Democracia Luta no Sueste Asiático

A turbulência política na Tailândia volta a por em questão o futuro da democracia no Sueste Asiático – uma região historicamente governada por governos autoritários e militares. Democracias, em tempos celebradas em países como as Filipinas e a Tailândia fazem hoje face a grandes problemas.

Na semana passada, quando a presidente filipina Gloria Arroyo e outros líderes asiáticos foram evacuados à pressa do telhado de um hotel, na altura em que manifestantes tailandeses protestavam a cimeira asiática, talvez fossem imagens já por ela vividas.

Em 2001, quando se encontrava há apenas 4 meses na presidência, um grupo de manifestantes tentou entrar no palácio presidencial para a expulsar do cargo, tal como os manifestantes tailandeses estavam a tentar fazer com o primeiro-ministro Abhisit Vejjajiva.

Abhisit e Arroyo subiram ao poder na sequência da queda de governos eleitos democraticamente. Arroyo tornou-se presidente quando Joseph Estrada foi forcado a demitir-se por entre alegações de corrupção, protestos de rua e a retirada do apoio por parte dos militares.

Os filipinos chamaram-lhe democracia de "poder popular", mas os analistas dizem que este padrão da mudança de governo criou instabilidade política na Tailândia e Filipinas, antes faróis de mudanças democráticas no Sueste Asiático.

William Case é professor na universidade da cidade de Hong Kong e autor de livros sobre a democracia e a politica no Sueste Asiático.

"Interesses estabelecidos consentem a democracia desde que ela produza resultados e os governos que lhes convêm. E uma vez que não gostem do governo, esses interesses não querem a democracia."

É assim que explica o que aconteceu na Tailândia. Os manifestantes que perseguiam o primeiro-ministro eram da Frente Unida para a Democracia contra a Ditadura – a UDD, um grupo aliado ao antigo primeiro-ministro Shinawatra, deposto num golpe em 2006 por alegada corrupção. Os apoiantes deste partido são sobretudo das províncias que mais beneficiaram com as políticas populistas do antigo chefe de governo.

As eleições de 2007, levaram de novo para o parlamento os apoiantes do primeiro-ministro deposto, e os apoiantes da Aliança Popular para a Democracia, do agora primeiro-ministro Abhisit manifestaram-se durante meses contra o partido no poder, tomando de assalto o parlamento e o aeroporto internacional.

Quando Abhisit se tornou primeiro-ministro, em Dezembro último, depois da comissão eleitoral dissolver o partido no poder, em parte, por fraude eleitoral, os apoiantes da UDD de Shinawatra lançaram contra-protestos contra o PAD, cujos membros são maioritariamente da classe média urbana.

Thanet Aphornsuvan, professor de política da universidade de Banguecoque, afirma que os recentes eventos enfraquecem ainda mais a democracia constitucional da Tailândia.

"A Constituição nunca foi respeitada nos últimos 77 anos. Cada país que não tenha uma verdadeira Constituição, ou têm mas não funciona, há sempre algum grupo, alguma instituição que pode intervir, dissolver e reescrevê-la. No ano passado, o PAD iniciou uma nova revolta de massas, para ir para as ruas, para rectificar o que consideravam as políticas corruptas dos políticos. A UDD é a outra face do PAD. Ambos exploram diferentes situações e razões."

Case diz, por seu lado, que os acontecimentos violentos na Tailândia, na semana passada, podem impedir a democratização na região, em lugares como a Birmânia, governada por militares, e nos comunistas Laos e Vietname.

"Podem concluir que o problema na Tailândia é o de não haver democracia suficiente ou podem, pelo contrário, dizer que acontece porque há demasiada democracia, e usar isso como pretexto para actuar nos seus países.

De facto, a democracia continua instável no Sueste Asiático. Diversos países realizam eleições, mas os analistas dizem que as eleições não reflectem a qualidade da democracia nesses países. As Filipinas, que herdaram a democracia do antigo poder colonial, os Estados Unidos, sofrem de instituições políticas fracas, corrupção generalizada, e eleições geralmente violentas e uma crescente impunidade.

A Malásia e Singapura têm eleições competitivas, mas o parlamento permanece nãos mãos de partidos dominantes com grandes máquinas políticas. No mês passado, o governo malaio proibiu os jornais da oposição de saírem para a rua, nos dias que antecederam umas eleições altamente contestadas. O Cambodja é desde há muito governado pelo primeiro-ministro Hun Sen e o seu Partido Popular.

Para Case há apenas uma democracia no Sueste Asiático: a Indonésia. E mesmo ali, nota, há grandes problemas. Por exemplo, o governo não controla totalmente os militares. A nível local há grande intimidação, mas é mesmo assim o farol da democracia na região.

Thanet diz, por seu lado, que os protestos na Tailândia mostram também que as pessoas valorizam a democracia. Nos últimos anos, sublinha, o povo tailandês tem exibido grandes aspirações democráticas.

"O levantamento do PAD e da UDD são provavelmente semelhantes ao poder popular nas Filipinas. Devemos partilhar este tipo de experiências, tentar dar mais sentido à democracia nesta parte do mundo."

A democracia no Sueste Asiático pode estar longe de ser estável, mas parece que há hoje menos discussão sobre abandonar a democracia, e mais sobre reforçar essa democracia.