oportunidades, tal é caso do sector de ensino onde nos últimos anos frequentemente vários jovens têm sido admitidos em concurso público para ingresso na carreira docente, mas os baixos salários praticados não compensam o esforço. E, muitos destes não permanecem na profissão por muito tempo.
Já para a área de engenharia computacional, a realidade não é diferente, há oportunidades, mas são privilegiados os que se formam em instituições de ensino estrangeiras.
"Para um angolano ter acesso a uma empresa multinacional e desempenhar uma função de alto nível, é preciso se formar no exterior, pois que, se simplesmente apresentar as certificações feitas a nível nacional dificilmente consegue ter emprego e ter uma função que lhe permite ter um salário condigno, por esta razão muitos preferem emigrar".
A falta de qualidade formativa do sistema nacional de ensino, é uma das razões que força a juventude a procurar por melhores oportunidades. Para antropólogo João Nicolau, em muitos casos, o que as academias angolanas oferecem em termos de formação não agregam conhecimentos e visão de expansão para a autoprojeção o que obriga a procura de oportunidade que responda às expectativas pessoais de cada jovem.
"De certa maneira, a falta de qualidade formativa do nosso sistema, acaba sendo o próprio impulso para que muitos estudantes busquem oportunidades de agregar mais conhecimentos a partir de fora".
Mas, o principal fator de emigração angolana é a procura de estabilidade económica e financeira, de acordo com o antropólogo. "Tudo acaba se projetando em relação à economia", reforça o analista para quem “se um Estado não é capaz de criar condições culturais para projecção e estabilidade económica é difícil manter os seus cidadãos dentro do seu território”.
"A economia é também um reflexo do quão grande a cultura pode ser dentro de uma determinada nação. Então, quando fazemos economia, fazemos igualmente a promoção da cultura local, pois que, a cultura acaba por ser o reflexo dos ganhos que vamos tendo de maneira integral, aí a questão económica acaba tomando espaço e predominando", destacou.
A expansão das novas tecnologias contribuiu para o acesso à informação e, consequentemente, para o aumento da emigração devido à facilidade de interação e realização de processos pré-migratórios, afirma o Engenheiro e professor, Pedro Januário. "A tecnologia veio piorar esta situação por causa dos meios que disponibiliza para os jovens que pretendam emigrar", rematou.
Porém, nem tudo tem sido facilitado pelas tecnologias de informação e comunicação.
Centenas de jovens realizaram recentemente uma marcha de repúdio contra a burocracia no sistema de atendimento e solicitação de vistos na embaixada portuguesa.
O grupo de manifestantes denunciou esquemas de corrupção para obtenção de vistos, envolvendo funcionários da embaixada portuguesa em Luanda que de forma fraudulenta cobram quantias que variam entre os 750 mil e os 2 milhões de kwanzas para obtenção de um visto de curta duração.
Por outro lado, informações oficiosas referem que as dificuldades de obtenção de vistos resultam de uma orientação do Governo para impedir a emigração massiva de quadros nacionais.
O antropólogo e analista João Nicolau observa aspetos positivos na emigração na medida em que esta não está apenas ligadas à busca de oportunidade para vida financeira, mas também, para melhoria das experiências pessoais e perspetivas para vida coletiva.
"Esta fuga, por um lado está precisamente assente na falta de estrutura e busca de melhores oportunidade de vida em termos de economia, mas, por outro lado, está na busca do compromisso constante com a excelência. Já há muitos jovens que saem para se capacitar e depois voltar para desenvolver grandes empreendimentos aqui porque não têm desejo de continuar no estrangeiro, apesar das oportunidades que encontram".
Portugal e Brasil são os destinos prediletos da maioria dos emigrantes angolanos. Nicolau explica as razões para escolha destes dois destinos. "Histórica e culturalmente estes países têm muito para nos oferecer. Por um lado, a língua e, por outro, encontramos muitos descentes de angolanos por conta do processo de migração forçada que ocorreu aquando da época colonial. Estas conexões jogam um papel de influência crucial aquando da escolha dos destinos para busca de uma oportunidade de vida".
O empobrecimento da população é apontado como a principal causa da emigração, por Norberto Garcia, diretor do Gabinete de Estudos Estratégicos e Análises da Casa Militar da Presidência da República de Angola.
O responsável lembra que apesar de a maior responsabilidade ser do Estado, cada angolano deve fazer a sua parte e, a promoção de formação e emprego para juventude pode ser uma saída para travar a emigração.
"Há muita coisa a acontecer, mas também há muitos jovens que ficam na sombra da bananeira e nós precisamos tirá-los de lá e fazer com que eles acreditem que afinal é possível. E, muitos que nós os tiramos da sombra da bananeira hoje estão a prosperar", esclareceu o dirigente angolano quando respondia a críticas sobre a fuga de quadros angolanos para o exterior.
Norberto Garcia admite que a emigração massiva de angolanos é um problema para o país, porém esclarece que o Governo por meio da realização de projetos e oportunidades aos jovens já impediu a saída de muitos jovens.
O governante pede que se acredite mais no país ao mesmo tempo que reconhece que a confiança [nas ações do Executivo] se perdeu por conta de alguns governantes “que não dão um bom exemplo” para população.
"As pessoas as vezes não acreditam mais no nosso país por culpa de alguns de nós, dirigentes, que não dão um bom exemplo e nós temos que dar melhores exemplos para isto acontecer. Já evitamos e, temos estado a evitar, que muita gente emigre. A solução não está em emigrar, muitos deixaram de acreditar no país e pensam que a solução está lá fora, o que não é verdade", salientou o responsável pelo Gabinete de Estudo Estratégicos e Análises da casa Militar da Presidência da República em entrevista recente a uma estação de rádio em Luanda.
"Precisamos de pôr as pessoas a trabalhar, mas primeiro a formação. Temos que dar formação as pessoas, que é um dos problemas que nós temos. Temos que cada vez mais capacitar as pessoas, por isso é que eu falo da individualização da cana-de-pesca. Temos que dar cana-de-pesca as pessoas para poderem desenvolver as suas atividades. Os jovens precisam de ter mais oportunidades", reconhece, por outro lado, o dirigente, para quem 60% dos produtos cultivados em Angola e vendidos no maior mercado a céu aberto de Luanda, o mercado do km 30, estraga por falta de logística.
Angola deve melhorar a qualidade de formação dos quadros nacionais, incentivar a formação técnico-profissional, estimular o empreendedorismo e a inovação, facilitar o acesso ao emprego e combater a desigualdade regional, se de facto pretende mitigar o fenómeno migratório e, por outro lado, proporcionar aos jovens oportunidades de formação que resultem em competências iguais aos que se formam no estrangeiro, conclui o Engenheiro Pedro Januário para quem a atualização dos currículos de formação é igualmente necessária.
"Infelizmente a qualidade do ensino em Angola não nos garante capacidade de competir com jovens que se formam no exterior do país. O que o Executivo angolano deve fazer para mitigar esta situação, é trabalhar com as instituições do ensino superior para atualizar os currículos aliando-se as necessidades da demanda do mercado de trabalho global e com as novas demandas da economia digital e a inovação tecnológica, fazendo com que o currículo usado em Angola esteja de acordo com o currículo internacional".