A Provedora de Justiça de Angola disse recentemente que as queixas sobre os conflitos de terras mais que duplicaram no primeiro trimestre deste ano, com mais de mil casos, comparativamente ao ano de 2023 em que foram registados 500 mil.
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A revisão da Lei de Terras e da Lei do Ordenamento do Território é bem recebida por partidos políticos e especialistas do setor que fazem algumas ressalvas para o processo legislativo.
Florbela Araújo precisou que, no ano passado, a sua instituição registou sete mil queixas, maioritariamente relacionadas a conflitos de terras, morosidade processual nos tribunais e criminalidade.
Em declarações à imprensa no final de uma palestra sob o lema “O Provedor de Justiça na Legislação Angolana”, a Provedora de Justiça revelou que as províncias de Malanje, Kwanza Sul, Cunene e Cuando Cubango lideram a lista das queixas.
Informações da Comissão de Gestão do Instituto Geográfico Cadastral de Angola (IGCA) apontam que Luanda tem um registo diário de “uma infinidade” de documentos sobre conflito de terras, de particulares e empresas, com maior realce no casco urbano, recebidos do Serviço de Investigação Criminal (SIC) e da Procuradoria-Geral da República (PGR).
A Provedora de Justiça fez estas declarações depois de ter defendido a revisão da Lei de Terras e do Ordenamento do Território, que remonta ao ano de 2004.
Florbela Araújo disse haver um desajuste dos dois diplomas legais, tendo em conta as queixas recebidas pela sua instituição.
Ela sugeriu ao Governo que apresente "propostas de alteração da Lei de Terras e da Lei do Ordenamento do Território, tendo em conta que elas já são antigas, remontam ao ano de 2004”.
Araújo acrescentou que o cidadão ainda tem dificuldade em conhecer os seus direitos e de legalizar o seu terreno, aliado ao facto de continuar a ser difícil a concessão do direito de superfície em Angola, e afirmou ser necessário assegurar que os direitos constitucionais relativos à terra e os direitos fundiários sejam plenamente exercidos por todos os angolanos.
A Provedora também manifestou preocupação com o número de queixas ou denúncias sobre as questões inerentes à protecção dos direitos fundiários dos cidadãos e o risco permanente de despejos, sem a observância dos pressupostos legais, com ênfase para o aviso prévio e a criação de condições de acomodação das populações.
Do lado da UNITA, a vice-presidente do grupo parlamentar do maior partido da oposição, considera que a revisão da lei terá de passar pela alteração do postulado constitucional que atribui ao Estado a propriedade da terra.
Navita Ngolo diz que “a terra devia ser propriedade do povo e o Estado vem muito depois e foi sempre a defesa e mesmo no âmbito da revisão da Constituição".
Ngolo afirma ainda que essa revisão não interessa a razão pela qual “vemos no país cidades de outros países e só o facto de vermos grandes extensões de terras a serem entregues a empresas e proprietários que não sejam originários dá mesmo para entender que há um desordenamento total e um grande risco”.
Por seu lado, Bernardo Castro, responsável da organização “ Reda de Terras Angola”, entende que uma revisão da atual lei deve incluir, entre outros aspetos, “o direito de propriedade para aqueles que têm a terra como um ativo económico para o desenvolver a agricultura e um estatuto político-jurídico para a protecção dos territórios das comunidades”.
Com a atual legislação, Castro alerta que o Executivo “ganha proveito em função da gestão dos recursos naturais levando as populações à pobreza” e conclui que a atribuição ao Estado o direito de propriedade da terra é “um atentado à verdade histórica”.