O recente posicionamento do general moçambicano Alberto Chipande sobre o julgamento do caso dívidas ocultas, insinuando que a zona sul de Moçambique é mais corrupta do que as restantes regiões, está a suscitar diversas reações, com alguns analistas a considerarem que o mesmo tem potencial para provocar fricções no seio do Partido Frelimo.
Chipande, tido como aquele que disparou o primeiro tiro na luta armada pela independência, em 1964, foi orador num evento organizado por uma universidade em Maputo, a propósito dos 60 anos da Frelimo, e questionou porque é que todos os que estão a ser julgados no âmbito das dívidas ocultas são da zona sul do país, à excepção do antigo director dos Serviços de Informação e Segurança do Estado, que é da Zambézia, centro do país.
"Isso é tribalismo, porque é que não incluíram pessoas do centro e do norte?", interrogou-se Alberto Chipande, membro da Comissão Política da Frelimo.
Para o sociólogo Moisés Mabunda, esta afirmação é muito preocupante porque ao longo dos 60 anos da Frelimo o general Chipande fez parte daquele primeiro conclave que "nos ensinou que a unidade nacional é o factor mais importante para Moçambique, e esta declaração parece contrariar isso".
"O general Alberto Chipande parece que não assume o valor da unidade nacional, isso é preocupante e mostra que ele continua a olhar para o país em termos tribais, é, no mínimo, intrigante", assinala aquele analista político.
Algumas correntes de opinião entendem que isto pode significar a forma como esta questão da unidade nacional tem sido discutida e encarada dentro da Frelimo, e, na opinião de Moisés Mabunda, "isto é bastante preocupante, porque mostra que dentro da própria Frelimo, esta ideia de unidade nacional não está consolidada".
"Sabemos que a construção da unidade nacional é um processo, mas que fosse a partir duma figura da envergadura de Alberto Chipande, ninguém esperava, e isto mostra também que ele é mais makonde do que moçambicano, e o mais preocupante ainda é quando ele reivindica que devia ter sido incluido no calote das dívidas ocultas", realça.
Refira-se que nos últimos tempos tem sido colocada a preocupação de que os factores de unidade nacional começam a fragmentar-se, devido, sobretudo às assimetrias regionais e ao facto de que existem moçambicanos que têm mais oportunidades que outros.
O jurista Tomás Vieira Mário diz que isso é um facto, "porque há uns que têm acesso a oportunidades e outros que não têm acesso, sendo por isso que hoje se fala, abertamente, do sul, do norte e do centro, o que quer dizer que perdemos o referente de o que é um factor de unidade nacional", anotando que falta um pensamento sobre como é que podemos todos ter acesso às mesmas oportunidades".
Por seu lado, o analista Salomão Moiane, comentarista residente da televisão pública, TVM, diz que o general Chipande foi infeliz nas suas declarações, e estas podem provocar fricções dentro da Frelimo, tendo em conta a influência do general no Partido. Mas a Frelimo minimiza a situação e diz que esse risco não existe".
Há quem afirme, entretanto, ser estranho que até hoje não haja qualquer reação da Frelimo às declarações do general Chipande, e Moisés Mabunda diz que "isso me deixa em agonia total, porque nem de dentro nem de fora há vozes que se insurjam ou que respondam “àquilo que o general disse, está toda a gente calada, incluindo os históricos da Frelimo que ainda estão vivos, é intrigante".
Luís Nhachote afirma, por seu lado, que o posicionamento de Alberto Chipande é uma opinião que deve ser respeitada, mas sublinha que a corrupção "nada tem a ver com tribos, porque na etnia makonde também podemos encontrar pessoas corruptas".