A eventual atribuição do título de Presidente Emérito a José Eduardo dos Santos no fim do seu mandato está a ser alvo de forte contestação por parte da opinião pública angolana, incluindo membros do próprio partido no poder.
As opiniões que circulam na imprensa e nas redes sociais manifestam sérias reservas sobre a proposta de Lei Orgânica sobre o Regime Jurídico dos Ex-Presidentes e Vice-Presidentes da República após Cessação de Mandato, apresentado pelo MPLA e a ser debatida no dia 22 na Assembleia Nacional.
Não são poucos os angolanos que entendem que, com esta atitude, o actual Presidente pretenda gozar de imunidade vitalícia e alimentar um poder bicéfalo depois da eleição de um novo Chefe de Estado.
Esta é a opinião do líder da bancada parlamentar da CASA-CE, André Mendes de Carvalho, para quem não há razão para a atribuição do título de “Presidente Emérito” a José Eduardo dos Santos.
Mendes de Carvalho diz que não pode haver Presidente Emérito mas sim “ex-Presidente porque são todos iguais”.
O termo “emérito”, que até aqui apenas se aplica a figuras eclesiásticas e académicas, está a ser interpretado como sendo estranho à Constituição angolana, levando muitos a pensar que José Eduardo dos Santos pretenda continuar a ter os mesmos benefícios financeiros e protocolares depois do fim do seu mandato.
Para o porta-voz da UNITA, Alcides Sakala,o título que se pretende atribuir “é um fato que foi feito à medida de José Eduardo dos Santos”.
O parlamentar diz que a bancada proponente deverá dar explicações que convençam o seu partido a votar a favor da nova lei.
A filha do primeiro Presidente de Angola, Irene Neto, foi a primeira dirigente do MPLA a afirmar publicamente que a família José Eduardo dos Santos não precisa de mais regalias porque “financeiramente está bem”.
Por seu turno, o jornalista e activista Rafael Marques escreve no seu portal Maka Angola que como “Presidente Emérito” Santos quer ter “imunidade vitalícia” quando a única imunidade que a Constituição confere a ex-presidentes “é a de não responderem pelos votos ou opiniões que emitam no exercício das suas funções enquanto membros do Conselho da República ou enquanto ex-presidentes”.
Marques diz que o projecto de lei sugere “que tanto o Presidente como o ex-Presidente gozam de imunidade vitalícia, e isso vai contra a Constituição”.
Aquele jornalista admite que os mentores da proposta se possam terinspirado na solução encontrada pelo Vaticano aquando da abdicação do Papa Bento XVI, em 2013, que assim se tornou Papa Emérito, mas mesmo assim, sustenta que a postura e actuação do Papa Emérito “têm sido muito discretas e não têm perturbado o trabalho do Papa Francisco”.
A Itália é, ao que se sabe, o único país que atribui a designação de Presidente Emérito aos antigos Chefes de Estado, mas sem qualquer tipo de imunidade e menos regalias.
O projecto
A proposta do MPLA propõe que o ex-Presidente goze de "foro próprio para efeitos criminais ou responsabilidade civil, por actos estranhos ao exercício das suas funções, perante o Tribunal Supremo, no termo do disposto na lei".
Quanto a regalias, o ex-Presidente terá uma pensão vitalícia correspondente a 90% do vencimento do seu último ano no cargo, habitação, verba para manutenção e apetrechamento de residência própria, transporte, viatura automóvel de tipo não inferior à do vice-presidente em exercício, motorista, substituição da viatura sempre que devidamente justificado, combustível e manutenção da viatura, assessoria, viagens na primeira classe e assistência médica e medicamentosa, bem como à esposa, filhos menores e deficientes.
A esposa terá ainda uma remuneração equivalente a 70 por cento do vencimento do chefe de Estado ou da respectiva pensão.
A lei vai abranger igualmente o primeiro Presidente de Angola, António Agostinho Neto, e família, salientando a existência de um diploma legal que salvaguarda os direitos da família deste.