Em Cabo Verde, depois da constituição do jornalista Hermínio Silves e do jornal digital Santiago Magazine como arguidos pelo Ministério Público (MP), indiciados de violação do segredo de justiça, agora o jornalista Daniel Almeida e o jornal “A Nação” também foram convocados.
Esses desenvolvimentos levantam preocuçações em Cabo Verde sobre o futuro da liberdade da imprensa no país, considerado um exemplo em África, quando a justiça tenta chegar aos jornalistas que revelaram assuntos que estão em segredo de justiça, um requisito que não se aplica aos profissionais de imprensa.
Esses casos estão relacionados com a publicação de um artigo sobre a abertura de um inquérito para averiguar as circunstâncias da morte do cidadão Zezito Denti d' Oro, que, em 2012, foi assassinado numa operação da Polícia Judiciária (PJ), comandada pelo então director nacional adunto da corporação, Paulo Rocha, actual ministro da Administração Interna.
Hermínio Silves, que foi ouvido no passado dia 26 Janeiro, diz que aguarda a evolução da situação com toda a tranquilidade, mostrando-se firme para continuar a fazer jornalismo sério e esclarecedor da opinião pública.
Daniel Almeida, do A Nação, confirma que acaba também de ser notificado pelo MP, devendo ser ouvido no dia 4, embora não se tenha especificado o motivo, mas desconfia que seja sobre a questão da suposta violação do segredo de justiça.
"Para mim, atacar os jornalistas e os meios de comunicação social livres é uma clara intenção de desviar o foco. Nos últimos tempos, temos notado uma certa tendência para tentar silenciar os que têm sido incómodos com determinadas esferas do poder", salienta Almeida.
Perante o que considera de perigo evidente sobre a liberdade de imprensa, o jornalista pede a união da classe e posicionamento firme da Associação dos Jornalistas de Cabo Verde (AJC) na promoção de debates sobre a matéria e também exigir a clarificação de certas normas do código penal para evitar interpretações dúbias.
Esta questão tem dado muito que falar, com a AJOC a considerar tratar-se de uma clara violação da liberdade de imprensa, facto igualmente citado pelas organizações internacionais de defesa dos jornalistas e da sociedade civil.
Para o professor universitário Daniel Medina, não há razão de ser para toda a celeuma criada.
"Toda a sociedade civil está preocupada e o mundo também de olhos em nós, porque tínhamos uma democracia muito clara e aberta... portanto mexer com a comunicação social nesse aspecto é mexer na democracia... porque não há liberdade de expressão se não houver uma imprensa livre na sua expressão", frisa o também jornalista.
O jurista e professor universitário Emanuel Sousa estranha o silêncio do MP, que, perante uma matéria de crime grave, nada fez durante sete anos e agora de forma apressada constitui jornalistas e meios de comunicação social como arguidos por terem relatado a questão.
O ministro Paulo Rocha, em declarações à VOA, refuta as acusações, afirmando tratar-se “de manobras bem montadas para manchar o seu bom nome, da Polícia Judiciária e do próprio Estado”.
O titular da pasta de Administração Interna assegura que, para já, não aventa a possibilidade de se demitir, porquanto se o fizesse seria uma forma “de se dar ouvidos e promover calúnias e o assassinato político das pessoas”.
Rocha conclui dizendo que levará este caso “ate às últimas consequências” para salvaguardar a sua imagem e o bom nome.