Organizações da sociedade civil angolana consideram que o aumento de mortes de crianças por desnutrição no país deve-se à falta de políticas sociais sustentáveis e ao desprezo a que estão votadas as associações que trabalham com as comunidades mais empobrecidas.
Um recente relatório da Direção Nacional de Saúde Pública (DNSP) sobre a desnutrição no país revelou que, nos últimos seis meses de 2020, em média, duas crianças com menos de cinco anos morreram em Angola a cada hora devido à fome.
O relatório estima que, no total, 8.413 crianças morreram de um universo de 76.480 que deram entrada nos hospitais públicos do país.
Para o líder da organização “Construindo Comunidades”, padre Jacinto Pinto Wacussanga, o quadro descrito pela DNSP “pode ser muito mais grave do que se pode pensar”.
O conhecido padre dos Gambos, na Huíla, diz que por falta de comida, “as crianças da região são alimentadas com frutos silvestres e com raízes”.
O ativista social Fernando Pinto, responsável de uma associação de apoio às crianças pobres do distrito urbano do Zango, em Luanda, diz que o relatório é “um retrato fiel do que se passa em Angola, até mesmo na sua capital”.
Os números
Segundo o documento da DNSP, do total dos menores que procuraram hospitais, 11 por cento faleceram, 11 por cento abandonaram o tratamento, seis por cento não tiveram resposta ao tratamento e 72 por cento tiveram alta.
Além da falta de alimentos em vários lugares, aquele órgão do Ministério da Saúde de Angola reconhece a ocorrência derupturasconstantes de stock de produtos terapêuticos nos centros de saúde, atrasona planificação e o número insuficiente de pessoal capacitado para tratar a desnutrição aguda.
ONU alertou Angola
Em abril, o secretário-geral das Nações Unidos, António Guterres, alertou no Relatório Global de Crises Alimentares que o mundo arriscava-se a derrapar este ano para uma tragédia de fome "de proporções bíblicas" devido à pandemia de covid-19.
“Se nada for feito, o número de pessoas em risco de insegurança alimentar aguda no mundo pode mesmo quase duplicar este ano e chegar aos 265 milhões de vítimas, face aos 135 milhões de 2019”, lia-se no documento que, numa lista de 35 países, alertava para a situação de Angola.
"A insegurança alimentar aumentou devido à seca nas províncias do sul e o afluxo de refugiados da República Democrática do Congo", concluiu o relatório, que indicou que essa situação estava a afetar mais de 562 mil pessoas..
A ONU concluiu que “mais de 8 por cento das crianças com menos de cinco anos sofriam de desnutrição grave e perto de 30 por cento tinham problemas de crescimento".
O relatório das Nações Unidas foi publicado no início da pandemia do novo coronavírus.