A Amnistia Internacional (AI) insta o Governo de Moçambique a promover uma investigação independente e imparcial ao assassinato extrajudicial de uma mulher nua e indefesa em Mocímboa da Praia, na província de Cabo Delgado.
O posicionamento da AI surge nesta terça-feira, 15, depois de ter confirmado a autenticidade do vídeo divulgado nos últimos dias nas redes sociais.
Depois de espancada, a mulher, que fugia dos ataques, foi morta por 36 disparos de metralhadora.
“Este vídeo horrendo é mais um exemplo horrível das graves violações dos direitos humanos e assassinatos impiedosos que ocorrem em Cabo Delgado pelas Forças de Segurança moçambicanas”, escreve Deprose Muchena, diretor daquela organização para a África Oriental e Austral.
Veja Também Governo moçambicano volta a negar violações de direitos humanos pelo exército nacionalPara a AI, “o incidente é consistente com as nossas recentes descobertas de terríveis violações de direitos humanos e crimes sob o direito internacional que acontecem na área” e “demonstra um padrão repetido e implacável de crimes cometidos pelas Forças Armadas moçambicanas”.
Na nota, Muchena lembra que as Forças de Defesa e Segurança (FDS) “não podem ter liberdade para cometer crimes de acordo com o direito internacional e violações dos direitos humanos, incluindo assassinatos de civis em nome de grupos armados combatentes”.
Por isso, a AI insta o Governo moçambicano a “investigar estes crimes mais recentes e chocantes e garantir que todos os suspeitos de responsabilidade criminal sejam levados à justiça em julgamentos justos perante tribunais civis comuns”.
Veja Também Vídeo chocante de assassinato de mulher por militares moçambicanos obriga Governo a investigarMulher espancada e baleada 36 vezes
A análise feita pelo Laboratório de Evidências de Crise da AI concluiu, segundo a organização, que a mulher não identificada foi morta no meio da estrada R698, fora da subestação elétrica no lado oeste da cidade de Awasse em Cabo Delgado.
Ainda de acordo com análises científicas, ela tentava fugir para o norte pela estrada quando foi abordada por homens que pareciam ser membros das Forças Armadas de Defesa de Moçambique (FADM), que a seguiram.
“Depois de espancá-la com uma vara de madeira, ela foi morta a tiros e seu corpo nu foi deixado na estrada. Quatro homens armados diferentes dispararam um total de 36 vezes com uma variedade de rifles Kalashnikov e uma metralhadora tipo PKM”, denuncia a AI, reiterando que “os soldados vestiam o uniforme da FADM”.
Veja Também Duarte Casimiro: "Não faz sentido que tenhamos situações de polícias a agredir cidadãos” em MoçambiqueO vídeo
A AI sublinha que a maioria dos soldados usa o uniforme completo, mas o artilheiro do PKM tem uma camisa vermelha no lugar da camisa de camuflagem padrão.
Todos os soldados falam português e se referem à mulher como “al-Shabaab”, como é conhecido o grupo armado que tem lançado ataques na província de Cabo Delgado desde outubro de 2017.
No início do vídeo, os militares afirmam “este é Al -Shabaab ”, e no final concluem “acabamos de matar o Al-Shabaab ”.
A organização de defesa dos direitos humanos revela que um militar local, que falou com seus investigadores, deu uma “justificação bizarra para o assassinato, alegando que a mulher tinha enfeitiçado o exército moçambicano e se recusado a mostrar-lhes o esconderijo dos insurgentes”.
O video foi divulgado nas redes sociais na segunda-feira, 14, mas a AI afirma que foi compartilhado em telefones celulares a 7 de setembro, “o dia em que provavelmente foi filmado” e que coincide com a “megaoperação” do Governo para remover insurgentes de Awasse e Diaca, corroborando a presença de combatentes das FDS nas cidades naquela data”.
Ministério da Defesa Nacional condena
Entretanto, ontem, o Ministério da Defesa Nacional emitiu um comunicado no qual diz que “as Forças de Defesa e Segurança (FDS) consideram as imagens chocantes, abusivas, repugnantes, horripilantes e acima de tudo condenáveis em todas as suas dimensões”.
O assassinato vai ser investigado porque, segundo o Ministério, “fatos desta natureza deverão sempre ser denunciados por todas as forças vivas da sociedade, devendo ser investigados para apurar a sua autenticidade e veracidade, com vista à devida responsabilização”.
A nota não dá detalhes sobre quem fará a investigação nem o prazo para a sua conclusão.