Os Governos de Angola e da Namíbia estão a acolher em instituições oficiais do país vizinho e a repatriar as crianças angolanas, que deambulam pelas cidades namibianas em busca de sustento.
Não é conhecido o número de crianças angolanas abandonadas no país, apesar de haver relatos nas redes sociais que apontam para centenas só na região de Windhoek, a capital da Namíbia.
O diretor executivo do Ministério das Relações Internacionais e Cooperação da Namíbia, Penda Naanda, citado pela imprensa local, diz ter assegurado que entre junho e outubro de 2023 foram repatriadas 18 crianças para Angola, que se encontravam em situação vulnerável. A repatriação foi feita em colaboração com as autoridades angolanas.
Outras crianças foram acolhidas em instituições solidárias em Windhoek, segundo a fonte, referida pelo Novo Jornal.
Penda Naanda garantiu que "este assunto está a ser tratado com base em entendimentos antigos e laços de amizade e solidariedade profundos".
"Refugiados climáticos"
Entretanto, organizações angolanas de apoio comunitário advertem para os riscos que as crianças enfrentam em caso de repatriamento para Angola, nas actuais condições do país, e lançam um apelo ao governo namibiano.
O administrador da Associação Construindo Comunidades (ACC), Domingos Fingo, revela à Voz da América que muitas crianças e seus familiares se recusam a regressar a Angola perante a atual situação, porque no país "o sofrimento é maior”.
O também membro da Organização não governamental Plataforma Sul diz tratarem-se de “refugiados climáticos” que deixaram Angola por via do êxodo rural por causa da seca e desnutrição severa que enfrentavam na região sul do país, devido "à falta de políticas públicas suscetíveis de garantir condições que lhes permitisse a prática da agricultura familiar”.
Na província do Cunene, a Voz da América ouviu o padre Gaudêncio Felix Yakuleinge, responsável pela organização não governamental Eu Também Sou Pessoa, que corrobora a existência de riscos para as crianças que procuram sustento em algumas cidades namibianas, em caso de repatriamento forçado.
Retorno forçado pode ser "crime"
“As crianças lá já estavam habituadas a sobreviverem mais ou menos no nível três e tirando-as de lá podem encontrar mais dificuldades”, defende o padre Gaudêncio Felix Yakuleinge.
O padre confirma, ainda, a existência de muitas crianças “que vivem em Angola, mas que vão à Namíbia à procura de sobrevivência”.
Rafael Morais, líder do S.O.S-Habitat, considera “um crime” o retorno forçado dessas crianças e apela ao Governo namibiano que encontre soluções de acolhimento, “porque em Angola podem não ter a protecção que têm na Namíbia”.
Situação que vem de longe
A Voz da América noticiou, em Agosto de 2021, que seis crianças retiradas de um campo de refugiados na Namíbia morreram no campo de realocados no Município de Cahama, província angolana do Cunene, onde as condições eram péssimas.
O diretor executivo do Ministério das Relações Internacionais e Cooperação, Penda Naanda, disse em declarações não ser verdade que o Governo namibiano não esteja a tentar resolver o problema, como foi alegado nas redes sociais.
“A Namíbia e a Angola estão em contato regular sobre a questão das crianças e empreenderam medidas conjuntas de acordo com as suas obrigações ao abrigo da lei internacional, para se encontrar uma solução permanente para as crianças afetadas”, disse Penda Naanda.
A embaixadora de Angola em Windhoek, Jovelina Imperial e Costa, disse que as mudanças climáticas são um dos fatores que contribui para a presença das crianças na Namíbia, escreve o jornal The Namibian.
A embaixada de Angola disse ter sido informada sobre a situação e tem estado a cooperar com as autoridades namibianas para se encontrar a melhor solução para a reintegração social das crianças afetadas, a fim de se evitar que sejam alvo de exploração.
Problema cresceu e Namíbia procura solução
A imprensa namibiana revela que o problema das crianças de rua cresceu significativamente no país, devido ao abandono de crianças angolanas que ali chegaram nos últimos anos em vagas de famílias angolanas que passaram a fronteira para fugir às intensas secas nas províncias do Cunene, Huíla e Kuando Kubango.
Um magistrado do Tribunal Supremo namibiano escreveu, a 6 de Fevereiro deste ano, uma carta à Presidência namibiana a pedir que sejam tomadas medidas concretas para acudir ao problema das crianças, não apenas das angolanas que vivem abandonadas nas ruas das cidades do país.
Khadila Amoomo apontou como séria a questão e notou que é cada vez mais comum ver crianças nas ruas, sendo que muitas de nacionalidade angolana "vivem da venda de produtos colhidos nas florestas, sem que seja garantido acolhimento, alimentação, vestuário e cuidados de saúde adequados".
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