Dois destacados membros da elite política angolana foram mencionados como suspeitos na transferência de centenas de milhões de dólares para fora de Angola, num documento publicado nesta segunda-feira, 13, pela organização Projeto de Investigação ao Crime Organizado e Corrupção (OCCRP, na sigla em inglês).
O antigo vice-Presidente angolano Manuel Vicente e o general Leopoldino “Dino” Fragoso do Nascimento, antigo chefe de Comunicações da Presidência, no consulado de José Eduardo dos Santos, são as figuras mencionadas no documento.
A investigação assinada por Khadija Sharife e Mark Anderson revela que entidades oficiais angolanas e diretores de bancos desviaram centenas de milhões de dólares para fora do país e criaram a sua própria rede bancária através da qual enviaram dinheiro para Portugal e outros países da União Europeia.
Essa rede movimentou pelo menos 324 milhões de dólares através dos seus bancos, a maioria proveniente de Angola, e outros 257 milhões foram detetados em companhias europeias com ligações muito próximas a essas entidades, acrescenta a OCCRP.
O esquema foi detetado em duas auditorias feitas em Portugal há quatro anos que concluíram terem sido violadas dezenas de leis bancárias portuguesas e da União Europeia, mas, apesar disso, a rede continua a funcionar ainda hoje.
Próximos do antigo Presidente
“Dois homens que trabalharam muito próximo do antigo Presidente José Eduardo dos Santos parecem ser os arquitectos do sistema”, denuncia a organização, que aponta como suspeitos o então vice-presidente Manuel Vicente e o general Leopoldino “Dino” Nascimento, ex-chefe de Comunicações de Santos.
A organização acrescenta que mais de uma dezenas de “entidades de influência” e seus familiares usaram o sistema, incluindo companhias alegadamente associadas a Isabel dos Santos.
Muitos desses fundos teriam sido desviados de várias empresas do grupo Sonangol e de outras fontes públicas, entre eles mais de 150 milhões de dólares em empréstimos feitos pelo Banco Nacional de Angola que, segundo diz a OCCRP, nunca foram pagos.
Ainda de acordo com a organização, o grupo exercia controlo sobre os maiores credores de Angola, incluindo o Banco Africano de Investimentos, o Banco Negócios Internacional e o Banco Privado Atlantic, expandindo depois para as sucursais deles no estrangeiro, onde tornaram-se accionistas e clientes.
Isso, diz o documento, “permitiu-lhes transferir vastas somas de dinheiro através de uma rede bancária privada com pouco escrutínio.
A rede
No caso do Banco Africano de Investimentos, houve pessoas que obtiveram ações no banco sem qualquer custo, alega a OCCRP.
Entre os fundadores do banco encontra-se Manuel Vicente e quem autorizou a sua criação foi Mário Palhares, antigo vice-governador do Banco Nacional de Angola.
As sucursais desses bancos em Portugal e Cabo Verde não instituíram qualquer processo de controlo de lavagem de dinheiro, apesar de terem poucos clientes.
O documento afirma que aquelas instituições financeiras obtiveram poucos lucros ou mesmo operaram com prejuízo, “sugerindo que o lucro não era o seu objetivo principal”.
Em Cabo Verde, foi constituído o Banco Privado Internacional que, segundo as alegações, não tinha qualquer presença física no país, para além de uma caixa postal na cidade da Praia.
Refira-se que Manuel Vicente tinha 35 por cento das ações, Mário Palhares 30 por cento e o general João de Matos 25 por cento.
A investigação é assinada por Khadija Sharife e Mark Anderson.
O Projeto de Investigação ao Crime Organizado e Corrupção (OCCRP) é uma plataforma de reportagens de investigação para uma rede mundial crescente de meios de comunicação e jornalistas independents.
A equipa é integrada por editores, pesquisadores, analistas de dados e segurança cibernética, administradores e especialistas em diversas áreas.