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Lacunas legais, práticas nefastas e pobreza perpetuam casamentos prematuros


Organizações ensinam as adolescentes a defender os seus direitos.
Organizações ensinam as adolescentes a defender os seus direitos.

ONGs querem ver as incongruências resolvidas.

Em Moçambique, uma em cada duas raparigas casa antes dos 18 anos e uma em dez já está casada aos 15. Com estes números, ocupa o infeliz décimo lugar na lista dos países com maior número de casamentos prematuros no mundo.

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A classificação representa consequências graves, como mortes por causa de problemas na gravidez, complicações de saúde, ou a impossibilidade de concluir os estudos e ter uma carreira profissional. Os casamentos prematuros muitas vezes colocam as raparigas num ciclo de violência.

Importa mencionar que Moçambique tem 25 milhões de habitantes, dos quais 52% são crianças. A maioria são meninas.

O que é que está a ser feito para travar? O governo e parlamentares repetem que têm o assunto nos planos. As organizações não-governamentais (ONGs) unem-se para fazer pressão e promover mudanças.

No ano passado, as ONGs juntaram-se à campanha nacional “Casar? Só depois dos 18 anos!”, liderada pelo governo, que tem o mérito de despertar o início de um debate aberto sobre a questão.

No entanto, as ONGs denunciam lacunas legais no país e normas sociais enraizadas que deverão ser eliminadas, em particular nas províncias de Nampula, Niassa, Cabo Delgado e Zambézia, que apresentam altos índices de casamentos prematuros.

Albino Francisco, coordenador do Fórum da Sociedade Civil para os Direitos da Criança, diz que a questão da definição da idade da criança inquieta as ONG.

Ele dá um exemplo: “A Lei 7/2008 de promoção dos direitos da criança apresenta a idade de 18 anos, de acordo com a Convenção dos Direitos da Criança, mas a Lei da Família tem um artigo que abre uma excepção para que uma rapariga, aos 16 anos, possa casar com o consentimento dos pais”.

Por outro lado, refere Francisco, “o código civil define que em Moçambique a maioridade é aos 21 anos.”

Este activista comenta “que este é um problema sério que revela a série de incongruências que a legislação moçambicana apresenta" no tocante à protecção da criança.”

Esta situação foi já levantada em fóruns internacionais, tendo o Comité Africano dos Direitos e Bem-estar da criança recomendado ao Governo para harmonizar a questão da idade na legislação.

Mesmo reconhecendo estas lacunas, as organizações da sociedade civil referem em documentos que o governo revela-se comprometido em eliminar os casamentos prematuros, o que está alinhado à luta contra a violência, abuso e exploração das mulheres e raparigas. São sinais disso, dizem as organizações, a criação de centros especializados para o atendimento de vítimas da violência e a oferta de certos serviços de saúde.

Para acelerar mudanças, as organizações da sociedade civil trabalham também com os parlamentares, líderes religiosos e com as meninas e adolescentes para conhecerem mais os seus direitos.

Estudos sugerem que em Moçambique, os casamentos prematuros resultam da pobreza, ignorância e práticas culturais que colocam os pais a preterir a educação das raparigas.

A maioria dos casamentos prematuros ocorre entre homens mais velhos e crianças ou adolescentes, mas tem havido casos de rapazes que são forçados a casar com meninas da mesma idade.

Para ambos, o Fórum coordenado por Francisco, defende a continuidade do acesso à educação e cuidados de saúde, em particular para garantir partos seguros e reduzir complicações.

“O casamento prematuro e a gravidez precoce estão intrinsecamente ligados. Nós defendemos o acesso dessas raparigas que correm riscos aos serviços de saúde sexual e reprodutiva,” diz Francisco.

Mas não basta a advocacia. É também preciso lidar profundamente com os factores que provocam os casamentos prematuros, como os ritos de iniciação. Essa será a nossa próxima abordagem nesta série.

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