A suspensão por cinco dias do sinal do canal privado moçambicano STV na plataforma de distribuição de televisão TMT revelou novos riscos de privação ao direito à informação e, urge a necessidade de proteger o consumidor menos privilegiado.
Este é o posicionamento de ativistas e organizações da sociedade civil moçambicana.
O sinal da STV foi interrompido por decisão escrita da distribuidora de sinal no dia 12 de agosto, supostamente por não pagar a plataforma da TMT desde 2020, e de ter acumulado uma dívida de 3,6 milhões de meticais (cerca de 56 mil dólares).
O sinal foi reposto no sábado, 17, após uma pressão de organizações da sociedade civil, que consideraram a suspensão uma grave restrição e violação dos direitos fundamentais de acesso à informação.
Proteger o consumidor
Memore Augusto, membro da Plataforma da Sociedade Civil da província de Manica (PLASOC), estranha a forma como o sinal da STV foi retirado da TMT, que era suposto privilegiar as classes desfavorecidas na era digital, por a empresa, sob gestão privada, ter sido constituída com investimento público no valor de USD 150 milhões.
“Só assustamos que já não havia sinal, não tínhamos nenhuma informação precisa, de porque aquilo aconteceu. Isso é violação dos direitos, e as pessoas não têm espaço onde ir reclamar os seus direitos”, precisa em declarações à VOA Memore Augusto, realçando que a suspensão veio expor novos riscos de privação de direito à informação.
O presidente do Parlamento Juvenil em Manica, Tomás Tomossene, observa que a STV tornou-se numa alternativa na divulgação de conteúdos informativos credíveis, e a sua suspensão, por “motivos banais”, nas vésperas de processos eleitorais levantou dúvidas sobre a proteção do direito à informação.
“Fiquei muito espantado quando vi o sinal da STV desaparecer porque também estamos nas vésperas das eleições, temos visto muitas limitações em televisões, mas a televisão pública está no ar a passear a sua classe e a prejudicar o povo, foi uma frustração”, vincou Tomás Tomossene, insistindo ser preciso proteger o direito à informação.
O ativista de defesa do consumidor Mouzinho Nicol’s anota que, apesar dos avanços, com a lei de defesa do consumidor em Moçambique, aprovada em 2009, a proteção dos direitos do consumidor devia estar salvaguardada pelo próprio regulador, o Estado, e permitir um serviço básico em sinal aberto.
O também membro da Associação de Defesa do Consumidor de Moçambique (DECOM) entende que a digitalização encareceu o acesso à informação aos mais pobres, e as restrições por motivos concorrenciais não podem prejudicar o cidadão.
“A suspensão criou algum mau estar. Antes da digitalização esses canais eram todos eles abertos, e o regulador, que é o próprio Estado devia ter um outro posicionamento no sentido de poder proteger o consumidor, nesta perspectiva de que mesmo não conseguindo pagar a subscrição mensal, pelo menos que se mantenha os serviços básicos de acesso a informação”, defendeu Mouzinho Nicol’s.
Regular a digitalização
Por sua vez, a janela moçambicana do Instituto de Comunicação Social da África Austral (MISA-Moçambique) defende que a suspensão do canal de televisão STV, pela TMT, é uma restrição deliberada ao direito à informação e que as rivalidades comerciais não podem colocar em causa um direito fundamental como o acesso à informação.
Ernesto Nhanale, director do MISA-Moçambique, explica que a logística do negócio dos médias da TMT “é invertida”, uma vez que cobra algumas estações a transmissão dos conteúdos por eles produzidos, além de ser de concorrência desleal, por outras empresas do ramo não incorrerem em custos, como a TVM e RM – concorrentes da STV - por alegadamente serem acionistas da TMT.
Segundo Nhanale, a decisão de suspender a STV da sua plataforma, impediu que cerca de 640 mil moçambicanos conectados aos decoder da TMT tenham acesso a STV, um dos principais canais de televisão com informação alternativa sobre os acontecimentos do país.
E defende que a transição para o digital seja regulada.
A TMT é o serviço de televisão mais acessível à maioria do povo moçambicano, sobretudo os pobres, por oferecer os pacotes mais baixos.
Apenas 20% da população moçambicana tem acesso a internet, o que limita o acesso a plataformas digitais de televisões e rádios.
A TMT é composta pelas empresas públicas Televisão de Moçambique (TVM), Rádio Moçambique (RM), StarTimes Internacional e a Focus 21, através da StarTimes Moçambique.
A plataforma aloja 18 canais de televisão nacionais e cada um tem de pagar cerca de 6.550 dólares mensais pelo uso de 60 sites de transmissão do sinal que oferece.
Moçambique desligou, no dia 10 de Dezembro de 2021, os últimos emissores analógicos de televisão – que tinham baixa cobertura nacional-, com a conclusão do processo de migração da radiodifusão para o digital – com cobertura nacional.
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