Um tribunal russo condenou, na sexta-feira, 19, o jornalista americano Evan Gershkovich a 16 anos de prisão, marcando o fim de um rápido julgamento à porta fechada, sob a acusação de "espionagem", uma acusação que a Rússia nunca fundamentou.
A sua condenação era uma condição prévia para uma possível troca de prisioneiros com Washington, uma vez que Moscovo só troca prisioneiros se estes forem condenados.
"Gershkovich Evan foi considerado culpado e condenado a 16 anos de prisão", declarou Andrei Mineyev, juiz do tribunal regional de Sverdlosvki, em Ekaterinburgo, segundo um jornalista da AFP presente no local.
O repórter do Wall Street Journal, de 32 anos, terá de cumprir a sua pena numa colónia prisional de "regime estrito", o que significa condições de detenção muito rigorosas em comparação com o "regime normal".
No banco dos réus, apresentou-se à imprensa antes do anúncio do veredito, com os braços cruzados, a cabeça rapada - um corte de cabelo imposto aos prisioneiros - e a barba a crescer no seu rosto cansado.
Em comunicado, o Wall Street Journal condenou a sentença "ultrajante", enquanto a ONG Repórteres Sem Fronteiras denunciou "mais um exemplo flagrante de tomada de reféns inaceitável".
A Casa Branca reagiu dizendo, numa comunicado, que a "Rússia está a deter Evan injustamente. O jornalismo não é um crime." Joe Biden promete que "Não deixaremos de nos esforçar para o trazer para casa". "Não tenho tido nenhuma prioridade maior do que procurar a libertação e o regresso em segurança de Evan, Paul Whelan e todos os americanos injustamente detidos e mantidos como reféns no estrangeiro", pode lêr-se no comunicado.
Evan Gershkovich declarou-se inocente e exerceu o seu direito a uma "declaração final" antes do veredito, declarou anteriormente à imprensa a porta-voz do tribunal, Ekaterina Maslennikova. A acusação tinha pedido 18 anos de prisão.
Será em breve transferido para uma colónia penal, se nem ele nem o Ministério Público recorrerem no prazo de duas semanas. Esta transferência pode demorar vários dias, ou mesmo semanas.
Assassino russo
Jornalista conhecido pelo seu profissionalismo, Evan Gershkovich foi detido no final de março de 2023, quando fazia uma reportagem em Ekaterinburgo, nos Urais.
A acusação de "espionagem" nunca foi comprovada pela Rússia. O jornalista, a sua família, as pessoas que lhe são próximas e a Casa Branca denunciam que se trata de um caso forjado.
Na sexta-feira, o Kremlin recusou-se, mais uma vez, a especificar as suas acusações: "As acusações de espionagem são um assunto muito sensível, não podemos fazer mais comentários, o julgamento está a decorrer", evitou comentar o porta-voz de Vladimir Putin, Dmitri Peskov.
Após 16 meses de detenção, o julgamento de Gershkovich foi apressado: uma audiência a 26 de junho, outra na quinta-feira e finalmente esta sexta-feira. Todo o processo decorreu em segredo e nada saiu da sessão à porta fechada imposta pelas autoridades.
Tratou-se de um processo acelerado, uma vez que os julgamentos deste género demoram normalmente várias semanas ou meses.
Para Washington, a sua detenção serviu, sobretudo, como moeda de troca para uma eventual troca de prisioneiros, numa altura de grande tensão entre a Rússia e os Estados Unidos por causa do conflito armado na Ucrânia.
Moscovo admitiu ter negociado a sua libertação e o próprio Presidente russo, Vladimir Putin, referiu-se ao caso de Vadim Krassikov, que está preso na Alemanha por um assassínio por contrato atribuído aos serviços especiais russos.
Evan Gershkovich é o primeiro jornalista ocidental, desde a era soviética, a ser acusado de espionagem na Rússia. A sua detenção provocou uma onda de solidariedade nos meios de comunicação social americanos e europeus.
No final de junho, a Casa Branca denunciou o julgamento como uma "farsa", repetindo que Evan Gershkovich "nunca trabalhou para o governo dos EUA".
Detenção "arbitrária"
O jornalista comunica com a sua família através de cartas que são lidas e censuradas pela direção da prisão. Nestas cartas, diz que está bem-disposto, que aguarda a sua sentença e que quer ver o céu mais vezes, tudo com um toque de humor.
Filho de imigrantes que fugiram da URSS para os Estados Unidos, Evan Gershkovich mudou-se para a Rússia em 2017.
No início de julho, um painel de peritos da ONU considerou que a sua detenção era "arbitrária" e que devia ser libertado "sem demora".
Os investigadores acusam Gershkovich, que trabalhou para a AFP em Moscovo em 2020-2021, de ter recolhido informações sensíveis para a CIA sobre um dos principais fabricantes de armas da Rússia, a Uralvagonzavod.
Esta fábrica produz os tanques T-90 utilizados na Ucrânia e os tanques Armata de nova geração, enquanto a sua atividade civil é a produção de vagões de mercadorias.
A Rússia detém vários outros americanos, incluindo a jornalista russo-americana Alsu Kurmasheva, detida em 2023 por uma infração ao abrigo da Lei dos Agentes Estrangeiros, e o antigo fuzileiro naval Paul Whelan, que cumpre uma pena de 16 anos de prisão por espionagem, acusação que contesta.
Uma cidadã russo-americana, Ksenia Karelina, está a ser julgada desde 20 de junho, também em Ekaterinburgo, por alta traição, acusada de ter dado dinheiro a um grupo de apoio à Ucrânia.
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