O presidente da comissão parlamentar encarregada de investigar uma vala comum com mais de cem corpos no centro de Moçambique negou nesta quarta-feira, 1, a existência de valas comuns em Sofala, depois de cerca de um mês de investigações.
"O resultado permite-nos afirmar de forma categórica, inequívoca e definitiva que não há uma vala comum em Canda", afirmou Edson Macuacua, deputado da Frelimo e ex-porta-voz do antigo Presidente Armando Guebuza.
Em conferência de imprensa em Canda, Macuacua disse que "um caso de 120 pessoas seria alarmante, quase uma aldeia inteira desaparecida".
"Estamos num espaço geográfico que é um teatro de operações militares das investidas da Renamo", continuou o deputado da Frelimo que apontou o dedo ao partido de Afonso Dhlakama: "esses ataques da Renamo a cidadãos civis, indefesos, afectam naturalmente os direitos humanos".
O presidente da comissão, que integra apenas membros da MDM frente à renúncia da Renamo em participar por discordar com a sua constituição, anunciou que as investigações vão continuar, nomeadamente em Manica, onde jornalistas fotografaram cerca de 15 corpos de cadáveres.
No encontro com a comissão na segunda-feira, 30, na Beira, alguns jornalistas disseram ter encontrado corpos, bem como falado com agricultores que relataram a presença de corpos na suas “machambas”.
Os profissionais da comunicação reiteraram que não puderam chegar aos locais por imposição das autoridades que bloquearam o acesso aos mesmos.
Reacções
Também na segunda-feira, 30, o presidente do Movimento Democrático de Moçambique (MDM) criticou a posição de alguns responsáveis do Governo que têm dito não haver valas comuns, como, por exemplo, a governadora de Sofala, Helena Taipo.
"Negar que não há vala comum é um contra-senso, pois, onde houver mais que dois corpos é vala comum ou se trata de massacre", disse Simango em nota enviada às redacções.
Para o líder do MDM, “outra mentira monumental foi terem dito que os corpos foram enterrados”, porque, continuou, “testemunhas oculares desmentem esta versão e dizem que deitaram por cima dos corpos um bocado de areia, deixando várias partes dos corpos descobertos e ao alcance de abutres e de outros animais".
Denúncias
A denúncia da existência de uma vala comum na zona 76, no posto administrativo de Canda, interior da Gorongosa, foi feita por camponeses a 27 de Abril.
As mesmas fontes disseram que vários corpos, alguns já em ossadas, estavam estatelados numa antiga escavação a céu aberto, de onde se extraía saibro para as obras de reabilitação da N1, a principal estrada de Moçambique.
Na sexta-feira, 29 de Abril, o porta-voz da Polícia da República de Moçambique (PRM) Inácio Dina afirmou ter enviado uma equipa ao local que não encontrou qualquer vala comum.
No fim de semana seguinte, um grupo de quatro jornalistas deslocou-se ao local mas não conseguiu chegar à zona indicada pelos camponeses por estar bloqueada por forças da polícia e da segurança.
Entretanto, os repórteres encontraram e fotografaram cerca de 15 corpos já em decomposição nas imediações do local.
Uma equipa do Movimento Democrático de Moçambique (MDM) também deslocou-se ao local e, de acordo como seu presidente Daviz Simango, não conseguiu chegar ao local devido à forte presença policial e militar.
Simango, que disse ter ficado chocado com as fotos, pediu uma investigação às denúncias.
A polícia reiterou não ter encontrado qualquer vala comum.
ONU e HRW querem investigar
No dia 4 de Maio o Escritório do Alto Comissário das Nações Unidas para os Direitos Humanos (OHCHR, em inglês) disse à VOA por email estar em contacto com as autoridades moçambicanas depois de ter recebido alegações sobre uma vala comum em Gorongosa.
“Temos, de facto, recebido alegações sobre uma vala comum na Gorongosa, no entanto, ainda não pudemos verificar essas alegações por falta de acesso ao local”, disse aquele órgão com sede em Genebra que solicitou o acesso à área onde foi denunciada a existência da vala comum.
Também a Human Right Watch manifestou o seu interesse em investigar as denúncias e a Liga Moçambicano dos Direitos Humanos diz ter provas da existência de corpos nos locais citados pelos jornalistas.