A censura nos órgãos públicos de comunicação social em Angola está a condicionar a prática do jornalismo de investigação, alertam profissionais em formação sobre a temática, na província de Benguela.
Emergem receios de que falte abertura para a aplicação das técnicas em abordagem, vistas na perspetiva do combate à corrupção, quando a organização indica caminhos para a solução de um outro entrave, o dinheiro para as reportagens.
Ao partilhar experiências em Benguela, ao lado de profissionais dos setores público e privado, o formador moçambicano Estácio Valoi, membro da Rede Mundial de Jornalismo de Investigação, assume que vai deixar o país com algumas expetativas.
“Incentivamos a todos a quem damos formação à prática do jornalismo investigativo, até porque há fundos para isto, as organizações internacionais apoiam. Basta apenas elaborar um bom projeto e identificar o tema, há bolsas para este fim”, ressalta o formador.
Desejo é o que não falta.
Assim pensa Rui Fernandes, profissional da Rádio Mais, que receia barreiras nesta caminhada, mas também descortina desafios numa Benguela a receber largos milhões de euros para obras, nem sempre devidamente esclarecidos.
“Capacidade pode até não faltar, o problema é como passar o conteúdo, como desvendar um assunto que tem, direta ou indiretamente, ligações ao patrão. O jornalismo é liberal, já devíamos ter um grupo, até porque uma boa investigação é feita por equipa, cá em Benguela, há muitos assuntos, a começar por estas obras em curso”, acrescenta aquele jornalista.
Perante este cenário, José Honório prefere pensar no melhor, atirando a pressão para o lado da sua empresa, a Agência Angolana de Notícias (ANGOP).
“Sempre houve vontade de fomentar a investigação, por isso a formação é bem-vinda. Se estou aqui a participar … acredito que haja abertura nesse sentido da parte da empresa, recebi anuência para tal”, acredita Honório.
Na semana passada, o cartoonista Sérgio Piçarra, a personalidade angolana de 2022, escolhido por um júri do semanário Novo Jornal, teceu duras críticas em relação ao estado da comunicação social.
“É lamentável termos chegado a este ponto, a comunicação social pública não faz jornalismo, só faz propaganda. E nós, que pagamos enquanto contribuintes, não devemos nos cansar de denunciar, é o que tenho feito e vou continuar a fazer”, sustento Piçarra.
Na Estratégia Nacional de Prevenção e Repressão da Corrupção (ENAPREC) 2023/2027, o Governo angolano assume compromisso com a promoção da liberdade de imprensa e defende a redução, nos contratos públicos, dos ajustes directos, uma modalidade vista por analistas como um incentivo à corrupção.
A capacitação técnica de jornalistas sobre condução de investigação de corrupção baseada em dados, realizada já em Luanda, é promovida pela Financial Services Volunteer Corps (FSVC).
Outras actividades, como mesas redondas sobre o fortalecimento da capacidade da media na promoção da boa governação, vão ser realizadas em outras províncias até ao próximo mês de Dezembro.
A ação faz parte de um pacote financiado pelo Departamento de Estado norte-americano, no quadro do fortalecimento do sector financeiro em países em desenvolvimento.
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