Sete anos após a extinção da empresa pública angolana de mecanização agrícola Mecanagro, dívidas relativas a subsídios e salários e falta de cobertura no Instituto Nacional de Segurança Social (INSS) dividem centenas de antigos trabalhadores e o Governo, com o tom da crítica a aumentar à medida do custo de vida no país, soube a Voz da América.
Sem as mínimas condições de sobrevivência, ex-técnicos da empresa que não sobreviveu à crise no setor público lamentam o silêncio dos ministérios da Agricultura e Florestas e Administração Pública, Trabalho e Segurança Social.
O Instituto de Gestão de Ativos e Participações do Estado (IGAPE), enquanto entidade liquidatária, avisa que procura contornar as limitações financeiras com a venda dos activos da empresa, mas não tem encontrado compradores.
Pelo país estão mais de mil trabalhadores, grande parte já em idade de reforma, aguardando por promessas do organismo adstrito ao Ministério das Finanças, que diz estar a negociar com o INSS um perdão dos juros da dívida.
Luciano António e André Quintas, ex-funcionários, ressaltam que os esforços empreendidos em mais de trinta anos de labuta, com deduções salariais para pensões, não tiveram eco na Segurança Social,
“Está péssima, a vida está péssima, os trabalhadores estão péssimos. Demos todo o cabedal, muitos anos e já não há força para procurar um privado. A vida está mal, o IGAPE nada resolve”, refere António, acrescentando que “descontávamos para a Segurança Social, mas não há nada lá, o dinheiro não era canalizado”
Quintas afirma à Voz da América que "diziam que pagavam o pessoal em duas fases, mas nunca mais disseram nada. Não sabemos se uma antiga prestação de 25 por cento do valor … não sabemos se é salário, porque tinham de pagar desde 2017, e temos ainda os subsídios de campo e indemnização”.
A VOA também procurou esclarecimentos, mas aguarda por respostas das autoridades.
Entretanto, em documentos assinados pela presidente do Conselho de Administração, Vera Escórcio, o IGAPE salienta, sem ter mencionado o valor global da dívida, que está a tentar negociar o património da empresa e descarta a criação de um organismo para a inserção daqueles que se encontram em idade laboral.
Agricultura ainda à espera de investimentos
Abordado a propósito pela VOA, o ministro da Agricultura e Florestas, António Francisco de Assis, cujo pelouro é visado nas críticas, não comenta o drama dos ex-trabalhadores, mas assume que o país necessita das tarefas anteriormente confiadas à Mecanagro.
“Falou-se do problema da falta de mecanização, é uma realidade, sem dúvidas. O que está a acontecer neste momento é que aprovámos o programa de aceleração da agricultura familiar, estamos a financiar cooperativas com motocultivadoras e pequenos tractores”, indica o governante.
A partir do Huambo, província que congrega várias dezenas de antigos técnicos da empresa, o secretário-geral da Acção para o Desenvolvimento Rural e Ambiente (ADRA), José Maria Katyavala, avisa que, contrariamente ao que se pensa, a mecanização não se resume em tratores
“Precisamos de uma política de mecanização que tenha em conta a nossa estrutura agrária, e a própria tracção animal, muito generalizada no Centro e Sul do país, faz parte do pacote tecnológico”, comenta Katvala.
Ele refere que “é importante que surjam operadores privados com acesso a financiamentos para a aquisição de máquinas, prestando assim serviços a favor de quem trabalha a terra”.
Criada em 2001, tendo em conta os desafios da preparação de terras, lavoura, abertura de estradas terciárias e obras de engenharia rural, a Mecanagro foi extinta por intermédio de um decreto presidencial de 2018.
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