Um cada vez maior número de angolano está a juntar o pouco dinheiro que têm diariamente poderem comprar alimentos para sobreviver.
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Para poderem comprar alimentos cada vez mais caros familais e individuos angolanos têm que “fazer sócia”, um acto que consiste na junção de valores entre várias pessoas para adquirir bens alimentares em maior quantidade, que depois é repartido de forma equitativa.
A alta dos preços dos principais produtos da cesta básica é a principal razão para optar pela sociedade ou simplesmente “sócia”.
Com efeito a situação socio-económica do país para a maioria da população angolana é descrita como estando a caminhar de mal para pior. Os factos são relatados por cidadãos que se vendo angustiados com a pobreza extrema a que estão voltados lamentam que os discursos oficiais passam ao lado desta situação e não abordam o problema com realismo.
Os sinais de pobreza são cada vez mais visíveis sobretudo à medida que se entra para o interior dos bairros suburbanos onde falta quase tudo em termos de serviços sociais desde o mais avançado até ao mais elementar.
A cada dia que passa a crise económica do país conhece um estágio mais preocupante. E quem sente esta situação refere que até para dar de comer a família é preciso “fazer sócia”.
“As pessoas não têm dinheiro para comprar em sacos. Nós juntamos o dinheiro, compramos e dividimos. Quem não tem 11.500,00 (onze mil e quinhentos kwanzas) para comprar um saco de arroz, nós compramos no armazém grossistas e repartimos para ajudar aquelas pessoas que têm pouco dinheiro”, refere uma vendedeira que lamenta o facto dos angolanos perderem o mercado retalhista nacional para os estrangeiros da parte oeste do continente africano.
Quem faz “sócia”, fala dos benefícios deste método encontrado para minimizar a carência por que passa.
“É uma valia, sobretudo quando o salário está a atrasar, dá para vir cá e juntar-se a outras pessoas para comprar alimento em maior quantidade e aguentar em casa”, disse Gracinda de Oliveria.
“A vida está difícil, tudo está caro no mercado e é preciso encontrar uma forma de sobreviver”, acrescentou.
No seu discurso sobre o Estado da Nação proferido a 15 de Outubro, o Presidente da República referiu que a taxa acumulada de inflação da moeda nacional baixou de 41,95% para 16,9%, entre 2017 e 2019, tendo esta trajectória de redução da inflação sido interrompida por força da pandemia da COVID-19, que afectou o ciclo de produção e de circulação de bens e serviços do país.
O mais alto mandatário da nação reconheceu que o com o surgimento da COVID-19, o mercado de trabalho tem sido fortemente abalado.
Porém, referiu que apesar da situação desfavorável cerca de 19 mil trabalhadores encontraram emprego durante o primeiro semestre do ano, através de centros de emprego ou no contacto directo com as empresas.
Esta afirmação pouco conforto dá aqueles que ganham vida transportando mercadorias nos armazéns grossistas e ajuda na divisão de bens alimentares adquiridos no âmbito do método “sócia”.
“Nós para comer dependemos de chamar sócia, porque não temos emprego. Ao juntar as pessoas para comprar e dividir os alimentos eu recebo 150 kwanzas. Este dinheiro só serve mesmo para comer. O que eu gostaria de dizer é que devem dar emprego aos jovens”; reforçaram os jovens Aguinaldo José Miguel e Fernando Francisco.
A cada dia que passa o método ganha mais adesão. Pessoas de vários estratos sociais, com empregos fixos ou não, todos falam da perda do poder de compra como sendo a razão para optar pela compra partilhada de bens alimentares.
Iracelma Fernandes, funcionária pública refere que a situação está cada vez pior, não sendo o salário suficiente para compra de alimentos pelo menos, sem que se recorra ao método de “sócia”.
Para Miguel de Lima, Educador Social, este fenómeno tem ajudado muitas famílias a minimizar as suas dificuldades, mas não traz progresso social, nem bem-estar, estando cada vez mais evidente as altas taxas de desemprego.
“A vida em Angola é tão cara que mesmo com 500 mil kwanzas as pessoas têm dificuldades em fazer compras para ajudar as famílias. O Estado deveria implementar novas políticas para ajudar as famílias de forma geral”, disse
Este apoio à família, diz o especialista “devia permitir a criação de fontes de rendimentos auto-sustentáveis como apoio a criação de oficinas para os jovens acudirem as famílias, por exemplo”.
O filósofo João Binda afirma que o fenómeno é lamentável porque revela a perda do poder de compra, o aumento significativo da pobreza e da miséria na sociedade angolana.
O analista refere por outro lado que é preciso que se encontre uma solução para esta situação que expõe as fragilidades da classe média angolana e das falhas de governação.
“É preciso não combater o fenómeno em si de “socia”. Ali não há nenhum problema. A solução passa por investigar a origem da subida vertiginosa dos preços da cesta básica. É preciso investigar quem não está a pensar no bem comum, está a pensar no bem próprio”, defendeu.