O casamento precoce compromete o direito das jovens meninas à educação e pode ter um efeito devastador na sua saúde. A União Africana comprometeu-se a pôr fim ao casamento de crianças dentro de uma geração.
Gillian Parker foi até Pemba e testemunhou os rituais de iniciação das meninas.
Raquel, 16 anos, engravidou aos 14. Este não é o seu nome verdadeiro, mas a história é.
“A minha irmã mais velha insistiu para que ficasse na escola (depois de engravidar)”, conta a adolescente, acrescentando que “muitas meninas têm bebés numa idade jovem, mas normalmente elas abandonam a escola para casar e continuar a ter filhos ano após ano. Algumas pensam que o casamento é a garantia de segurança”.
Esta narrativa é comum em Moçambique, onde 52% das raparigas casam antes dos 18 anos.
Cerimónias com dança e música marcam o início da época dos rituais de iniciação mais secretos em Pemba. As raparigas são retiradas da escola quando têm a primeira menstruação, às vezes antes, e são mantidas afastadas por dias, semanas e até meses, para serem iniciadas pelas “matronas”, a comunidade de mulheres mais velhas.
Isto é de tal forma aceite nesta província, que o calendário escolar foi adaptado para acomodar a prática.
Os rituais de iniciação preparam as raparigas para a vida de casadas. É-lhes ensinado a ser submissas, tarefas domésticas, arte da sedução e o ritual pode incluir mutilação genital, na crença do prazer sexual masculino.
Françoise Moudouthe, Representante regional de África do grupo Meninas, não Noivas, falou à Voz da América: “Espera-se que muitas iniciem a vida sexual muito cedo, antes do seu corpo estar pronto. E espera-se também que tenha filhos para provar o seu valor como esposa e as consequências de uma gravidez precoce são dramáticas. Meninas que casam abaixo dos 15 anos têm maior probabilidade de morrer ou ter lesões no parto do que raparigas acima dos 19”.
Nyaradzayi Gumbonzvanda, Embaixadora da Boa Vontade da União Africana para a campanha fim ao casamento de crianças em África, diz que entidades governamentais, movimentos de mulheres e jovens podem juntos acabar com a prática.
“O casamento precoce não deveria ser uma opção para sair da pobreza. É importante que as nossas meninas tenham acesso À educação, não apenas educação primária, mas que tenham a oportunidade de continuar os estudos e ter empregos ou envolverem-se em projectos empreendedores. Temos também de deixar de olhar para as meninas como esposas em vez de cidadãs. As meninas não estão a casar-se com rapazes, mas com homens adultos que deveriam ser responsáveis”, argumenta.
Gumbonzvanda defende que as tradições de Moçambique para a iniciação de raparigas não deveriam ser banidas mas adaptadas a uma idade mais apropriada, com mensagens que lhes dêem poderes vitais, para que não dependam somente do casamento.
As atitudes em Pemba estão a mudar devagar, consoante homens e mulheres vão sendo expostos a mais informação através dos media e de uma melhor educação.
Programas de rádio debatem assuntos pertinentes para os jovens, dando-lhes uma voz mais forte na sua comunidade. Campanhas nacionais em prol de melhores noções de saúde ajudam os pais a perceber o impacto do casamento precoce.
Os pais de Raquel estão a "empatar" a conclusão do seu ritual de iniciação, porque acreditam que isso vai mantê-la na escola.
Raquel diz que quer um trabalho quando terminar os estudos e quer ser financeiramente independente. Ela e as irmãs aspiram as últimas modas, quer seja um telemóvel de última geração ou uma carreira que lhes dê liberdade e independência.