Angola: Fim da coabitação

  • Luís Costa Ribas

Joao Lourenço e José Eduardo dos Santos

Um ano entre José Eduardo dos Santos e João Lourenço

A eleição de João Lourenço como presidente do MPLA pôs termo a um período de bicefalia, de liderança repartida com José Eduardo dos Santos, que era suposto salvaguardar o poder político do antigo presidente, durante o mandato do seu sucessor.

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Angola: Fim da coabitação - 3:40


Analistas dizem que não foi bem assim que as coisas aconteceram.

O pressuposto da bicefalia era simples.

O MPLA controla o Executivo, logo, José Eduardo dos Santos, presidente do MPLA, controla João Lourenço, vice-presidente do MPLA, Presidente de Angola e titular do poder executivo.

Elias Isaac, da organização Open Society, crê que esta solução resultou da falta de confiança política de Dos Santos em João Lourenço.

“A bicefalia só significava alguma falta de confiança no sucessor e havia necessidade de se manter um controlo político", diz.

Mas a realidade foi diferente.

Pouco depois da sua investidura, Lourenço decidiu afirmar a sua independência.

Victor Silva, director do Jornal de Angola, diz que face à Constituição, João Lourenço tem poderes próprios que não dependem do MPLA.

“A ideia era colocar o partido acima do Estado e dessa forma manter-se o controlo do Estado por parte de José Eduardo dos Santos”, diz Silva adiantando ser “evidente que essa tese não vingou porque os chamados Eduardistas esqueceram-se que no auge do consulado de José Eduardo dos Santos foi aprovada a Constituição que dá poderes quase absolutos ao Presidente da República”.

Com esses poderes, maior abertura na comunicação social e denúncias de corrupção passada, Lourenço soltou a justiça e provocou o enfraquecimento político de José Eduardo dos Santos e da sua corte política.

Victor Silva entende que “a mostra do país real destapou uma série de buracos na gestão de José Eduardo dos Santos e o papal de alguns dos seus colaboradores e familiares que se terão apoderado das riquezas nacionais. A partir daí, estava traçado o futuro de José Eduardo dos Santos”.

O antigo Presidente tinha menos poder do que julgava e, na análise de observadores angolanos, o MPLA impôs-se até porque a bicefalia não fazia parte do seu ADN.

Mudanças

Elias Isaac nota que Angola mudou, amadureceu política e civicamente, mas que Eduardo dos Santos não reparou.

Aquele analista sublinha que o anterior Chefe de Estado “tinha que entender que os sinais dos tempos mudaram completamente. E havia uma exaustão, um cansaço com 38 anos de governação”. Esse cansaço, adianta Isaac, era notado “dentro das fileiras do MPLA, mas acima de tudo na sociedade angolana havia essa exigência de uma mudança”.

Para Elias Isaac, as mudanças anunciadas por João Lourenço e a sua postura são motivo de esperança.

Ele diz que “o início é muito encorajador mas o Presidente João Lourenço está ciente que, dentro de pouco tempo, a sociedade vai começar a pedir contas”.

Acabada a bicefalia e com apenas um centro do poder político, diz Isaac, a responsabilização política é mais fácil.

Vitor Silva concorda.

Após 38 anos de poder em que, segundo o director do Jornal de Angola, “a figura de Eduardo dos Santos se confundiu com todo o poder em Angola”, é preciso dar atenção a os desafios do país, que João Lourenço identificou no seu primeiro discurso como líder do MPLA. Um deles é combater “a corrupção, a bajulação, o nepotismo e a impunidade”, “mesmo que os primeiros a tombar sejam militantes ou mesmo altos dirigentes do partido”.

Promessas e justiça

Vitor Silva diz que o povo quer justiça e “que os corruptos sejam presos”.

Ele afirma que “o tempo agora é da Justiça” e o novo Presidente da República tem sido claro quanto à separação de poderes “não lhe competindo, como é evidente, mandar prender quem quer que seja”.

Mas, adianta, em jeito de alerta, “desengane-se quem pensa que a Justiça está a dormir e que não vai actuar junto dos ditos poderosos”.

Para ele, “os sinais são por demais evidentes que nada será como dantes”.

Vitor Silva diz que a bicefalia foi um ano perdido, com as atenções desviadas do essencial, como, por exemplo, resgatar o país do que ele descreve como “a pesada herança de José Eduardo dos Santos”.

O futuro dirá quanto tempo dão os angolanos a João Lourenço para satisfazer expectativas e cumprir promessas.

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