Profissionais de cerimonial e protocolo apresentaram em Luanda, os desafios do protocolo no feminino, recomendam políticas públicas para valorização da diversidade cultural nacional, inclusão, flexibilidade e adaptação de trajes africanos às normas de vestimenta protocolares. Maior atenção às necessidades especificas das mulheres na organização de eventos públicos e privados são outros aspectos recomendados em Luanda por especialistas à margem de uma conferência denominada “Protocolo no Feminino.
Os desafios do protocolo no feminino, bem como as recomendações sobre a flexibilização e adaptação dos trajes africanos como sendo roupas protocolares aceitáveis para os oficiais e agentes de protocolo saíram da 1ª edição do Chá “Protocolo no Feminino” realizado em Luanda na última semana, pela APCPA - Associação de Profissionais de Cerimonial e Protocolo de Angola, em alusão ao 31 de Julho, dia da Mulher Africana.
«Que os organizadores de eventos, públicos e privados, tenham em devida conta a necessidade de assegurar que os eventos sejam inclusivos; Que os profissionais de cerimonial e protocolo garantam que os eventos sejam sensíveis na perspectiva do género, devendo, por conseguinte, ter em consideração, sobretudo, as necessidades especiais das mulheres; Que os locais de realização dos eventos tenham em atenção as necessidades das mulheres que amamentam; Que os profissionais de cerimonial e protocolo garantam que os eventos sejam sensíveis na perspectiva do género, devendo, por conseguinte, ter em consideração, sobretudo, as necessidades especiais das mulheres», destaca o comunicado final do evento”.
O certame que reuniu mais de 200 profissionais da área de cerimonial, protocolo e organização de eventos, assim como entusiastas, produziu recomendações que atendem as necessidades específicas das mulheres e dos profissionais de cerimonial e protocolo de modo geral, com destaque a uma alegada tendência de descriminação étnica e regional no que diz respeito aos trajes típicos de cada região de Angola.
Temas como “As mulheres que marcaram o protocolo nos reinos de Angola, os desafios do Protocolo no feminino no contexto empresarial, a africanidade na construção da imagem feminina, o protocolo no feminino no contexto de organizações políticas, o protocolo no feminino no contexto de organizações religiosas e o cerimonial e protocolo sensíveis ao género dominaram agenda do encontro.
Durante o debate sobre os vários assuntos relacionados ao “Protocolo no Feminino, Manuel Panzo, especialista em cerimonial, imagem e organização de eventos e membro da APCPA, chamou atenção para a descriminação na representação da cultura angolana por meio das vestimentas. O também autor e formador censurou sobretudo os trajes “tradicionais” e típicos de algumas regiões do país que tendem a ser mais destacados a nível internacional em eventos nos quais Angola é representada por delegações.
«Os formandos perguntam qual é o verdadeiro traje tradicional angolano. Pessoalmente nunca arrisquei a responder», começou por dizer o profissional.
«Nós em Angola estamos a promover uma descriminação em termos de vestimenta, porque somos um país com diversidade cultural, mas só promovemos trajes e cultura de uma determinada região. Do que tenho acompanhado quer dos trajes das nossas selecções e outras, vão mais é de Samakaka que é da região sul, especificamente do Namibe. Eu pergunto, aonde é que está o traje da Ilha de Luanda? Onde está o traje da Quissama por exemplo ou do leste de Angola? Vamos reflectir em torno desta descriminação que pode provocar um conflito», concluiu.
É preciso que os trajes africanos sejam normalizados como sendo roupas protocolares aceitáveis para oficiais e agentes de protocolo. Teresa Sangossango participante do evento, aproveitou a ocasião para lançar um desafio aos legisladores angolanos: Que o país produza leigislação sobre o protocolo que inclua a questão da indumentária, de modos que se liberte dos padrões e modelos de trajes que nem sempre valorizam a cultura nacional.
«Nós fomos formados e informados que as cores protocolares são o azul-escuro, o preto e o cinza. Eu já estive numa situação vestida de vermelho num acto cerimonial de alto nível e que a dada altura dei um passo enfrente para ir levar um documento, mas fui travada porque estava de vermelho. Que passos vamos dar como africanos, angolanos para normalizar o nosso traje africano para que seja reconhecido como roupa protocolar?», questionou a oficial de protocolo.
Angola tem padrões próprios, mas é preciso estudar, seleccionar a aceitar a diversidade da manifestação cultural nacional. A deputada e Coordenadora da Comissão de Disciplina, Ética e Auditoria do Comité Central do MPLA, Maria Antonieta Baptista, preletora no evento, chamou atenção para a necessidade de uma intervenção dos especialistas para estudar os padrões de trajes africanos, selecionar e promover a sua aceitação.
«Nós temos padrões, e vê-se muito nos escritos que os povos de África gostam de roupas com muitas cores, daí a pergunta da Teresa de que passamos dar para normalizar o uso de roupas africanas como trajes protocolares. Dizia o colega que o traje africano nunca é indecente. Depende porque nós tivemos estátuas enfrente ao Aeroporto [Internacional 4 de Fevereiro] mas que foram quase arrancadas. Era a Mwana Pwó, mas a forma como estavam vestidas, a sociedade não estava preparada para diversidade da nossa manifestação de identidade cultural», referiu a parlamentar que por outro lado apelou para que se promovam mais estudos.
