Imran Issa, 39 anos de idade, é o primeiro advogado de profissão levado ao banco dos réus, para testemunhar, como declarante, no processo das dívidas ocultas. Esteve ligado a parte do processo relacionado com as dívidas ilegais e, em nome da honra, pediu a quebra do sigilo profissional, para falar do que quis e disse saber.
Foi advogado de António Carlos do Rosário, apontado como o arquitecto do polémico esquema. Ajudou-o em processos de constituição de sociedades, aquisição de imóveis, mas desde a eclosão do escândalo, mostra-se zangado com o antigo constituinte.
Durante a sua audição, Imran Issa denunciou tudo e quase todos, desde réus, advogados, esquemas de comunicações telefónicas entre reclusos e causídicos, até o que parecem ligações entre Rosário e o Presidente da República, Filipe Nyusi.
“Quando o meu nome apareceu nos jornais, eu fui ter com ele (António Carlos do Rosário) e ele me tranquilizou e disse que nada ia acontecer, porque tanto o Presidente da República (Filipe Nyusi) como o filho dele tinham-lhe ido visitar na cadeia e estava tudo sob controle” contou o declarante.
“Ele me mostrava mensagens que trocava com o Presidente da República", disse, salientando, no entanto, que não sabia se as referidas mensagens eram efectivamente comunicações com Nyusi ou não.
Foram tantas revelações que deixaram a classe dos advogados de queixo caído e em rota de colisão com a sua ordem.
Alice Mabote, é uma das vozes da indignação. “Estou a advogar desde 1993, mas este é um caso 'suis generis'. Qualquer cidadão hoje vai dizer que os advogados não têm segredo. Quando a porta se abre, tudo está estragado e isso me inquieta” desabafou.
Através da sua conta na rede social Facebook, o antigo Bastonário, Gilberto Correia, classificou Imran Issa de delator e, em nome do que chama de credibilidade dos juristas perante a sociedade, disse abaixo a advogados delatores.
O julgamento das "dívidas ocultas" como é conhecido começou com 19 arguidos e mais de 70 de declarantes no estabelecimento prisional B.O. a 23 de Agosto de 2021.
No banco dos réus estão arroladas 19 pessoas que vão desde alegados lobistas, como Teófilo Nhangumele e Bruno Tandane; o antigo director da secreta nacional, Gregório Leão; personalidades com conexões políticas, como Ndambi Guebuza, filho do antigo Presidente da República, Armando Guebuza; Inês Moiane e Renato Matusse, respectivamente, antiga secretária e assessor de Guebuza.
O julgamento é dirigido pelo Juiz Efigénio Baptista, um magistrado com pouco mais de 40 anos de idade, que terá a missão de trazer a justiça, a um caso com contornos políticos, sociais e económicos, que levou o Estado a acumular uma dívida considerada insustentável (dois mil milhões de dólares) e cujos contornos levaram a comunidade internacional a suspender o financiamento do Orçamento de Estado.