O Instituto da Comunicação Social da África Austral (Misa-Moçambique) suspeita ter havido “manipulação, encenação e abuso de poder” na detenção de jornalistas indiciados de corrupção passiva, na cidade da Beira.
Em comunicado, o Misa diz que os jornalistas Arcénio Sebastião e Jorge Malangaze foram detidos, nesta semana, “acusados de extorsão” para abortar uma reportagem sobre a violação das regras do Estado de Emergência num estabelecimento hoteleiro.
Os jornalistas “terão fotografado e filmado o estabelecimento repleto de pessoas a consumirem bebidas alcoólicas”.
Dono do estabelecimento é deputado da Frelimo
O Gabinete Provincial de Combate à Corrupção de Sofala acusa os jornalistas de terem cobrado dinheiro ao proprietário do estabelecimento para não publicar a reportagem.
O estabelecimento em causa é de Manuel Ramissone, que é também deputado da Assembleia da República pela bancada do partido Frelimo.
O Misa diz ter ouvido duas versões, sendo a primeira “das autoridades, que afirmam terem-se feito ao local a partir da denúncia feita pelo senhor Manuel Ramissone; e a segunda, dos jornalistas, que refere que os mesmos se fizeram ao local para obter o contraditório, não para receber qualquer suborno”.
As autoridades dizem que os jornalistas foram detidos “em flagrante” por “crime de corrupção passiva para ato ilícito”. Terão recebido cinco mil meticais, equivalente a 71 dólares americanos.
Os jornalistas disseram ao canal televisivo STV que não exigiram nenhum dinheiro, mas o proprietário do estabelecimento “meteu a mão no bolso e entregou o valor”, tendo sido detidos no momento de retirada.
Violação do Estado de Emergência marginalizada
Tendo em conta o relatado, o Misa diz que “mesmo tendo havido troca de valores, o que constituiria um caso grave de ética por parte dos jornalistas, caso tal venha a ser provado, existem fortes indícios de manipulação, encenação, mau uso do poder do Estado, assim como uma ligação ilícita entre os procuradores envolvidos e o senhor Manuel Ramissone”.
O Misa argumenta que há elementos que “mostram que o senhor Manuel Ramissone estava em busca de alterar o rumo dos acontecimentos sobre os problemas que enfrentava com as autoridades, pois, sabia-se, publicamente que o seu estabelecimento estava sob investigação devido à violação do Estado de Emergência”.
A violação das normas previstas no Estado de Emergência, após a detenção dos dois jornalistas, passou para um plano marginal, denuncia o Misa.
A organização de defesa de liberdade de imprensa recorda que “em lógica e em processos normais, não pode haver um corrupto passivo, sem o ativo”, daí que “os jornalistas deveriam ter sido recolhidos juntamente com o senhor Manuel Ramissone, enquanto participantes do mesmo crime de corrupção”.
Entre outros pontos, o Misa, acreditado que a detenção dos jornalistas tem outras motivações que devem ser investigadas, apela a Procuradoria da República para “abrir um inquérito interno para averiguar a genuinidade deste caso e o nível de envolvimento dos seus agentes; assim como o deve fazer o Conselho Superior da Magistratura do Ministério Público”.