«É preciso fazer estudos. É preciso pôr os antropólogos a trabalhar. É preciso trabalharmos nós próprios, porque se num sentido nós vamos querer conseguir a nossa identidade noutro, já perdemos o nosso valor. Qual é a aceitação que a juventude pode ter deste tipo de traje?» Questionou. «É preciso que haja mais indústria têxtil para fazer face á necessidade», acrescentou.
Branca do Espírito Santo outra participante ao evento defendeu na ocasião a importância de uma cadeia de valor em torno da indústria têxtil em Angola, por isso apelou o fomento de políticas públicas.
«Há toda uma cadeia de valor em torno da concessão e produção de tecido e de certeza que deve ser produto de alguma política pública», explicou a participante ao narrar durante o certame a experiência de outros pães africanos no que respeita a produção industrial de trajes; acrescentando que em Angola “precisamos é de políticas públicas”.
A “Africanidade na construção da imagem feminina”, foi o tema apresentado pela Estilista e Empresária Nadir Tati, para quem os movimentos de libertação e dos direitos civis, assim como os artistas das mais variadas disciplinas, têm sido fundamentais para redefinição da imagem feminina em África. Citou como exemplo, Gabriela Antunes e Cremilda de Lima e Amélia da Lomba, escritoras angolanas que com a sua arte contribuíram para a africanidade e para construção de uma imagem mais inclusiva da mulher.
Para a empresária que se inspira nas dificuldades enfrentadas pelos povos de África de modo geral, e angolanos de modo singular, falar de indumentária é preciso antes de tudo olhar para a identidade nacional. «Foi este o caminho que fez com que eu tivesse sucesso na moda nacional. Não é fácil, no meio de muitos designers no mundo poder carregar sempre o nome de Angola, o nome da mulher, que é na mulher angolana em que me inspiro e sobretudo na dificuldade que o continente enfrenta»
Nadir Tati reconheceu que as mulheres africanas enfrentam desafios de natureza diversa no respeita a vestimenta, de modo particular em cerimónias culturais. Para aquela empresária, actualmente um dos maiores desafios do mundo globalizado e influenciado por padrões ocidentais tem que ver com a preservação das tradições e costumes, assim como o respeito aos protocolos culturais.
«Em cerimónias e eventos específicos como casamentos, funerais ou rituais tradicionais, as mulheres africanas podem enfrentar expectativas rígidas em relação ao vestuário. Devem respeitar normas especificas e acordo a cultura, a posição em que vivem. A adaptação à moda contemporânea. É muito difícil encontrar o equilíbrio nestes dois pontos»
Tati relatou por outro lado que outra dificuldade é ter acesso aos acessórios e materiais indispensáveis para composição de peças de roupa africanas. «Muitas vezes temos vontade de usar algo que seja nosso, mas temos dificuldades de acesso. Não conseguimos o material. Eu vejo isto nos casamentos, a dificuldade de juntarmos os acessórios. Não são apenas os tecidos, mas todo material e incluindo acessórios. Eu tenho clientes que são do Cunene [província localizada a sul de Angola, na fronteira com a Namíbia] e que precisam exactamente daquele material [típico desta zona], mas nós muitas vezes não temos capacidade e a rapidez para podermos trazer e pôr no dia e local solicitado.
A empresária da moda denunciou por outro lado a existência de preconceitos e estereótipos em relação às roupas feitas à base de tecidos africanos, bem como das barreiras económicas de cidadãos com recursos financeiros limitados.
«Os estereótipos negativos em relação à indumentária africana podem levar à rejeição da vestimenta tradicional. A barreiras económicas fazem parte também daquilo que é a nossa dificuldade. A indumentária tradicional muitas vezes requer materiais específicos e elaborados o que pode representar um desafio económico para algumas pessoas, especialmente em contextos onde o acesso á recursos é limitado».
Promover a educação cultural e o entendimento das tradições locais, bem como o incentivar a flexibilidade e da adaptação das normas protocolares, por um lado. Por outro, fomentar a valorização da diversidade e inclusão na expressão da identidade cultural por meio da indumentária são algumas das vias recomendados pela especialista para lidar com os desafios actuais no que respeita a valorização da identidade cultural africana por meio da vestimenta.
«É importante promover a educação cultural e o entendimento das tradições locais. Incentivar a flexibilidade e adaptação nas normas protocolares. É possível fortalecer a identidade cultural africana, criando um senso de pertencimento e orgulho entre as comunidades. É importante que Angola se orgulhe daquilo que nós somos», concluiu.
A estilista e empresária angolana, Nadir Tati falou sobre a “Africanidade na construção da imagem feminina”, durante a 1.ª Edição do Chá “Protocolo no Feminino”. Evento realizado pela APCPA – Associação de Profissionais de cerimonial e Protocolo de Angola que contou com a participação de mulheres e homens dos mais variados quadrantes, incluindo autoridades públicas, eclesiásticas e académicas, membros do corpo diplomático, funcionários públicos, empresários, profissionais de cerimonial, protocolo, etiqueta e organização de eventos, assim como jornalistas e estudantes.
Fórum