Os primeiros 40 produtores agrícolas, do estado brasileiro do Mato Grosso, devem chegar a Moçambique ainda este ano, atraídos pela oferta de terras cedidas pelo governo do país africano em troca do pagamento anual de um imposto irrisório, de pouco mais de 12 dolares americanos
Ao todo, seis milhões de hectares vão poder ser usados como extensão da fronteira agrícola brasileira, que agora vai atravessar o Atlântico.
Os produtores agrícolas vão poder usar as terras, do norte de Moçambique, por 50 anos, prorrogáveis por igual período. A única imposição é que 90% da mão de obra nas plantações sejam de cidadãos moçambicanos.
Para analistas, o acordo já teria sido vislumbrado pelo Brasil há alguns anos, quando o governo brasileiro perdoou a dívida de Moçambique.
Depois disso, outras parcerias foram firmadas entre os dois países e em Novembro do último ano, foi assinado um programa governamental nesse sentido com três parceiros: Brasil, Japão e Moçambique.
O Brasil, com 80% da terra já consumido por plantações de soja, consegue com este acordo mais solo para plantar.
Já o Japão, grande importador de soja e financiador de pesquisas de melhoria de sementes brasileiras para uso em Moçambique, ganha controle da rota de exportação do produto.
O geógrafo Eli Alves Penha, autor do livro “Relações Brasil-África e Geopolítica do Atlântico” explica que as vantagens para Moçambique devem ser analisadas sob duas vertentes: os pequenos produtores moçambicanos vão ter capacitação técnica para usar em suas propriedades e o país vai poder exportar, especialmente, soja.
Moçambique, no entanto, também corre riscos, disse
“A experiência brasileira no cerrado não é muito confiável. Observamos aqui um esgotamento dos recursos naturais, uma grande devastação do bioma do cerrado,” afirma o especialista.
“Então, teriam que ser adaptadas novas formas de uso da terra para minimizar o impacto devastador que ocorreu no Brasil”, completa o estudioso que avalia que se isso não acontecer, o Brasil estará exportando um modelo insustentável.
“Pela experiência passada isso deve ser considerado para não acarretar problemas para a já pauperizada população de Moçambique,” avisou
Essa aproximação Brasil-Moçambique pode ser vista como um novo momento da relação brasileira com os países africanos, já que antes as parcerias eram mais na área de serviços e infra-estrutura.
“O Brasil dá uma grande importância para a parceria com alguns países lusófonos e o governo brasileiro observou que tem perdido espaço para a Índia e para a China. Por isso, estamos agora mais voltados para a ênfase na exploração dos recursos naturais e agricultura. Grande parte dos acordos firmados, recentemente, foca esses dois setores,” explica Eli Alves Penha.
Para o especialista, essa nova postura brasileira pode ser observada, dependendo do ponto de vista, pelo viés negativo de um novo colonialismo.
“Mas as cláusulas que são colocadas de exploração dos recursos pelo governo Moçambicano implica que grande parte da participação de técnicos têm que ser nacionais. Isso já alivia o problema da mão de obra e também favorece o controle, já que a constituição moçambicana prevê que todos os recursos do solo são do Estado e, por isso, a participação do governo é muito presente,” explica.
Esse novo tipo de parceria entre Brasil e Moçambique também inverte, de certa forma, o ditado que diz que para os problemas africanos há sempre soluções brasileiras.
O acordo vai ajudar a resolver a necessidade que o Brasil tem hoje de expandir a sua fronteira agrícola.
Para o analista, além disso, “as formas tradicionais do uso do solo feitas pelos africanos podem ensinar muito aos brasileiros, de como trabalhar de forma ecologicamente sustentável,” explica.
“Nessa parceria espero que essas tradições seculares africanas sejam absorvidas. Historicamente eles têm formas de tratar a terra, através da adubação e do arado, que não são tão danosas para o solo como aqui no Brasil,” acrescentou
Especialista avisa que modelo agrícola brasileiro é de "pouca confiança" devido a história de devastação ambiental